Tumgik
teoriase · 2 months
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Teatro vazio
Viver parece ser um ato de dramaturgia. As pessoas atuam e cumprem seu papel. O cenário tem cheiro e cor. A trilha sonora tem um tom urbano, moderno, minimalista. As falas ensaiadas durante o banho dão o tom de conversas divertidas e notícias tristes. As cenas, divinamente desenhadas, não precisam de efeitos especiais. Demandam apenas o abrir e fechar de cortinas e cílios. O elenco tem reputação. Todos são os melhores em seus papéis de si próprios. Ninguém poderia fazer melhor.
Seria a vida uma peça de teatro? Já ouvi dizer que a vida imita a arte. A imitação é tão perfeita que deixa de rimar. A linguagem disfarça, faz parecer dois cúmplices meros desconhecidos que se esbarram ao acaso. A vida tem seus atos, produz conteúdo, desenrola uma comédia difícil de engolir. Pois não me admiraria se cortinas se fechassem e o cenário começasse a mudar longe dos olhos do público. Parece que o desenrolar da história já está escrito. Pena que o roteiro se perdeu no caminho.
A sensação fria ao toque do chão lembra as madeiras de um palco. Fazem barulho, estremecem sem firmeza. O suor sinaliza o nervosismo, a ânsia de entregar arte. Ou seria apenas um dia quente? Bom, não resta tempo para dúvidas. Um dia termina para outro começar. Uma cena por si só não faz um espetáculo. Muito menos uma fala mal ensaiada numa voz sem projeção.
Ao artista, sobra sua recompensa. Ele recebe elogios, interage com apreciadores, é aplaudido por seu trabalho. Mas ele toma o risco de abrir as cortinas e encontrar o teatro vazio. De que adiantou tanta memorização e aquecimento vocal se não havia com quem compartilhar o seu trabalho? O silêncio em um teatro é assustador. A escuridão assombra. O teatro vazio é um de seus pesadelos. Se pudesse exprimir isso em um sabor, seria de sangue. Um som, um disparo ecoando em sua direção. A visão das cadeiras é uma cena que harmoniza com vinagre.
O que pode ter acontecido? Seria o seu trabalho em ser ele mesmo tão ruim assim? Não havia quem lhe desse atenção? Ou talvez a chuva tenha assustado o público. Não sei. Mas há rumores de que se ouviu choro vindo daquele teatro por semanas. Mas não é de se espantar. Tanto trabalho e suor não deveriam ser jogados fora assim tão fácil.
Gabriel Lima
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teoriase · 2 months
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Ingenuidade
A sabedoria e a astúcia são como uma criança pequenina. Ao menor sinal do monstro que mora embaixo da cama, elas trocam o sorriso e a vivacidade por medo e choro. Quando o bicho papão é avistado pelas frestas do guarda-roupas à espera do momento certo de entrar em ação, os lençóis passam de fragéis pedaços de pano ao único artefato capaz de fornecer proteção ao pequeno indefeso. Nesse momento, o caminho da cama até a porta do quarto se torna uma trilha inexorável de lodo e lama, como num pantanal que vive encharcado com a noite há anos sem ver a luz do sol. Do outro quarto, se houve o ronco dos pais adormecidos abafados pelo falatório da televisão que foi esquecida ligada e ficou a conversar sozinha pelo resto da noite. Os cães de rua que latem sem motivo aparente viram lobos com sede de suor e sangue. Os pombos da cidade transfiguram-se em urubus famintos em busca de crianças levadas que passaram da hora de dormir. Seria uma sorte o menino sobreviver essa noite. Caso isso acontecesse, os descendentes do pequeno iriam ter ciência desse dia através de trovas medievais recitando tamanha bravura frente aos terrores da infância. Assim é a sabedoria. Ao primeiro sinal de perigo, a própria Atena aparentaria deficiência cognitiva. Assim é a astúcia, que vê na aurora do desconforto o seu próprio crepúsculo. Todos já sentiram isso. O medo de falar em público, por exemplo, faz do professor mais preparado parecer um aluno preguiçoso, que balbucia erros sintáticos e semânticos entre gaguejos. A fobia social faz da simples conversa entre duas pessoas um jogo de xadrez, onde cada movimento representa um sacrifício e ansiedade.
No entanto, não é do feitio da sabedoria, muito menos da astúcia. Elas não perderiam a chance de se mostrar valiosas. Não é coincidência, faz parte do ser humano. O sistema nervoso autônomo funciona com dois regimes, sendo um deles o sistema parassimpático. Ele atua regulando o corpo em momentos de relaxação, onde não há nenhuma necessidade de atuação rápida do corpo. Por outro lado, existe o sistema simpático, conhecido por regular o comportamento de luta ou fuga, quando há algum perigo ou necessidade de reação. Quando é possível relaxar, tanto a racionalidade como a lógica não perdem a oportunidade de fazer o que fazem de melhor. Mas não se pode culpa-los quando o assobio do Curupira ensurdece a cidade. Nesse momento, é hora de dar lugar para a irracionalidade e o instinto de sobrevivência. Eles que dão as caras nos momentos de maior angústia e sofrimento. A ausência da relaxação provoca a presença daquilo que o indivíduo tenta com muita força esconder do próximo: a sua própria fraqueza.
O que chama atenção nessa valsa desses dois sistemas é a ingenuidade. Será que a crença de que decisões racionais e lógicas podem ser tomadas em situações de perigo é só para uns poucos iluminados? É ingênuo achar que seria diferente, pois é do ser humano se tornar burro e sedento pela própria sobrevivência. Assim, é ingênuo pensar que o ser humano poderia se tornar menos ser humano. O artista canta que nós sempre vamos ser muito mais humanos do que gostaríamos de ser. A melodia é dura e real, mais do que melodias doces que nunca saíram papel. A fuga do perigo é real e ela é inocente, mas não diz respeito a nada do que consideramos ser sábio. E com isso vem culpa de ser humano, aquilo que é parte de existir e não é possível remediar.
Aqui, nesse parágrafo, peço uma pausa. Não é comum me colocar em primeira pessoa nos meus textos. Mas dessa vez, os parágrafos anteriores construíram um palco para colocar a luz do holofote sobre o que considero ser um dos meus maiores erros. Hoje eu estou na plateia assistindo uma peça de minha própria criação. Hoje eu sou escritor e leitor. Simultaneamente, sou criador e criatura. Desta vez não vou criar nenhum personagem, já que eu mesmo sou o menino amedrontado com o bicho papão.
Fui muito ingênuo de pensar que todos esses anos eu poderia fugir das cenas na minha mente. Tive bons e maus momentos, personagens perfumados e outros nem tanto. Mas escrever todos eles em terceira pessoa não me afastou em momento nenhum da existência deles. Eu vivi a vida deles, e isso trouxe desconforto. Minha reação? Fugir do texto. Escrever em terceira pessoa. Uma reação inocente de sobrevivência, mas que no fim não é muito sábia. Notei recentemente que fechar o caderno não termina a história. Ela continua dançando na minha mente, enquanto a valsa fúnebre toca ao fundo. Notei que os personagens tem nome e rosto, mas só eu os vejo antes de dormir e depois de acordar. Passo mais tempo vivendo suas vidas do que a minha própria, porque eles são parte do que eu sinto do mundo. E esse foi o meu erro. Um deles, pelo menos. Achar que eu poderia transcender da natureza humana com uma tentativa de fuga tão banal. A sabedoria faz parte de mim, junto com sua parceira astuta. Mas a escuridão do guarda roupas agora olha de volta para mim. E eu escrevo com ingenuidade, como uma forma tola de buscar redenção do perigo iminente.
Então notei que não é de hoje que esse texto existe. Ele sempre existiu. Sempre estive sentado na primeira fileira do meu próprio teatro. Sempre fui criatura formada de minha própria criação. Sempre fui leitor, só fui ingênuo demais para achar o contrário. Ingênuo demais para notar que o perigo e o desconforto já estavam debaixo da cama.
Gabriel Lima
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teoriase · 2 months
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Saudade e angústia
O céu ameaçava a terra com uma chuva forte. Era claro o momento de tensão, dada tamanha escuridão no meio da tarde. Os ventos suspenderam seus roteiros. Também pudera! Ninguém gostaria de se surpreender com o início de tal conflito. A terra nada podia fazer para se defender, a não ser rezar por um destino melhor. Se ela pudesse rezar, afinal, nem mesmo isso era possível. Era quase como uma guerra fria, onde um dos lados era claramente superior, mas que não iniciava o combate sabe-se lá o motivo. Essa cena podia ser vista por trás de janelas de vidro, quase que como uma cena de um filme vista na tela do cinema. Claramente esse momento de chuva era o clímax de tensão de um enredo que se desenrolava desde o canto do galo, desde que o sol se pôs a trabalhar.
Num determinado lugar, haviam duas pessoas testemunhando a cena por trás de uma dessas janelas. As duas sentadas em bancos de madeira, conversavam em silêncio. Sim, em silêncio, como cúmplices de um crime, como arquitetos exaustos, como músicos tocando a melodia de um sonho. Ele tinha em sua mão uma caneta, a qual já não funcionava para escrever e sim para aliviar a ansiedade. Ela sorria meio sem jeito, tímida. Fazia frio, ambos vestidos de forma a se aquecerem. Ele vestia preto enquanto ela vestia todas as outras cores.
Em um determinado momento, a chuva rompeu o silêncio e a trégua. Começou a guerra. Tinha início o massacre de uma sequência de gotas a fustigar o solo. Nesse mesmo momento, ela inclinou a cabeça para o ombro dele e ele retribuiu envolvendo a moça em seus braços. Em frente a uma forte chuva, os dois deram início a uma sequência de sentimentos a fustigar a distância. Ali tinha olhos que acalentavam. Um abraço que aquecia. Um toque que arrepiava. Um fôlego que prometia um dia de sol. Pessoas que, de desconhecidos, se tornaram confidentes.
Mas a terra tinha uma carta na manga. Ilusão! Enquanto a chuva começava a cair, aquele mesmo rapaz, curiosamente, estava sozinho na rua em frente a janela de vidro. Fazia calor do lado de fora e ele vestia branco. Então, debaixo de forte chuva, ele podia ver a cena do interior da janela: ele mesmo ao lado da moça que habitava os seus anseios. Ele conseguia ver claramente a cena, de forma tão intensa que ele sentia a chuva de sentimentos que jorrava lá dentro tal qual as gotas da chuva sobre seus ombros. Você pode se perguntar: como pode ele estar em dois lugares ao mesmo tempo? A terra é sorrateira, tem seus truques, os quais ela dificilmente há de revelar. O que sei é que ele estava lá, parado, em pé, vendo a cena que se repetiu tantas vezes em seus sonhos. Ali ele percebeu algo. Ele sonhava com olhos que nunca o acalentaram. Lembrava de um abraço que nunca o aqueceu. Esperava por um toque que nunca o arrepiou. Pensava em um fôlego que nunca o prometeu nada. Via, ali de longe, de forma tão nítida, o encontro de duas pessoas que nunca aconteceu.
Dessa cena, o quanto poderia ser real? Seria a chuva a dona da verdade ou a terra uma realidade tão absurda para ser aceita? A torrente de dor e ilusão se confunde com a angústia e a saudade, duas irmãs sem sobrenome. Qual das cenas teria acontecido não importa. As duas são verdade, do ponto de vista de um sonho que foi visto e revisto, acordado e dormindo. Ou um pesadelo que aperta tanto ao inspirar quanto expirar, na saúde e na doença. O rapaz notou que aqueles olhos não poderiam acalentar. O abraço não deveria aquecer. O toque não era capaz de arrepiar. O fôlego era morto. O encontro de duas pessoas que não poderia acontecer. As irmãs sem sobrenome fizeram mais uma vítima, sob a fumaça de cigarros e taças de vinho.
Gabriel Lima
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teoriase · 2 months
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Suor, sorriso e lágrimas
Um dia azul. Poucas e finas nuvens cobrindo o céu como trapos de seda. A brisa costumava ser leal, soprando constantemente, apesar da sua timidez no início do dia. Passava rápido cantarolando uma música que fazia a relva dançar com elegância e um sorriso verde. Elas entravam no ritmo do dia, que pouco a pouco via o sol subir a seu posto mais uma vez, vindo lá do Leste. Os únicos sisudos que não socializavam eram as rochas aparentes de um morro. Era fácil entender o motivo: era o morro mais alto de uma região relativamente plana, era necessário impor respeito e altivez, não cabia às rochas serem suaves. Elas eram rígidas como precisavam ser, eram firmes como costumavam parecer. A relva baixa cobria uma parte desse morro, como aquele amigo irreverente, que está sempre disposto a alegrar o lugar. Ambos viviam tranquilamente em harmonia naquele morro, a relva e a rocha, a dor e a salvação.
Ali era uma região rural, onde o verde e o musgo eram predominantes, seguidos dos tons de granito do solo rochoso. A alguns quilômetros de distância do morro, ficava um pequeno vilarejo. A única ligação entre eles era uma pequena trilha de terra ladeada do gramado selvagem. Trilha essa que nascia no entreposto e encontrava seu fim na casa simples de um jovem rapaz, próximo ao pé do morro. Ali, o homem plantava e colhia o seu próprio sustento. Trabalho árduo, mas honesto. Simples, mas honrado. Era seu próprio chão, pequeno, mas fértil. Do morro, descia a água da chuva e névoa, como se a natureza, chorando, assistisse com alegria ao nascer de frutos maduros e saudáveis. Era seu propósito, que de seu suor e trabalho, provisionasse o alimento daquela casa. E cabia ao homem ser um simples auxiliar, colocar as coisas no lugar e deixar o ciclo continuar.
Ele, o homem, era uma pessoa de poucas palavras e muito trabalho. Tinha sua rotina gravada em pedra. Acordava cedo, junto ao sol, para subir o morro e acompanhar a dança das folhas. De lá, bem do topo, via toda a terra se vestir de luz e calor, depois da noite escura e fria. Apreciava tudo como se fosse a primeira vez, com olhos mareados, sentado em uma pequena e sisuda rocha. Era sempre a mesma rocha. Depois de um tempo que só os astros podem contar, ele descia e dava conta de trabalhar no solo, trabalho manual. Dali só saía no aquecer do dia, próximo ao ápice do sol, quando entrava para comer algo e cuidar de seu pai. Moravam os dois ali naquela casa, mas parecia a casa de um só. O pai, enfermo, apenas sobrevivia, não conseguia falar ou andar. Dependente do filho, não se sabia o que ele pensava ou gostaria de falar, ele só respirava graças a seu filho. Então, ele saía para os fundos da casa aproveitar o restante da luz do sol para cuidar de uma pequena horta e um jardim. Por fim, antes do pôr do sol, ele passava alguns minutos olhando a estrada de terra, como se esperasse alguém vir do vilarejo. Por fim, aproveitava de seu abrigo da noite. Assim os dias se passavam, seja chuva ou sol, a rotina pouco mudava. O homem parecia dançar junto as folhas, dia após dia.
Ele nem sempre esteve ali. Morava em outro lugar, vivia uma outra rotina. Recebeu uma carta de seu pai anos atrás. A carta relatava que sua mãe havia falecido há poucos dias. Desde então, ele deixou uma parte de si na vida agitada que vivia para se encontrar ali naquela casa. Talvez seria saudade que ele procurava na estrada de terra no fim do dia? Talvez os dias que se passaram em sua vida não tenham sido suficientes. Quem ele teria deixado para trás? A única certeza era que ele olhava fixamente para a estrada todos os dias.
Até que um dia algo mudou. No fim do dia, o carteiro tomou a estrada de terra que vinha do vilarejo carregando uma única carta, escrita de próprio punho endereçada para aquela pequena casa no pé do morro. Ele estava lá, olhando aquilo, recebeu, e ali mesmo, em pé ao lado de flores e hortaliças ele leu a carta. Ao lado de tanto suor, abriu-se um sorriso. Ao lado de tanta alegria, caiam lagrimas brilhantes. Seus músculos continham em pé um homem que por dentro desabava no solo de seu próprio passado. Descobriu que não se plantam apenas vegetais, que a flor não é a única que floresce e que o sol não é a única esperança no horizonte. Sentiu dentro de seu coração, rochoso como o morro, surgir um riacho de lembranças e boas memórias regadas a vinho tinto. Poucos fenômenos no universo teriam a força e energia que aquela carta tinha. O homem saiu de sua rotina. Em vez de entrar em casa, subiu para o topo do morro mais uma vez antes do sol se despedir a Oeste.
No caminho, o homem via as lembranças que a carta trouxe consigo. Escutava melodias de um violão velho, via um copo de café ao lado de um outro que borbulhava. Via torcidas apaixonadas por um time em uma arquibancada. Lembrava de livros e desencontros. Desamparo e choros. Encontros e despedidas. Pensava em chuva e noites mal dormidas. Via olhos negros como a noite e um sorriso sincero. Entendia que tudo isso era parte de um roteiro maior, onde dois personagens de uma mesma trama se perdem em uma bifurcação.
Ali ele, mais uma vez, sentou-se. A carta era exatamente o que homem esperava todos os dias antes de se recolher. Sua vida anterior ainda era sua vida. Entendia bem o que significava plantar e colher. O presente era o momento do qual era possível ver o passado. O real era a prova do irreal. O incomum só existe por causa do comum. Ali, naquela carta, ele tinha a visão de uma pessoa de seu passado. Gostaria de apreciar aquele pôr do sol com ela, mesmo que esse fosse o último. Ele sentia o sabor da companhia, a doçura de uma palavra, a textura de um carinho. O cheiro de café, o toque de laranja. Tudo isso faria valer a pena. Naquele fim do dia, antes de voltar para o seu pai, ele entendeu. Tinha aprendido mais uma palavra: saudade é fome de abraço, com tempero de suor, sorriso e lágrimas.
Gabriel Lima
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teoriase · 3 months
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Reencontro de uma página e uma caneta
A página em branco assusta. Convida para o jogo da escrita, mas não apresenta as regras. É como um quarto escuro, onde o tato é o único aliado. Passamos a vasculhar os obstáculos para, então, descobrir o nosso caminho até a saída. Requer intencionalidade. Não é possível torcer para a porta subitamente compadecer-se e abrir uma brecha. É só você e o tato. Faz um bom tempo que não seguro uma caneta dessa forma. Intencional. Eu e ela fomos íntimos em algum momento, mas nos afastamos por um motivo ou outro. Tenho certeza de que não vai ser breve ou fácil colocar os assuntos em dia. É como ter que reaprender, reabilitar os sentidos num corpo dormente, insensível por anos. Já imaginou perder a sensibilidade ao toque? Do ponto de vista de uma página em branco, foi exatamente isso que aconteceu comigo. Grandes amigos que viraram completos desconhecidos.
A página em branco é uma aventura. É abrir a janela para uma enxurrada de pensamentos e lamentos. Lembro de um dia de sol, como hoje. O céu azul, poucos compromissos, numerosos pássaros cantando ao longe. Para viver o dia, precisa dar o primeiro passo para fora. Escolha a rota, os passos seguintes se tornam consequência. Sem consciência, o coração pulsa vívido dentro de um corpo velho e cansado. Quando foi que o tempo passou? Já é final da tarde, logo a noite vem. Para a página, o tempo passa à medida que as linhas vão sendo preenchidas. E no fim, quando a vida lhe permite o último suspiro de suas últimas pautas, cabe-lhe o gozo da esperança de não ter vivido em vão. A página agora tem uma história a contar. Quando olho para mim, vejo que o tempo também passou. Alguns anos se passaram como uma brisa de inverno, rápida e tímida.
A página em branco é solitária. As que já foram preenchidas viram história. Viram o nada se transformar em cor. Viram uma onda quebrar nos pulsos de quem escreve. Viram o parto de uma ideia, que nasceu com algumas complicações e choro. Elas já viram muita coisa. E de certo modo, elas têm assunto para conversar. Por isso é muito comum vê-las juntas em um livro, passeando e rindo como um grupo de amigos de infância. E sabemos que um livro não tem grande uso para páginas sem história para contar. Elas normalmente não são vistas assim, em atos sociais. Vai ver até evitam esse tipo de interação. São tímidas, não têm muito o que falar. Algumas poucas, no entanto, conseguem mudar essa realidade. Mas isso nã́o é sorte ou graça. É preciso se arriscar, tomar riscos, literalmente. Precisam ser vulneráveis e disponíveis para o desconhecido. Sob essa condição, novas histórias surgem. Por mais que sejam histórias de rotina, ainda assim, contam a vida de uma página. Cada uma, pouco a pouco, vai sendo maquiada com tinta e suor.
Gabriel Lima
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teoriase · 8 years
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Alguns nascem para mover o mundo Para viver suas fantasias Mas a maioria de nós apenas sonha com As coisas que gostaríamos de ser Mais triste ainda é ver isto morrer Do que nunca tê-lo conhecido Por você, o cego que já pôde ver O sino dobra por ti...
Rush
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teoriase · 9 years
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Inevitável
A madeira era o lar daquela família. Um par de leques na parede, fotos apagadas, garrafas velhas que, vazias em café, cheias em tempo de serviço pronto e leal. Nos dias de glória, uma bela toalha branca era o tapete vermelho para os pratos dos banquetes rotineiros daquela casa, cobrindo a força de uma rude mesa, bem acabada, sobrando apenas a nobreza e elegância rústica que tornavam a nostalgia um sabor tão corriqueiro. Nas bandejas, copos de todos os trejeitos, formas, nacionalidades e humores. Sentia-se a persistência do vinho, da uva, do doce amargo choro de alegria de rubro tempero e alvo cheiro em cada copo. Cada um contava sua versão do passado, em bocas de cristais aveludadas em cada sotaque próprio. Daqueles copos se ouvia que tal época de ouro já se passou.
Uma senhora duvidosa das palavras morava lá. Tinha pavor de mal entender as entrelinhas. Cantava todo dia mais uma tola poesia. Acordava e ia para sua pasárgada particular. Com sorriso e afetos sobrenaturais por todo aquele ecossistema. Flores de virulenta beleza eram como correntes aos olhos. A senhora amava aquilo. Ainda mais com todos aqueles copos, seus servos fiéis. Eram dias de festa, onde lá, era amiga do rei. O bobo da corte estava lá, só bastava ouvir as metáforas: a vida. Confiante que os anos jamais a deixariam na mão. E de mão leve, usufruía de todo fruto, de toda fragrância e aroma, de todos os sabores, variando do queijo ao mel, no mesmo prato. A senhora lia novas aventuras com os olhos fitando o tempo, levando todas as encomendas que, inevitavelmente, chegavam. Este carteiro tinha pressa, correndo no seu breve tempo. Mas se o carteiro corria numa correria sem pé nem cabeça, a senhora nem de longe perceberia. Eram dias de folga, de descanso. De esquecer do mundo e de si mesmo.
O tempo, porém, entrega cartas que, inevitavelmente, chegam. O dia, inevitavelmente, acaba e se põe o sol, a luz e aquelas xícaras agora precisam ser lavadas. Desde aqueles tempos de glória, passaram-se anos de roupa mal lavada, de comida mal comida, de verbos mal conjugados e ares mal respirados. Havia acabado o concerto prestíssimo de alegria e o adagio da casa suja havia começado, com tons tão tristes quanto as lágrimas que criaram os mares. O canto de lamúria vinha com o sopro do vento na boca dos copos de cristais ainda não esvaziados. Dificilmente aquela senhora entenderia o quão inexorável a falta de presença dela pesou na presença de falta de futuro.
Antes, festas adornavam aquelas grandes paredes de madeira que eram moldura para tanto aconchego. O branco tornava tudo tão claro e vívido. A temperatura era agradável e o mar massageava os pés daquela terra cansada. Vinha sim aquela boa brisa que os narizes agradeciam. E tudo era tão harmonioso. E foi assim aquele encanto daquela senhora, ainda senhorita, por tal lugar. Tão formoso lar era formado ali, cenário de festas e cantigos. Montavam-se cenários que, a custa de muito suor, se faziam cada vez mais fortes e bem vivificados.  Eram dias de prazer, onde os copos multiplicavam as bebidas, as bocas multiplicavam os sorrisos e a embriaguez dividia a conversa. O mundo de perfeição era ver o mar dourado em vestes de seda que o sol ousava costurar todos os dias durante o fim do dia. E de tantos dias se viveu assim que nem de perto se contam mais quantas festas foram inventadas e procriadas.
Mas olhando agora, o branco deu lugar ao verde enjoado que os musgos carregavam consigo, os copos agora tinham poeira e desalento. As bebidas agora eram jogadas ao mar. As bocas se fecharam e partiram para, bem, não se sabe. Mas o que se sabe é que perdidos se encontram onde os achados se perdem. Perder uma rima para ganhar um significado. Confuso é pensar em como tais festas sumiram e agora deram lugar a mesas vazias. Tudo agora era o fim, exceto uma cadeira ao fundo da sala, embaixo do relógio. A senhora estava lá, sentada em grande casarão, ouvindo o tempo contar uma história por tique-taque, ouvindo a música que a mente não deixava esquecer. Com a boca seca, sentindo sede de voltar, sede de ser mais uma vez a dona da escolha. De todos os modos, reclamava. E essa fina linha que dividia dois trejeitos era tão bem desenhada que as duas faces da moeda se viam. Mas nunca se tocavam. Uma cena tão amargurante poderia ser tão bela uma vez. E que de beleza, os copos jamais se esvaziariam. Permaneceriam, inevitavelmente, cheios. Em equilíbrio, em paciência e em bandejas. Uma por vez, servindo ao fim da história cujo desfecho é inevitável.
Gabriel Alves
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teoriase · 9 years
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Caminho
Olhou para frente. Viu o grande abismo que se fazia bem debaixo de seus pés. O tanto que havia andado tinha a assinatura do esforço banhado no suor do cansaço. Tanto caminhar para chegar numa visão tão depressiva quanto a própria depressão. Doía ainda mais para ele. Aquele que havia perdido o futuro a muito tempo atrás, o brilho em tanta escuridão, a coragem em tamanha correnteza de medo.
Basta olhar para a dificuldade, que vem o vento e derruba todos aqueles heróis de areia. Sobram apenas aqueles pobres servos que sabem voltar e reconquistar aquilo que nunca deixou de os pertencer. Ele ainda não sabia se reconhecer, nem mesmo no espelho. Tão sujo e relapso consigo mesmo. Havia ganhado mais 20 anos nos últimos 20 dias. Sempre que depois do descanso vinha a tormenta, o tempo parava num sorriso tão singular quanto uma vida limpa. Sabia o caminho de volta, mas era tão doloroso imaginar tamanho desespero vivido novamente.
À porta bate alguém. Vinha o barulho em sua mente, em cadência com o relógio. Não há como ser mais perturbador: ser esmurrado por simples padrões irreconhecivelmente repletos de anemia. Sem sangue, as pernas doem, mas poderia continuar se, citazmente, melhorasse. Se tais mentes sucedessem. Imagina tanto sorriso contido na ponta dos dedos? Correu sozinho para longe do momento em que a bússola que apontava para o norte perdeu o juízo e se embaralhou. Era um ponteiro sem vida, embevecido em tamanho calor. Não era para menos. Era um senhor abismo ali. Tanto que o outro lado era obscuro. Não havia caminho nem trilhos.
E quando o sono vinha, só ia embora quando o carcereiro chegava. Estava preso em frente ao abismo, sem direito a fiança. Não adiantava ser tão afinado e nos finalmentes ser apenas um abismo vazio. Enrigecido como uma rocha, pensava em como sua própria mente desenharia o resto do caminho.
Gabriel Alves
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teoriase · 9 years
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Não importa quão alta é a árvore, as folhas sempre voltam para a raiz
Provérbio chinês
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teoriase · 9 years
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A melhor hora do dia
Eram horas que nem de perto se contavam. Como num grande exército, eram intermináveis os ponteiros daquele relógio que devorava cada vez mais a luz do dia, produzindo a nudez da noite. Cada relance de volúpia traduzida em uma silhueta de escuridão, retocada pelo silêncio e pela calma. Era assim descrita a melhor hora do pensamento, da criação e citação de prosa programada e cientificamente poética. Melhorar o caminho, só com uma boa noite e sono e sonhar com aquilo que não deixou de existir. A diferença é que algo novo passou a coexistir numa mente infinita em possibilidades de canções sinapticamente conectadas e compassadas com cadência e parcimônia.
Cada luz que ficou para trás é uma ajuda que foi deixada para alguém. Cada brilho de sorriso e suor é peso de momentos bombardeados no mais profundo espaço dos átrios cardíacos, pois é sendo dois perdidos que seremos um só, se encontrando naquele lugar que só existiu nos contos de fadas. Cada movimento em um formato particular e cada nome em uma peça de uma máquina inquebrável. E mesmo que o caminho se apague, sempre existe a fé em ver o destino após tanto deserto. Reconhecer isso é uma forma de entender e agradecer àqueles que sempre mereceram e nunca receberam. Aqueles que não deram um abraço, mas eram o abraço, em número, grau, gênero e conforto.
Gabriel Alves
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teoriase · 9 years
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Princípio da chuva
Desde a primeira gota de chuva, o som da aventura chamava lá fora. O frio era o que aquecia aquela vontade, a umidade secava o suor e o cansaço tornava todo aquele esforço confortável. O lar era lá fora, debaixo de qualquer clima que fosse ousado o suficiente de tentar pará-lo. Não se importava com cortes ou joelhos arranhados, apenas com a quantidade de balões que veria no céu, quantas gotas de chuva iria encontrar, quantas poesias seriam atuadas ali. Cordialmente, não há educação maior do que ser assim, criança, sincera, louca por um momento de paz. Tanta energia tinha que ser disposta para que, de forma grave, o sono fosse benefício. Bem baixinho, se esgueirava para sentir o aroma que o céu trouxe com uma refeição tão divertida, pronta para ser provada, aprovada, vivida e nunca mais esquecida.
Queria saber se a matemática iria atrapalhar dessa vez. Como seria bom se isso nem existisse. O paradoxo da história científica é simplificar tudo, porém complicando a si mesma. Quem confiaria nela? O menino não queria sequer saber disso. Apenas da rua cheia de doces alegrias. Pena que o dever de casa não se resolve sozinho.
A vontade era de correr tão intensa quanto a luz perdida na vastidão vazia do espaço, quanto o grito de dor do parto, quanto a simples paixão por qualquer traço de fato que venha a ser uma sucinta rima, como uma natural obra-prima, onde se faz sem mesmo se perceber, mesmo quando se esquece de viver. Mas de fato, o menino correu, para a rua, onde se esquece de viver e passa a ser. Ser o que ele queria. Tão pouco para uns, mas para ele já bastava estar ali, divertindo-se, sendo amigo de uma gota de chuva.
Gabriel Alves
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teoriase · 9 years
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Sopro
Cada pulso de vida de uma brisa que vinha do alto mar era um bom sinal. Afinal, uma boa flauta só é boa quando alguém a sopra, qualquer vaso fica melhor quando dá forma às flores. Era assim que ela pensava. Cada palmo de distância que o vento pudesse correr, menores eram as preocupações e a doses de café. Cada convergência dos ventos contra ela virava uma série infinita de sorrisos em favor dela. Quando mais forte o vento, menos noites em claro vigiando o mar seriam necessárias.
Mas era tão ruim quando o vento parava. Era como se as cortinas se fechassem no meio do espetáculo. A dança do vento virava a canção da agonia e o canto do medo. Mas a esperança sempre é a última que morre. Mesmo sem vento, os olhos tinham o horizonte como alvo. Não havia brincadeira de mau gosto da atmosfera que a tirasse da sentinela do mar. A flauta estava parada, mas algo dizia que no próximo minuto, a melodia seria ainda mais bela e desafiadora. Em velocidades que nem mesmo a luz gostaria de percorrer.
O mar estava tão belo, debaixo do sol, mas a noite sempre há de chegar. E ela vem com enigmas que gostam de desafiar a maior das certezas. Pois a mente fraca busca com os olhos o alvo errado. E o que fazer? Acender uma vela e ascender a harmonia, numa voz dual que antes era forte onda e agora é solitária calmaria. A suavidade fazia pensar nos ares que vinham do horizonte de um ponto de vista que não se via com tanta luz. E nesse cenário, nunca se separavam o mar, a moça, e os ventos. Como se ela parasse para dançar, esperando o par verdadeiro. Aquele de sorriso incerto, que vinha caminhando em sapatos de vela e mastro, num deserto de água e sal. Só se esperava o momento que a música parasse e ele chegasse, pedindo a mão da moça com elegãncia para uma dança.
As cordas soavam e o vento tratava de levar as notícias para os ouvidos dos pacientes. Ela sorria, como sempre, ao lado de xícaras vazias. Era um tom arrojado, porém tímido, o som do sol vindo de volta, apagar aquela vela. E as ondas lavavam os pés sujos e já cansados. As nuvens vinham e traziam bons presságios, em cenários pintados da melhor maneira. Obras de arte que não se vendiam, mas eram gratuítas para qualquer um que se dispusesse a assistir com o sopro do vento trazia um novo amanhecer, banhado em ondas tão duais e frequências tão incertas.
O mais interessante do choro é que o sorriso sempre vem mais gostoso, temperado com sentimentos mais coloridos e particulares. E ele sempre aparece na hora da dúvida, do que é permanente e transitório, mas depois das lágrimas, o que é transitório se desfaz exponencialmente. Sobrando apenas o que é bom. O que é desprezado faz o seu próprio bem.
E no fim do pranto, o alento vem, cuidar do que é seu e do que é bom. Que o navio apareceu no horizonte, isso já estava bem óbvio, mas toda viagem traz consigo uma bagagem tão grande quanto o caminho. O amor cresceu, junto com todas as canções que o vento cantou num belíssimo concerto de saudades e poesia. Onde o fim termina tão suave quanto o começo.
Gabriel Alves
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teoriase · 9 years
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Dia
Eu quero ser alguém, para poder regar e ser regado. Quero beber, para conseguir digerir tamanha sujeira. Quero comer, para me limpar com justiça e nobreza. Fugir desse quadro cuja tinta mancha e não sai, pinta e marca, chega e fica para sempre. Fugir dessa cena que o sol já ofusca, queima e despedaça. Fugir desse lugar onde as estrelas todas lembram os rumos que a história trilhou, a sons e ritmos de grandes ferrovias que só terminavam cem metros depois da estrada do horizonte. Quero viver e voltar a ser vivo, cantar a poesia, quero andar pelas águas e sentir o amor de ser molhado por tantos risos e pingos que se confundiam no mesmo disfarce. Pois antes fui menino, hoje sou homem. Amanhã, não serei mais eu. Tive medos, tenho incertezas, amanhã, terei sonhos. E espero um dia poder cantar e contar os números que tive ontem, que tenho hoje e terei amanhã. Pois ontem tive pouco, hoje tenho justos, amanhã terei o mundo inteiro. E finalmente poderei ver, que o que passou teve fim, o clímax de um enredo escrito a passos lentos e cautelosos, num tempo que só o relógio acompanha, num ritmo que só os grandes andaram. E o fim é incerto, mas esperançoso de que melhor que o presente, só as perspectivas. Um dia dará certo, e isso eu não posso querer. É só o que ouvi falar. Gabriel Alves
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teoriase · 9 years
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O melhor amigo da dor
Sentado era o jeito que a jornada havia começado. A dura jornada que só havia um terrível obstáculo: a paciência. O tempo passava e a guerra era contra o desejo, contra a vontade de querer viver e querer ser e estar bem. Talvez não fosse possível entender, mas era assim que começava a sua caminhada, era esperando que o fardo ficava pesado, mas que se chegaria ao tão sonhado prêmio final. Como se numa guerra, o exército que mais perdesse as forças fosse o campeão. Nessa guerra, o soldado era um pequeno cão, distinto, peculiar. Ele só esperava pacientemente que a porta abrisse, que o sol passasse pela entrada e seu melhor amigo viesse fazer um carinho leve na cabeça, balançando os pelos marrons e as orelhas murchas.
Sentado, o paciente cachorro via as diversas faces e disfarces da paciência: o amor, atencioso; a impaciência, determinada e raivosa; o tédio, depressivo; a euforia. O que viria por aquela porta seria o que tinha ido embora um dia, seu tão profundo amigo que saiu apressado. O pequeno cão, sem entender, sentou na porta e passou a esperar. Era incrível imaginar um futuro feliz com o dono no jardim, mas triste seria o cão caso ele soubesse que seu amigo não voltaria. Mas sem saber disso, ainda era capaz de ver sinais de alegria no cão, delirando em tamanho mar de esperança. Quem imaginaria que o sol um dia secaria o oceano inteiro?! A dor era crescente no pequeno animal, mas aprendeu que seu melhor amigo agora era flutuante ao redor de toda essa filosofia. E o futuro incerto espreitava, onde o pequeno cão apenas ignorava o que era mal.
Gabriel Alves
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teoriase · 9 years
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Juntos nós vamos desvendar o céu
S.W. Hawking
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teoriase · 9 years
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Terra e Ar
O sopro que começou nos ouvidos foi dilacerante. O arrepio era veloz, forte e insistente. Puxou uma companhia nos olhos e começou a descer, fazendo rastro de cenários pintados em lágrimas, seguindo os traços mais frágeis do corpo. Os dedos tremiam, as saudades já apertavam o que não tinha mais aperto, já folgavam o que não podia mais respirar. O que passou pelos ombros tinha gosto de sal, vibrante, com gritos de vermelhidão. Foi durante a noite, quando tudo voltou ao seu lugar, que o caos se estabeleceu em tamanha ordem. O errado que era certo agora era pecado e o que mudou era o fim do novo início do fim, do clímax da maior sinestesia que foge dos sentidos humanos. Se encontra na natureza, entre o que é concreto e o que é sonho. Entre as pernas cansadas e o convite para dançar. Se não entende, olhe bem e pense se já agradeceu por tantos sonhos nascidos de meros sorrisos. Olhe bem para o que se fez terra em pleno ar e depois sumiu. O desejo de voar para o homem sempre foi algo presente, mas sabe ele que não é natural tirar os pés do chão
Gabriel Alves
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teoriase · 9 years
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Milky Way ➾ Luke Gram
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