Tumgik
ygor-pierry · 1 year
Text
JANUS: CARPE DIEM? A verdadeira comédia dos erros
 Ygor Pierry Piemonte Ditão
Tumblr media
 “O avião, que se esperava que influenciasse a civilização, na prática não serviu para muito além do que soltar bombas, é um símbolo desse fato. A Alemanha moderna é muito mais científica que a Inglaterra, e muito mais bárbara também” (Geoger Orwell).
Que a escrita desopile as pérfidas impurezas de um impávido viver e de um sórdido existir que rasteja entre as mazelas das bestas mais ferozes que o mundo já viu sobre a Terra: o ser humano. Brutal, egoísta, pernóstico, cruel, feroz, pedante, insensível e portador das mais profundas doenças que instinto algum, presente nos animais, seria capaz de repetir, reproduzir ou mesmo assemelhar.
Cogito ergo sum...
No entanto, categoria inacessível aos apetites mais selvagens ligados ao estômago e à genitália de onde a massa colossal de búfalos segue seu curso indômito das feiras, das lojas e das placas de liquidação: que liquidam tudo, até a última réstia do traço humano.
Sapera aude...
Porém, a dor Atlante – porque de Atlas o mundo é, na verdade, a dimensão empírica de seu sentir e pensar por que sente – reverbera a frenética força do entorpecimento, presente no pútrido hedonismo sádico, da superlativa conotação sexual de nossas crianças e, ao final, nas sarjetas do ego abjeto de nossas redes sociais em que restam apenas seios, glúteos e abdomens.
Quando o único sonho de uma pessoa é apenas o seu corpo, o que resta de sua alma?
Existe algum cabedal de forças apofânticas nesse mundo de cristal e vidro que representa – para além da caverna – ilusões de ótica entre luzes e sóis no arco-íris de mentiras reproduzidas na escuridão?
Sem respostas, por enquanto...
A todos, nessa virada de ano, como bem advertira Karnal em uma de suas palestras, segue a ansiosa esperança de que o sino da meia noite torne o futuro mágico e transforme o passado em uma simples poeira cósmica e, assim, as tantas angústias aprisionadas nos frenéticos cliques de compra online serão apagados milagrosamente. Por isso, a grande maioria apoia-se em Janeiro como em uma representação simplória da divisão dos tempos entre passado e futuro e, consequentemente, Jânus se apresenta mais uma vez como uma ilusão pueril a converter todas as atrocidades por nós cometidas em passado e, outrossim, a transformar todas as nossas futilidades presentes em ambições futuras: de um mundo mágico que não existe porque já o destruímos hoje.
Não me apetece essa semovente alegoria de Jânus: passado e futuro. Prefiro a dimensão freudiana das potencias humanas: o bem (Eros) e o mal (Ares), nas forças catatônicas do espírito humano ou, entre os meus preferidos, a representação barroca da elevação divina e diabólica entre a força criativa do compreender e destrutiva do sentir. Não é o passado e o futuro, mas apenas o presente e nesse presente Jânus representa, na realidade, as duas facetas de um mesmo ser que constrói e destrói com o mesmo braço. E, assim, antagonicamente ao sagrado Texto, faz emergir de uma mesma fonte águas amargas das lágrimas da violência com sangue ferroso e água doce da caridade e esperança de lúdicas crianças a brincarem no jardim.
Assusta-me, contudo, o como se repetem, entre os cacos de vidro chamados de corpos humanos, a força destrutiva de Ares e, para todos os locais que vejo, transbordam violência, injustiça e crueldade, nos castiçais falsificados da vaidade e espelhos ocos na torpeza megalomaníaca dos usurpadores de espíritos.
São 15h00min do dia 24 de dezembro de 2022. Avenida Parada Pinto, mais ou menos na região do Largo do Japonês. É uma região periférica da Cidade de São Paulo: não tem um décimo da força financeira da Grande e Infinita Avenida Paulista, mas reproduz as mesmas quimeras alomórficas de suas esquizofrenias: entre consumidores frenéticos e mendigos com fome. Nessa hora e local os corpos parecem mais um daqueles imbecilizantes filmes de quadrinhos Ianques a representar passos na velocidade da luz e os rostos se desfiguram na pressa incontida dos cães em pé e, evidentemente, na desumanidade que viceja nas peles acinzentadas de sadismo. Para todos os lados que eu olho vejo apenas almas desesperadas de vazio a batalharem como hienas famintas por carniça de outras hienas que morreram de sede no período da estiagem e, assim, lojas cheias reverberam a música de Criolo de que “Não existe Amor em SP”. No chão, a geração do viver ecologicamente, reproduz as falácias dos discursos aparentes entre o lixo estrondoso de restos de comida (porque comem enquanto andam e compram), plástico de bens consumidos com almas também descartáveis, papéis falsos que representam identidades criadas para os outros e aparelhos eletrônicos velhos cujas câmeras são incapazes de reproduzir com perfeição a mentira criada hoje para apresentar amanhã.
Na praça que existiam idosos jogando – retirados pela subprefeitura da Vila Nova Cachoeirinha violentamente com a arrancada autocrática das mesas em que jogavam todos os dias – é substituída por famílias inteiras sob os bancos da praça entre lixo, transeuntes e lixo (perdão pelo pleonasmo ao repetir três vezes lixo), enquanto filhos hipermimados são presenteados com a reprodução masoquista do hedonismo epicurista anestésico deturpado. Na calçada as lojas multiplicam-se, sem a caridade outrora de Cristo ao dividir pães e peixes, e, nesse cenário, além das lojas que vão por entre quilômetros de avenida, vê-se, nas calçadas que quase não passavam as pseudopessoas, emergir barracas e camelôs de produtos falsos que precisam saciar a malfazeja vaidade, pois não bastam serem calças, sapados e camisetas, precisam ter a ilusão ignóbil dos cães (a caçar seu próprio rabo eternamente) de que aquela bolsa de R$ 15,00 (quinze reais) precisa vir o símbolo dantesco da Gucci e aquele tênis de R$ 25,00 (vinte e cinco reais) necessita do símbolo parvo das Adidas ou da Nike repetindo o velho Teatro dos Vampiros de nosso finado Renato Russo.
Chego ao escritório e a cuidar dos eternos conflitos – porque a humanidade, no final, é isso! – as paixões convalescentes dos chacais expõem às vísceras as placentas infantis e vilipendia até a mais sensível alma: não perdoam nem as crianças, como bem ensinou o fariseu parricida a tentar afastar de Cristo as crianças. Afinal, nossos filhos que já têm cartões de crédito, débito, conta bancária e Pix, mas não podem simplesmente jogar futebol na rua ou cantar no chuveiro, pois se mostrarem uma sombra de aptidão será colocado precocemente em um estádio com trinta, quarenta, cinquenta ou sessenta mil pessoas e serão vendidos por quarenta milhões. Se, porém, são talentosos nas artes encherão as telas de televisão com apresentações brutais de crueldade e tensão em um The Voice Kids ou Master Chef Kids e, assim, como das tantas vidas destruídas pela maturação precoce, terminarão a infância viciados em entorpecentes e sexualidades, mas darão aos seus genitores e família uma vida abastada que vale o sacrifico de sua própria existência.
Esses mesmos adultos que deveriam carregar nas espáduas a responsabilidade de cuidar e zelar dessas crianças precocemente emancipadas, declinam do incrível peso de pensar e, como bem ensinou Benjamin Barber, viciar-se-ão em filmes infantis de super-heróis, bonés e bermudas enquanto precisam urgentemente gastar dinheiro suficiente para retirar o continente africano da fome em Viagra e silicone. Bonecos e Bonecas (Barbie e Ken) se apresentam por todos os cantos apaixonados pelo espelho de tal forma que Narciso converter-se-ia em Teseu. Nessa distopia temerária as escolas transformam as crianças em monstros cuja grande função final é aparecer na parede da escola como um dos poucos aprovados nas mais renomadas faculdades: ignorando, o tempo inteiro, que Adolf Hitler tinha ao seu lado médicos, advogados e engenheiros. Excelentes profissionais, péssimos seres humanos. Esses mesmos pais (monstros biologicamente aptos, apenas biologicamente) enquanto compram suas cartelas infinitas de Viagra e marcam uma após outra cirurgia plástica, ignoram que vossas crianças de dez a quinze anos já expõem mais nudez nas redes sociais que as revistas de nudismo dos anos 90 como a Playboy e, depois, são compelidos a encartar a lista de pais desesperados pelos filhos desaparecidos sequestrados pelo mercado de tráfico para fins sexuais: mercado este sustentado, aviso-vos meus caros, por homens inescrupulosos que assentam como Juízes, Parlamentares e grandes lobos do mercado financeiro, bajulados diariamente por todos nós.
De volta ao meu escritório, aqui, nessa cadeia gelada de livros e conflitos, não posso ignorar que pareço um cavaleiro ou um sacerdote de Ares: com pastas, códigos e petições na mão a saciar os conflitos e as vaidades infindas do caos atômico dos egos. Ficam na memória os casos mais cruéis que vi aqui: são seis anos que um pai não vê a filha porque a mãe perseguiu seu afã desumano de substituir a figura do genitor pelo seu novo relacionamento – ao arrepio do que sinta a filha objeto de sua satisfação narcísica – e, para tanto, usou tudo que tinha as mãos: com uma estória incoerente e sem conexão acusou o genitor de violentar sexualmente a filha (provado ser falacioso após perícias médicas, psiquiátricas, psicológicas e pela assistência social que atestaram a existência de memória injetada na criança) e que mesmo após uma sentença que determinou que a mãe permitisse que o pai visse a filha, persiste sem qualquer contato. Do outro lado da estante a situação não é muito diferente: chega ao escritório uma mulher com óculos de sol do tamanho de uma tela de cinema. Precisava esconder os dois olhos roxos e mal abria a boca para falar, tanto pela lesão no maxilar quanto pela vergonha de expor dois dentes da frente quebrados por um soco covarde de um semovente bípede. Noutro feito, o filho persiste já mais de oito anos sem que o pai quite os valores devidos a título de alimentos (ajudado, evidentemente, pelo Ilustre Poder Judiciário que decisão após decisão favorece apenas o devedor deixando morrer de fome o credor na cultura do protecionismo dos inadimplentes encartada pela (in)justiça Bandeirante), sob a pecha sarcástica de ausência de recursos enquanto, claro, com os filhos conjugais (pois apenas a esses reconhece o torpe varão) segue sustentando-os sobejamente com viagens ao exterior e universidades mais caras do país.
Escolhi essas três histórias porque elas emergem do lugar que se imaginaria ser o menos propício: a família. Mas como são brutais essas famílias criadas pelo, para e no consumo! Chega a hora fria de meus corpos frágeis e esses filhos abandonados a terceiros abandonam também vossos idosos: e assim, filhos que foram criados apenas e tão somente por empregadas, creches e internatos retribuem em igual medida isolando vossos idosos em asilos mais distantes possíveis. No condomínio as crianças descem para brincar sem qualquer vigilância e educação e desde cedo já reverberam os valores paternos e maternos de destratar o porteiro, humilhar a senhora da limpeza e descumprir todas as regras de bom convívio. Quando inquiridas por outros adultos correm imediatamente até vossos pais guardiões da impiedade que, como se esperava, agridem imediatamente aquele que lembrou a seu filho insuportável que viver com os outros não é se apropriar dos outros: e assim o respeito fenece sob o sol árido das torpes dimensões econômicas do ser.
Quisera eu parar aqui: há mais atrocidades. Um filho é acusado de tentar matar e envenenar a própria mãe; um pai (mais cruel que o lobo a jantar uma ovelha na frente da mãe da própria ovelha) bestializa-se no mais inaceitável ponto e violenta sexualmente uma criança (afilhado, sobrinho e até mesmo filho); uma mãe arremessa a filha contra a parede e quebra-lhe o baço; outra mãe entrega a filha a um estranho para perseguir a caça irrefreável de entorpecentes em troca de sexo e, mais distante, já na minha cidade natal (Salto Grande) uma mãe inescrupulosa entrega sua filha adolescente à prostituição para os eternos coronéis que emanam nos infindos brasis. Paremos por aqui... Do contrário encerrarei apenas no escritório meus exemplos.
Voltei para casa e enquanto minha esposa voltava da casa de sua mãe com nossos filhos, acessei o computador para averiguar as últimas hordas de e-mails do escritório onde advogo e da faculdade onde leciono. Realmente, as férias chegaram, não havia nada. Minha esposa prometera chegar a uns quinze minutos e o tédio chama apenas coisas inúteis como as redes sociais (que na era da informática sou compelido a ter quando, antes, por não as ter, um cliente chegou a pensar que era um estelionatário a me esconder de credores): reels, stories e publicações. Como em Desconstrução de Tiago Iorc para todos os cantos se via apenas três coisas: corpos nus, futilidades e exibicionismo.
Do último para o primeiro é mais legal por me permitir ligar a experiência de advogado com o teatro de aparências das redes sociais. Um cliente se dirigiu a mim clamando para substituir outro patrono que, infelizmente, se apropriara dos ganhos processuais devidos a ele e arguiu incapacidade financeira e, por isso, implorou (não é superlativo) que eu o patrocinasse ad exito (ganho, se ganharmos) e o fiz (além de auxilia-la gratuitamente noutras situações periféricas). No entanto, depois de vencermos, adicionou-me nas suas redes sociais e vi que sua pobreza era sonsa em suas viagens à Disney enquanto se apropriava do trabalho alheio no mais elegante estilo brasileiro: tantos anos de escravidão é incapaz de respeitar o trabalho de outrem. Noutro evento, bom é ver a genitora em barcos, viagens, festas regadas à muita bebida alcoólica enquanto se exaspera com a imposição de uma derrota processual com repercussões financeiras claras ou, ainda, em outro processo reclama alimentos à filha sustentando um dever maior ao genitor varão em virtude de sua diminuta condição econômica. Que tal meus doces alunos? Perdidos em academias, festas e bailes exasperados, ao final de semestre, por terem ficado de exame ou reprovados? Dedicados diariamente (ao menos postam diariamente) aos bíceps, glúteos e seios, mas incapazes de ler um livro por mês: verdadeiros colhedores de maçã..., mas plantaram apenas mandiocas (que a simbologia implícita faça seu papel cômico Shakespeare). Entre suas torpezas infames de plágio, cola e ausência de escrúpulos (como aquelas crianças citadas antes incapazes de respeitar o porteiro, a faxineira e o vizinho) que, a cada semestre, responsabilizam a universidade, a biblioteca, o professor e tudo que lhes cercam, mas nunca admitem sua indisciplina: carentes dos resultados fáceis na era da modernidade líquida de Bauman. No final, tudo e absolutamente tudo que estava nas redes sociais se resumia: “eis que tudo era vaidade e aflição de espírito” (Ec. Cap. 1, vers. 14), mesmo aos carolas e religiosos a compartilhar fotos em suas santas ceias, orações e caridades ignorando em todo o tempo que deveriam fazer “ao a teu Pai que está em secreto” (Mt. Cap. 6, vers. 6).
Esse é um local – apesar de imaterial – mais propício a materializar a mandrágora venenosa que se infiltra no solo do coração humano cujas aparências retratam um teatro elisabetano, mas, na realidade, esconde um coliseu romano com corpos ensanguentados, violentados e opacos já em putrefação do óbito. Como uma sala de espelho a reproduzir almas de plástico e corpos de vento carregados pelo ímpeto animalescos de pessoas que, para entorpecer sua dura realidade, envolvem-se entre os vícios mais estúpidos de álcool, drogas, sexo e vaidade. Para tanto, são capazes da mais idiossincrática e impensável conduta de um homem: animalizar-se ao máximo e desumanizar o outro para se apropriar dele em seu corpo, bens e, mais cruel que uma hiena que come sua vítima ainda viva, sua alma.
Homens que humanizam cães com festas, bolos e afeto desmedido, mas, em contrapartida, desumanizam homens, mulheres e crianças, agredindo-os no mais profundo recôndito de sua dignidade preferindo tratar como pessoa quem ainda late e tratando como cão quem de fome chora, dando-lhe apenas as sobras e restos de sua mesa aos seus empregados, aos seus amigos e amores. Como um velho amigo que por anos usufruiu de meu trabalho remunerando-me muito (mas muito!) abaixo do valor adequado, aproveitando-se, naqueles idos, de minha fraqueza financeira e de nosso laço de amizade – pois, no final, eu também sabia que ele estava a erigir seu caminho e que vínhamos dos mesmos pés de barro de um mundo simples como a citada Avenida Parada Pinto – até o dia em que não podendo mais auxilia-lo (mestrado/doutorado) indiquei um amigo de minha confiança cuja qualidade do labor eu confiava. Este amigo (talvez um dos meus últimos, hoje, de verdade) ligou irado com a postura do meu outro amigo mercenário de pechinchar sua remuneração, quando, então, descobri que o meu primeiro amigo estava a pagar ao meu segundo amigo (que não tinha qualquer relação de amizade entre eles) três vezes e meia ao que era pago a mim. Silenciei-me e nunca mais atendi seu telefone. Da última vez que nos vimos, preferiu não falar comigo para sustentar a posição teatral de que eu o traíra, mas eu sei a verdade e ela viverá comigo apesar de seu anonimato, pois, diferentemente das falácias que as redes sociais representam, a verdade não precisa de palco.
Faltam muitas histórias como a politicagem necrosada de instituições da República (que não posso nominar para não ser preso), a corrupção pandêmica dos homens públicos que visitam com frequência os comerciantes da região para receber propinas para não fiscaliza-los (e não adianta levar isso para jornal algum, pois isso o que escrevo é uma obra de ficção, a semelhança é mera coincidência, assim como minha ironia), ou, por fim, a mais bela lição que ouvi do Padre Lancellotti que em uma conferência sua salientou que esse monte de igrejas pela cidade de São Paulo só pode representar a mesma coisa que uma cidade com hospitais demais: todos estão doentes de alma e de corpo, viciados no culto à Ares entregando-se para a destruição física e moral, sem sentir e sem entender por qual razão sentem, entregam-se à autodestruição com a destruição de todos que os rodeiam. No final, persistem os livros de teoréticos que escreverão sobre o Direito da Guerra sem jamais segurarem o corpo de um irmão ensanguentado ou, ainda, os maravilhosos autores da pobreza que ganham dez, vinte, trinta, quarenta ou cinquenta salários mínimos e – como o parlamentar recentemente fez – por se compararem aos mi ou bilionários como futebolistas, acham injusta a remuneração alheia superior à própria em sua velha adoração à pirâmide platônica. Teoréticos que visitam o exterior mensalmente (apoiados na deslumbrante Cidade das Letras de Ángel Rama), que escrevem sobre o sexo dos anjos e que nunca viram a fome, a dificuldade, a fraqueza, a brutalidade, a crueldade e a dor que emana do mundo real das pessoas que contam centavos para não serem despejadas.
Essa é uma das facetas de Jânus: Ares belicoso e contumaz. A inescrutável violência do ego que se apropria e destrói tudo que toca e vê. Afinal, como diria Emicida “quem vive no inferno reza para quem?” ou, ainda, nessa moda eterna de americanizar tudo, como diria Thirty Seconds to Mars, não seria tudo isso “A beautiful lie”? De tudo que escrevi apenas me restam a comédia dos erros que a humanidade repete em um círculo sem fim como em uma velha tempestade que nunca tem um final feliz: guerras, pandemias, catástrofes e crueldade retiraram de Cândido a inocência derradeira. Cenário que não pode ser escondido nos comerciais feitos por atores multimilionários que reverberam na era dos influencers a sabedoria vicejante de Atenas, mas divulgam, como prostitutas de mais baixo nível (pois a prostituição sexual vende ao menos uma verdade: o próprio corpo) produtos que não confiam, bens que não consomem e promessas que não cumprem, entorpecendo no próximo BBB as formigas que não trabalham no verão.
O fim? O fim não existe! Fica apenas Ouroboros de uma repetição que não terá saída enquanto cada um de nós não entender que a rua continuará suja se ninguém varrer a própria calçada; a corrupção será implacável enquanto ninguém aceitar o peso da honestidade; que a desigualdade seguirá brutal até que aprendamos a ver a igualdade do outro em nós; que o espaço público nunca será público enquanto persistimos nos apropriando de parcelas dele levianamente; que o serviço público continuará necrosado enquanto a única missão for um cargo estável e não a república; que o trânsito será uma selva envolta entre gnus, urubus e cães selvagens de taxistas, motoristas de ônibus, motoboys e ciclistas que reclamam de seus direitos violados, mas não respeitam um semáforo, uma faixa de pedestre e um passageiro; que o futuro será um caos impensável enquanto nossos filhos não aprenderem a respeitar o outro, as regras e a vida; que a eleição será sempre uma rinha de galos suicidários enquanto a luta for por parcelas do bolo e não para que todos comam... Enquanto o estômago e a genitália guiar a massa boçal dos semoventes bípedes, a humanidade seguirá seu curso irrefreável à desumanização: estuprando seus filhos, matando seus irmãos, roubando seus pais, traindo seus amigos e matando seus deuses de tanto rir, como o palhaço no cinema que representa todos nós: O Coringa que se transforma em todas as cartas e que representa a cada rosto que se olha no espelho e delega ao próximo o próprio dever.
Autofagia.
Não há ano novo na autofagia.
São Paulo 31 de dezembro de 2022.
“Não há outro modo para resolver o problema do futuro do homem, que não seja o de voltar ao passado; somente a observação do passado pode permitir-lhes entender, como em um espelho, o segredo do futuro” (Francesco Carnelutti).
P.S. Se você leu tudo que escrevi até aqui, apesar do texto deprimente, parabéns! Já superou a geração dos pássaros de Twetters.
6 notes · View notes
ygor-pierry · 2 years
Photo
Tumblr media
                                       GÁRGULA
Existe um poema de cimento
       no concreto do pranto
       que brotam do arranha-céu
       das minhas lágrimas.
                        -- // --
Como uma nota secreta de toda sinfonia
        que ecoa n’alma
       aquela estranha calma
       n’olho do furacão...
                       -- // --
Assim esse poema se parece
        ou desaparece
No cume da cidade
Como um gárgula feito de prece
         agonia e solidão!
                  -- // --
Ygor Pierry Piemonte Ditão - SP 15.12.2021.
6 notes · View notes
ygor-pierry · 3 years
Quote
Esse é um desafio que todos nós, como seres humanos, enfrentamos: encontrar e expressar o amor, no tempo e na forma que nossa vida, muitas vezes imprevisível, permite
Nicholas Sparks
0 notes
ygor-pierry · 5 years
Quote
Se o mundo fosse uma música ninguém entenderia a sinfonia
Ygor Pierry
3 notes · View notes
ygor-pierry · 5 years
Quote
Pois nada tem valor para o homem se ele não puder fazê-lo com paixão
Max Weber
1 note · View note
ygor-pierry · 5 years
Quote
A habilidade, não menos que a liberdade, de guiar-se pelos próprios conhecimentos e decisões, em ver de ser levado pelo espírito do grupo, é um avanço do intelecto que nossas emoções só acompanham de forma imperfeita
HAYEK
0 notes
ygor-pierry · 5 years
Text
“Tudo sucede igualmente a todos” (Eclesiastes 9:2).
Nas coisas finitas perdemos tempo demasiado. Como são leves as ondas das coisas eternas e que têm, nelas mesmas, o início, meio e fim. Todavia, nós, bestas mortais de Hobbes, perdemo-nos reiteradamente nas mais pútridas e vãs coisas que imunda nosso cotidiano de inutilidade, mas, mesmo assim, mesmo que nós – estúpidos semoventes crentes em suas próprias deidades – caminhemos reiteradamente em busca dos velhos pedaços de papel, metal e madeira, a vida – esplêndido espetáculo das quimeras celestiais onde as constelações mudam constantemente de forma no afã indubitável de nos sortear o futuro, o passado, mas, acima de tudo, o presente de nossos dias -, essa mesma vida que tão repetidamente questionamos, em manifesto surreal de sua autoridade nos presenteia com as coisas mais doces e importantes que tens, sabendo de nosso inquestionável desmerecimento.
Tudo dura absolutamente pouco. Desde a própria vida até os momentos mais circunstanciais que ela nos dá. Àqueles segundos eternos entre a saída do seu filho do ventre de sua esposa e do primeiro choro que ele daria em vida já se foram e se você não esteve lá não há tempo que possas recuperar. O primeiro beijo, o primeiro abraço, a primeira vez que você e seu pai brincaram de luta, correram pela rua e mergulharam num rio; a primeira vez que jogou bola na rua, que se decepcionou com um amor não tão bem terminado, que passou no vestibular e que ganhou seu primeiro salário. Tudo sucede igualmente a todos e, não obstante, sucede-se rapidamente.
Sem sermões religiosos em minha alma inquieta. Àquela frase com o qual começo este texto é para que eu conforte o meu coração quando o céu reveste-se de chumbo e, mesmo assim, torno-me capaz de entender que a vida é exatamente isso: “Vai, pois, come com alegria o teu pão e bebe com coração contente o teu vinho” (Eclesiastes 9:7) e que, no final, enquanto estivermos juntos – e mesmo quando não estivermos – a vida será o mais valioso dos presentes que recebi, quando entendi que me basta aproveitar “a vida com a mulher que amas, todos os dias da tua vida vã, os quais Deus te deu debaixo do sol, todos os dias da tua vaidade; porque esta é a tua porção nesta vida, e no teu trabalho, que tu fizeste debaixo do sol” (Eclesiastes 9:9).
No sereno eu contemplo um céu de estrelas que cintilam dentro de seus olhos e, enquanto te beijo, meus dedos percorrem o violão desse corpo cheio de música e intensidade entre os suspiros de minha epopeia e, noutros curtos espaços de tempo, brados impetuosos de sortidos haicais. Nos teus cabelos de ondas espaciais eu mergulho outra vez meu rosto entre os perfumes que os anjos permeiam o divino e na sua voz de suavidade intransponível eu acalmo os leões de um coração caçador que tenho no peito.
No zelo insofismável de seu amor eu regozijo e me ridicularizo. Eu, mortal como as bestas de Hobbes que critiquei outrora, recebi, quando menos merecia, um anjo cuja força me preenche da mais certa segurança e me tranquiliza. Àquela sentinela na torre sob chuva, ventos, raios e temporais és tu, meu anjo de Marfim, que não vacila, não teme, não duvida e, mais incrivelmente, não desiste mesmo quando eu digo sim. Àquela guardiã no portão que resiste mesmo quando todas as forças do mundo recuam é a razão pela qual hoje eu consigo, mesmo quando os ventos do destino desdobram minha espinha, seguir crente, mais do que minhas tantas fases de incredulidade, na missão de lutar enquanto houver forças.
Amanhã, quando as horas frias cobrirem o sol, bastar-me-á teu sorriso. Mesmo que no fim, meu anjo de Marfim, os espetaculares finais teatrais de Shakespeare não nos permitam morrermos abraçados no ímpeto da eternidade que é nosso amor, eu sempre terei sua mão segurando a minha andando do meu lado, porque quando era um daqueles vis lobos caçadores de metais você apareceu e me deu dois filhos maravilhosos, mas, tão incomuns quanto toda essa magia, você me deu, meu amor, a certeza de que existem coisas eternas que a vida nos dá mesmo quando perdemos nosso tempo nas coisas finitas.
P.S. Se o amanhã não existir, saiba, meu amor, que te amei hoje e agora com tudo o que eu tinha e com tudo o que eu era.
30 notes · View notes
ygor-pierry · 6 years
Quote
Se não for para mudar o mundo nem levanto minha bunda do sofá...
Ygor Pierry
3 notes · View notes
ygor-pierry · 6 years
Quote
Um homem sem paixão não conduz sua vida, mas é arrastado pela sua existência
Ygor Pierry
1 note · View note
ygor-pierry · 6 years
Conversation
::: UM MONÓLOGO QUALQUER :::
Alguém: O que é uma família?
Eu: É uma torre forte de cinquenta côvados com vigias em todas as torres e sentinelas que correm por entre seu cume mantendo acordados todos os arqueiros, balestras e catapultas ao menor sinal de problemas... Onde você conhece todos os pontos fracos, mas seus inimigos não.
Alguém: Mas isso não é uma guerra?
Eu: Sim, é. E a família é exatamente isso: o único lugar em que você estará seguro no meio dessa guerra... Não é dinheiro, sucesso ou poder, mas é poder estar vulnerável sem, por causa disso, tornar-se alvo.
1 note · View note
ygor-pierry · 6 years
Text
AMOR MINIMALISTA
                                         Todo amor do mundo
                          Cabe numa mulher de um metro e meio
            Que tem no peito o oceano em que diariamente me afundo.
3 notes · View notes
ygor-pierry · 7 years
Photo
Tumblr media
39K notes · View notes
ygor-pierry · 7 years
Quote
Passei a vida tentando corrigir os erros que cometi na minha ânsia de acertar.
Clarice Lispector.   (via aluador)
29K notes · View notes
ygor-pierry · 7 years
Photo
Tumblr media Tumblr media Tumblr media
38K notes · View notes
ygor-pierry · 7 years
Text
O SILÊNCIO DA URBE E OS SUPER-HERÓIS DO COTIDIANO
 --  MENDIGOS... E O PODER DA INVISIBILIDADE. 
É-me impossível dormir enquanto o papel não tiver o necessário contanto com os reclamos da minha alma. Não há sono que leve para cama uma alma inquieta e que reclama imediata intervenção da caneta, da tinta e da incessante força que impulsiona a transformar em significado as sombras tenebrosas do dia a dia, as lágrimas emudecidas dos sacrilégios e a fome não satisfeita da malfazeja miséria humana: a riqueza não partilhada; a sorte não compreendida e o ímpio segredo do outro.
O professor Cláudio Lembo publicou uma fantástica obra chamada Visões do Cotidiano. Gostaria de usar esse título para o que pretendo escrever, mas seria aproveitar-me impiamente da genialidade do mestre e ainda confundir a pesquisa de tantas pessoas que procurarão esse livro para seus trabalhos sobre as Ciências Políticas. Eu, contudo, não escreverei sobre Ciências Políticas, Direito de Estado, Direito Público, Direito Internacional ou América Latina – matérias que tenho me dedicado com disciplina militar no mestrado – mas me convém tecer O Silêncio da Urbe. Portanto, a vida que escoa pela sarjeta tem algo a dizer.
São Paulo, 30 de outubro de 2017. Rua Benjamin Constant. Cruzamento com a Praça da Sé. Uma das portas fechadas da Livraria da UNESP. Olhos vidrados e cálidos como o inferno que refletem a tortura sádica da árdua luta pela vida. Pela rija, amarela, conspurcada e enferma. Vê-se os olhos semicerrados de quem não dorme, mas desmaia entorpecido pela dor recorrendo aos entorpecentes necessários da marginalidade. Uma cena que se fosse de um irmão, filho, pai, mãe ou parente próximo causaria o desespero público. Ali, porém, o silêncio.
Eu gostaria de ter tirado uma foto, mas expor aquele senhor por quê? Era como se tivesse que olhar mais uma vez para meu avô que faleceu vencido pela dependência do álcool. Era como se olhasse para ele novamente a uma década atrás – quando enfim deixou de sentir dor e faleceu no seio de sua família – e sentisse novamente sua dor rasgar sua pele magra de um homem frágil, velho e cansado que, nos seus aproximadamente trinta e poucos quilos, resistia em líquidos e dor aguda.
Eu ainda sinto o pânico tocar-me as veias desse meu sangue embriagado de angústia. Era o meu avô, eu juro! Aquele idoso deitado no chão gelado do coração Bandeirante cujos ventos gélidos de uma manhã fria e nublada eram vencidos somente pela coberta velha doada em um dos natais passados – o dia dos esquecidos: Natal – enquanto que ele, em si mesmo, dormia como se a morte estivesse e ali, naquela multidão de corpos verticais, eu senti a solidão daquele corpo horizontal.
 Agora ouvindo músicas como I Dreamed a Dream (Les Miserábles), Where Is The Love? (The Black Eyed Peas) e Empty Chairs at Empty Tables (Les Miserábles), eu sinto a impávida vergonha dessa dolorosa condição humana no silêncio da multidão. Aquele corpo desfalecido como um cadáver não tinha outra opção a não ser o silêncio desumano de esquecimento. Entretanto, aquela multidão ensurdecedora de vozes que passavam por ali permanecia no mais doloroso silêncio: cobriram àquele corpo com a dalmática de ferro e uma mortuária de chumbo e fizeram do seu silêncio o testamento dos esquecidos.
Ninguém viu aquele corpo no chão?
... Não, ninguém viu! Ele adquiriu como os heróis da TV ou do cinema dons mágicos e super-humanos da invisibilidade ficando mais invisível que os mitos do século XXI que vemos na internet, nos quadrinhos e nas revistas. Thor, Capitão América, Batman, Flash. Quem diria que eles - mitos do vazio humano - seriam mais visíveis que o meu avô desfalecido na sarjeta? Ou do teu Pai perdido? Ou do teu filho ignorado? Infelizmente, ele não tem mais nenhuma talento para fazer chorar as almas humanas em um reality show, pois a simples humanidade não basta. 
Ali eu me despedi do meu super-herói urbano. 
Ygor Ditão - SP 30/10/2017 -- São Paulo. 
1 note · View note
ygor-pierry · 7 years
Photo
Tumblr media
ENIGMA
É solitária essa sórdida sensação. Um verdadeiro céu de chumbo. Inegável e inescrutável sentimento de agonia nas margens dos eternos rios do pensamento. Flores de aço no chão de cimento e diademas de cobre nos arranha-céus de concreto. Estátuas em movimento no cotidiano descolorido da sodomia. O vazio se dilata. Nada... Absolutamente nada. Murmurações de incoerências. A paixão transbordante dos animais pseudorracionais. A cólera, a inveja e o egoísmo. Curto pensamento dos homens que não se distanciam um único centímetro de si mesmos. Multidão epilética. Multidão bipolar. Multidão esquizofrênica. Eterna massa patológica. Enquanto isso, carrego no peito as correntes presas por argolas de prata e sinto-as rasgarem paulatinamente minha alma com a eterna percepção da dor de sentir a dor de todos. Verborragia inútil e pensamento fútil que fala mais do que gostaria. Textos de auto-proclamação. Textos de desabafo e ocultação. A eterna mentira presa nos lábios dos clássicos hipócritas. A perseguição indescritível de sonhos narcísicos. Individuo individual no seu sufocante individualismo. Pontes tortas que levem ao caminho de suas anárquicas pretensões. Pontes, portas e chão feito de homens, crianças e cão. Na terra de reis e rainhas, felicidade é ser peão. Enquanto eu escrevia essa agonia dilatei meu coração. Quem disse que eu mesmo entenderia a dor, a alegria e a emoção? Sinto demasiadamente. Sinto deveras. Inquestionável sentir. E é por sentir que rasgo o papel com o eterno sangue dos poetas e discorro como um dadaísta em choque anafilático ao cotidiano sadista. Meu humano. Meu ser humano desumanizado. Meu humano em busca de um bocado... de devoção. Um poema na parede, outro na sarjeta. Uma prosa mal escrita. Uma libertação para um humano vivendo entre hienas, abutres e chacais.
Eu escrevo um enigma para mim e para mim deixo o único direito de traduzi-lo. Enquanto isso... Assisto em silêncio esse circo.
"O perigo está em que cada um, sem fazer nada, espera que ajam em seu favor" - Albert Einstein "Muitas injustiça são cometidas procurando-se o objeto de nossos anseios; poder-se-á afirmar que a ambição é o seu principal móvel" - Cícero "É impossível escapar à impressão de que os seres humanos geralmente empregam critérios equivocados, de que ambicionam poder, sucesso e riqueza para si mesmos e os admiram nos outros enquanto menosprezam os verdadeiros valores da vida" - Freud São Paulo, 01 de março de 2017. - Ygor Pierry Piemonte Ditão Foto de Nuno Alves - fonte:https://www.instagram.com/p/BN63_AvBJcA/ P.S. Obrigado ao meu camarada pela autorização de utilizar sua indizível foto para apoiar a ilustração de minhas paupérrimas palavras.
1 note · View note
ygor-pierry · 7 years
Quote
A igualdade jamais será mais preciosa que a liberdade, pois, afinal, é possível igualdade na escravidão.
Ygor Pierry
0 notes