Os 40 anos de E.T. - O Extraterrestre
Cinco anos depois de Contatos Imediatos do Terceiro Grau, Spielberg investiria novamente na supressão do horror, deslocando os ETs da posição de invasores para a de vítimas em potencial dos seres humanos. Abandonado na Terra, o alienígena bonzinho de E.T. – The Extraterrestrial, sonha com a difícil volta para casa. ET é, num certo sentido, dependente do pequenino Elliot (Henry Thomas), para quem a criatura funciona como substituto do pai ausente. Trata-se de uma fábula sobre a solidão, o deslocamento e a beleza – não de uma beleza aparente, mas interna. Monstruoso na aparência, o coração de ET também é monstruosamente grande, bem maior do que o dos homens. Em E.T., Spielberg focou suas críticas no Estado, na burocracia do Estado, na frieza, brutalidade e estupidez dos cientistas e dos militares. A mensagem cativante de Spielberg é que as pessoas, e mais propriamente as crianças, em termos individuais, estariam muito mais aptas e preparadas para lidar com uma criatura estranha de outro planeta do que a máquina governamental. Em suma, Spielberg reafirmava a boa e velha tradição americana de que os indivíduos são maiores e mais importantes do que os governos.
Por Cláudio Tsuyoshi Suenaga
Eu tinha acabado de completar 11 anos de idade quando E.T. O Extraterrestre estreou em 26 de maio de 1982 como o filme de encerramento do Festival de Cannes. Em 11 de junho, ao ser lançado comercialmente nos Estados Unidos, E.T. virou um fenômeno, um blockbuster imediato, superando Star Wars para se tornar o filme de maior bilheteria de todos os tempos, um recorde que manteve por onze anos até que o próprio Steven Spielberg o superasse com seu Jurassic Park.
Capa da saudosa revista Cinemin, editada pela Editora Brasil-América Limitada (Ebal), que destacava em sua edição nº 02, de dezembro de 1982 e janeiro de 1983, o mega fenômeno E.T. Você pode baixar esta revista aqui. Dos arquivos de Cláudio Suenaga.
No Brasil, o longa chegaria apenas meses depois, em 25 de dezembro do mesmo ano, batendo os mesmos recordes de bilheteria de outros países, embalado por um esquema avassalador de merchandising. No Japão, por exemplo, onde estreou em 4 de dezembro, arrecadou US$ 1.757.527 em apenas dois dias em 35 cinemas em 11 cidades, estabelecendo 10 recordes no sábado e 14 no domingo. Não me recordo bem, mas creio que meus pais me levaram ao cinema para ver E.T. no começo de 1983. Chorei à beça e passei a querer comprar tudo o que se referia ao filme. Na TV, no rádio, nas revistas e nos jornais, que eram as grandes mídias da época, bem como em todos os lugares, nas ruas, nos ônibus, nas filas, nos mercados, na escola e no trabalho, só se falava de E.T. Os mais vendidos eram os bonecos e as máscaras de E.T. (que viraram febre no Carnaval), mas havia uma variedade infinita de produtos.
Uma das lembranças que guardei daquela febre consumista em 1982: um boneco articulado de E.T.
Conforme os anos foram se passando, aquele fenômeno foi se afigurando cada vez mais como um surto irracional de infantilidade, puerilidade e pieguice que havia acometido a sociedade. Altas doses de apelos emocionais que misturavam sentimentos de solidão, rejeição, abandono, incompreensão e perseguição, tocaram não só as crianças, como os adultos. Depois da Guerra do Vietnã, de Watergate, da Era Carter, e imersa na Era Reagan e na interminável Guerra Fria, o público estava sedento por encanto e magia, por algo vindo de fora que lhes trouxesse algum alento, alguma esperança, e Spielberg soube catalisar esses sentimentos e usar os efeitos especiais de forma a permitir uma experiência imagética que nunca foi possível antes. A sequência final em que Elliott voa com sua bicicleta com o ET em sua cesta, graças aos poderes mentais deste, fugindo das autoridades, com uma enorme Lua cheia ao fundo, tornou-se icônica, emblemática, quase um arquétipo definitivamente incorporado aos nossos inconscientes.
Capa e contracapa de A história de E.T. O Extraterrestre, de William Kotzwinkle, baseado no roteiro de Melissa Mathison, storybook publicada pela Editora Record em 1982. Dos arquivos de Cláudio Suenaga.
Sim, daqueles tempos, pois conforme fui crescendo, E.T. foi ficando como uma daquelas coisas da infância que só poderia ter curtido mesmo como uma fantasia de infância, ao passo que Contatos Imediatos permanece até hoje para mim como uma das obras maestras de Spielberg, junto com Tubarão, os quais não me canso se rever.
Conspiracionistas como John Lear, herdeiro da Lear Jet, detentor de 17 recordes mundiais de velocidade com um Learjet, e que tomou parte de missões conjuntas com a USAF, CIA e outras agências governamentais, alegaram que tanto Contatos Imediatos do Terceiro Grau quanto E.T., foram produzidos sob a tutela de agências governamentais secretas para “vender” a imagem de extraterrestres benevolentes ao público, quando a realidade era bem diferente. Segundo Lear, a “horrible truth” (“horrível verdade”), mais horrível do que jamais se imaginara, era a de que já nos anos 1950, o governo norte-americano havia feito um acordo com ALFs (Alien Life Forms, ou Formas de Vida Alienígena, como Lear preferencialmente os chamava), que eram pequenas e feias criaturas cinzentas semelhantes a répteis como os lagartos – com olhos enormes, braços em posição de reza e unhas ou garras encobertas de tecido que funcionavam como dedos –, só que “bilhões de anos à nossa frente em termos tecnológicos”.
Se o intuito era fazer o público pensar que os extraterrestres eram bonzinhos e assim distrai-los enquanto eram abduzidos, Spielberg teve sucesso total. Quantos não passaram a acreditar que fato eles eram inofensivos e espécies de santos como E.T.?
Um dos pôsteres de E.T. que mais ficaram gravados na mente do público e que é prontamente associado ao filme, é o que faz referência a uma das mais famosas cenas do mundo da arte ocidental, aquela que ilustra o momento em que Deus concede e transmite a consciência divina a Adão, daí intitulado "A Criação de Adão", fresco pintado por Michelangelo por volta de 1511 no teto da Capela Sistina, no Palácio Apostólico do Vaticano, em Roma. A cena representa o episódio do Livro do Gênesis, no qual Deus cria o primeiro homem a partir do pó da terra. Spielberg magistralmente recriou a cena no filme de modo a sugerir que E.T. estaria milhões de anos à nossa frente em patamares evolutivos o que o aproximaria, senão o tornaria, um ser quase divino, capaz de, com um toque, recriar um "novo homem". Eis onde novamente a religião se encontra com a ufologia.
Se Spielberg fez E.T., assim como já tinha feito Contatos Imediatos, por incumbência do governo secreto, de onde tirou inspiração para criar o personagem e conceber o filme? Ele conta várias versões, de que a solidão de Elliot foi a que experenciou na infância com o divórcio dos pais, bem como quando filmava na Tunísia, longe dos familiares e amigos, Os Caçadores da Arca Perdida, que fez ressurgir as memórias de sua infância solitária.
E quanto a criatura e ao enredo do filme? Teriam saído da mente do próprio Spielberg? Ao que parece, ele tirou algumas ideias de The Alien, um roteiro de 1967 do diretor indiano Stayajit Ray, conforme apontou o amigo de Spielberg, o diretor Martin Scorsese. Em seu roteiro, que Ray escreveu inteiramente em inglês, ele descreveu o alienígena como "um cruzamento entre um gnomo e uma criança refugiada faminta: cabeça grande, membros finos, um torso magro. É masculino, feminino ou neutro? O que sua forma basicamente transmite é uma espécie de inocência etérea, e é difícil associar a ela um grande mal ou um grande poder; ainda assim, há uma sensação de estranheza por causa da semelhança com uma criança humana doentia."
Mas conforme pude apurar, Spielberg foi buscar mesmo inspiração em The Supersonic Saucer (O Disco Supersônico), filme britânico infantil de ficção científica de 1956 produzido pela Gaumont British Production, rodado na Elstree Studios da Children's Film Foundation (CFF), escrito por Dallas Bower a partir de uma história de Frank Wells, o filho mais novo de ninguém menos do que Herbert George Wells (1866-1946), e dirigido por Mary Field (sob o pseudônimo de Guy Fergusson). Supersonic Saucer foi uma das quase 200 produções feitas pela CFF entre 1947 e 1985. Frank Wells, que também atuou como produtor, era um executivo da fundação, que existe ainda hoje como Children's Media Foundation.
Já abordei esse caso em meu artigo "Supersonic Saucer, a fonte de inspiração e das ideias de Spielberg para fazer ET", que publiquei aqui no blog. Quem quiser os detalhes completos, recomendo que o leia, portanto. Farei por ora um breve apanhado, para quem ainda não conhece.
Os poucos que assistiram o filme à época devem ter tido uma sensação de déjà vu quando foram ver, em 1982, o ET de Steven Spielberg. Isso porque, da compleição de Meba, o ET venusiano afetuoso e amigável de Supersonic Saucer, ao enredo focado nas crianças, em quase tudo o ET de Spielberg é parecido.
Meba, tal como o ET de Spielberg, tem o rosto cativante em forma de coração e grandes olhos ternos amendoados. Meba é um fantoche que se assemelha a uma coruja sem penas enfiada em uma “burca” branca que lhe cobre a cabeça e o corpo, e todos se lembram que nas cenas finais e mais marcantes de ET, este usa uma “burca” branca enquanto está na cesta da bicicleta de Elliot.
Meba, tal como o ET de Spielberg, está solitário e perdido na Terra. Felizmente, duas meninas de um colégio interno adotam o diminuto ser de Vênus que chamam de Meba por assemelhar-se a uma “ameba” (sic!).
E tal como no ET de Spielberg, no final Meba se despede das crianças e volta ao seu planeta.
Spielberg pegou neste filme obscuro e quase esquecido, todos os ingredientes da receita que temperaria com generosas doses de efeitos especiais: crianças carentes e entendiadas de classe média em busca de um pouco de agito, um bando de vigaristas (que Spielberg substituiu em ET por agentes do governo), uma moral ingênua, uma perseguição final e uma despedida final.
As semelhanças não param por aí. O ET de Spielberg desenvolve uma ligação empática com Elliot, tal como Meba com as crianças, e há as cenas com o cachorro, a cena em que as crianças colocam uma blusa em Meba quando ele está com frio, a cena com a bicicleta, a cena quando Meba usa o telefone e tenta chamar a Polícia… e assim por diante. E apesar de todas essas coincidências, nunca vimos Spielberg mencionar este filme, que nunca foi lançado nos cinemas ou televisionado nos Estados Unidos...
Spielberg jamais admitiria que fez seus filmes por colaborar com o governo secreto, claro. Mas as ligações do cineasta com sociedades secretas são claras, tanto que entre os dias 3 e 6 de junho de 1999, participou do 47º Encontro do Clube de Bilderberg, que naquele ano se realizou em Sintra, vila no Distrito de Lisboa, Portugal. Que tipo de negócios Spielberg, o comandante da “indústria do entretenimento” – detentor de sete das vinte maiores bilheterias de todos os tempos –, teria a tratar com banqueiros internacionais, com a inteligência militar e outros líderes políticos mundiais?
Coincidência ou não, o fato é que quando todos pensavam que Spielberg já tinha se cansado de OVNIs e extraterrestres, no início do século XXI, para regozijo dos ufólogos, anunciou que em breve iniciaria a produção de novos filmes sobre o tema, sem dar maiores detalhes, adiantando apenas que não seriam na linha de Contatos Imediatos ou E.T., mas na de Arquivo X.
E em dezembro de 2002, o canal Sci-Fi estreava Taken, uma minissérie de 877 minutos divididos em dez episódios, produzida por Spielberg e roteirizada por Leslie Bohem, cujo foco era a abdução por alienígenas. Mega-produção de US$ 120 milhões, o que a tornava a minissérie mais cara da história, Taken levou o Sci-Fi Channel à liderança na TV a cabo norte-americana pela primeira vez desde seu surgimento, além de ganhar o Emmy. Se Arquivo X em seu episódio piloto faz uma referência direta a Spielberg, denotando uma influência inicial que se diluiria, Spielberg admitiu abertamente ter se inspirado em Arquivo X para fazer Taken, fechando um círculo de influências. Mas enquanto Arquivo X o tempo todo punha em dúvida a existência dos extraterrestres e enredava os agentes Mulder e Scully numa teia de conspirações governamentais, Taken não deixava margem a dúvidas e mostrava os extraterrestres sem rodeios, centrando o enredo na vida cotidiana e nos problemas mundanos de três famílias tipicamente americanas profundamente afetadas por contatos e abduções alienígenas num período que abrangia mais de cinco décadas, a partir do famoso Incidente de Roswell, em julho de 1947, no Novo México.
Se a tendência de Spielberg sempre fora a de encarar os extraterrestres como seres benevolentes e superiores a nós em quase tudo, principalmente em termos espirituais e morais, o que o teria levado a mudar drasticamente de posição, marcadamente em 2005, quando produziu e dirigiu o remake de War of the Worlds (Guerra dos Mundos)? Diferente da versão de 1953 (dirigida por Byron Haskin), Spielberg retratou as naves marcianas tal como imaginadas por Wells, ou seja, gigantescas máquinas de guerra blindadas com pés articulados (tripods) que literalmente brotam da terra em todas as partes do mundo incinerando tudo o que encontram pelo caminho, numa clara alusão aos ataques terroristas a que os Estados Unidos estavam sujeitos desde o trágico 11 de setembro.
Já em 1998, Spielberg mostrava o perigo apocalíptico vindo do espaço exterior com a produção Deep Impact (Impacto Profundo). Em fevereiro de 1997, vazou a história de que Spielberg e executivos de sua companhia, a DreamWorks, haviam se reunido secretamente em Los Angeles com funcionários graduados do Pentágono, os quais teriam solicitado a Spielberg que “parasse tudo” e produzisse um filme que mostrasse o perigo representado pelos asteroides, cometas e meteoros à vida na Terra. Um ano depois, o filme-catástrofe Impacto Profundo já estava nas telas, mostrando um meteoro de 11 quilômetros de diâmetro em rota de colisão com a Terra. Quando as tentativas de uma equipe formada por norte-americanos e russos para fragmentar o cometa com bombas nucleares falham, os governos desses países resolvem implementar o plano de selecionar uma elite que teria o direito de salvar-se em um abrigo subterrâneo, enquanto o restante da humanidade pereceria. Quem eram esses funcionários do Pentágono e por que instaram Spielberg a produzir, às vésperas do final de milênio, um filme sobre uma ameaça vinda do espaço exterior?
Jacques Vallée confidenciou que quando conheceu Spielberg, argumentou com ele se não seria mais interessante se o Fenômeno OVNI fosse apresentado como algo real, físico, mas não extraterrestre. Spielberg respondeu que ele (Vallée) até tinha razão, mas que não era isso que o público esperava, “e eu quero dar às pessoas algo que esteja próximo daquilo que elas esperam.”
As páginas finais de A história de E.T. O Extraterrestre, de William Kotzwinkle, baseado no roteiro de Melissa Mathison, storybook publicada pela Editora Record em 1982. Dos arquivos de Cláudio Suenaga.
3 notes
·
View notes
ET Costume: Unleash Your Inner Alien in Style!
ET, the lovable extraterrestrial from the iconic 1982 film, has fascinated audiences for decades. The heartwarming tale of a stranded alien trying to find his way back home struck a chord with many, making ET an unforgettable character. Now, you have the chance to bring ET's intergalactic charm to life with an incredible ET costume!
Whether you're planning to attend a sci-fi convention, Halloween party, or simply want to embrace your love for the movie, an ET costume is the perfect choice. But how can you make sure your costume stands out in a sea of otherworldly creatures? Keep reading to discover all the secrets!
Finding the Perfect ET Costume
The key to a successful ET costume is finding an outfit that captures the essence of the character. Look for costumes made from high-quality materials to ensure a comfortable fit and durability. Opt for a costume that replicates ET's iconic look, featuring a brown, wrinkled body suit, long neck, and glowing finger. If you want to go the extra mile, add some details like ET's red hoodie and white shoes for an authentic touch.
DIY ET Costume
If you're feeling crafty, a DIY ET costume is an excellent option. With some creativity and basic sewing skills, you can create a unique ET costume tailored to your preferences. Start with a plain brown body suit or jumpsuit, and using fabric markers or paint, draw ET's characteristic wrinkles. Craft a long neck using foam or fabric, and finish off the costume by adding a finger with battery-powered LED lights. This DIY approach allows you to add personal touches and ensures a one-of-a-kind costume.
ET Accessories and Makeup
To complete your ET look, consider some accessories and makeup. Find a pair of oversized sunglasses or goggles to mimic ET's enormous eyes. Use makeup to recreate ET's pale skin and rosy cheeks. Small details like ET's hairline can enhance the overall effect. Ensure you have a glowing fingertip, as it's one of the most recognizable features of the character. You can either find a pre-made glowing finger or create one by turning on an LED light at the end of a glove or finger accessory.
Rocking Your ET Costume with Confidence
Once you have perfected your ET costume, it's time to show it off with confidence. Practice your ET mannerisms, such as walking with a slightly awkward gait, speaking in a distinctive voice, and using hand gestures to communicate. Role-playing as ET will enhance the authenticity and make your costume truly memorable.
Sharing Your ET Costume Online
After spending hours perfecting your ET costume, don't forget to capture the moment and share it with the world. Take stunning pictures of your outfit and share them on social media platforms like Instagram, Facebook, or Twitter. Engage with other ET enthusiasts and join online communities to get inspired by other fantastic costumes.
In conclusion, an ET costume allows you to channel your love for this beloved character and stand out at any event. Whether you choose a ready-made costume or decide to get creative with a DIY approach, remember to bring ET's charm to life through accessories, makeup, and a touch of role-playing. Embrace your inner alien, and let the magic of ET transport you to a world of interstellar adventure!
1 note
·
View note