Tumgik
joaogrande-blog · 9 months
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Registro de Um Quase
Hoje, mais uma vez tentando dar continuidade a uma das tantas tentativas interrompidas de escrever um poema dedicado à minha irmã, penso no que Fernando Pessoa quis dizer quando escreveu que “O poeta é um fingidor…Finge tão completamente, que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente”. Não quero que pareça simples amor o amor que deveras sinto. Já procurei minhas melhores palavras, as mais simples e fortes, assim como a pessoa para quem quero dedica-las, mas escrevi e apaguei tantas letras, uma a uma, que temo não finaliza-lo mais uma vez. Então, ao menos por hora, gostaria de registrar que me faltam palavras para anunciar meu amor por minha irmã, Maria Eduarda.
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joaogrande-blog · 1 year
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ONDE SE É ETERNO?
Se a eternidade é vivida em outro lugar que não aqui, como é que ontem à noite eu aprendi com Aristóteles? E, algumas manhãs desta semana, despertei alegre ouvindo Belchior? Ou, então, como que hoje pela tarde, me senti amada com os afetos de uma tia que aqui não está mais?Todos eles já se foram, e se estiverem sendo eternos em algum outro lugar, certamente o estão em dois, porque aqui eu os encontro, escuto e sinto. Se a eternidade se busca em vida através de boas obras, ela fica em vida através das mesmas obras. 
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joaogrande-blog · 2 years
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Crônica: O Gênio Literal
No cruzamento da Avenida Malfatti com a rua 22, Carla, uma moça menina, sem perceber, chutou uma lamparina.
Da tromba do antiquário enferrujado, girando, saiu Literal, o gênio do ocidente:
– Aqui estou, diga já, em alto, bom tom e sem titubear, o desejo do seu coração, que eu o realizarei.  
No início, a Menina achou que estivesse delirando, coçou os olhos, os abriu lentamente, mas o gênio ainda continuava lá com seu bloco de notas em uma das mãos e uma caneta na outra, como um garçom com pressa para anotar um pedido.
Quando a menina estava prestes a pedir por riqueza infinita, teve a mente tomada por um filme de super heróis da Marvel que tinha assistido duas noites atrás e movida por um sentimento heroico, soltou:
– Desejo que haja igualdade entre as pessoas.
– “Igualdade entre as pessoas” – repetiu Literal enquanto anotava o desejo no bloco de notas para depois desaparecer junto com a lamparina.
Doze anos haviam se passado e a Menina, sentada na sala de espera da clínica MenosVocê, lembrava do inusitado dia em que conheceu Literal, ainda tentava decifrar se tudo aquilo havia sido real:
– Mas como seria real? Doze anos já se passaram e ainda há tanta desigualdade no mundo – pensava a Menina quando foi interrompida por Kelly, a recepcionista da clínica:
– Oi lindinha, deu uma olhadinha no catálogo, decidiu o que vai querer?
A menina, que tinha diante de si um catálogo com vários rostos, apontou para o de número sete e disse:
–  Quero desse jeitinho aqui, boca bem grande, sobrancelhas bem.....
– Ótima escolha – interrompeu Kelly – todas querem ficar assim. Me acompanhe – prosseguiu a recepcionista enquanto levava a menina para iniciar uma sessão de harmonização facial.
De trás de uma nuvem cumulonimbus, Literal observava a cena e se orgulhava de seu trabalho quase completo.
 Keren L.Baesso. 
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joaogrande-blog · 2 years
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Eu, definitivamente, sou melhor com sentimentos do que com palavras.
Olhe na janela dos meus olhos e veja,
da garganta para baixo, fogo,
da boca para fora, brasa.
Qualquer dia desses, tentando me expressar, eu cuspo meu coração. 
Keren L. Baesso  
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joaogrande-blog · 2 years
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Conto: Minha Avó Curandeira
                                 MINHA AVÓ CURANDEIRA
   Eu ainda estou na cama quando ouço os passos dela atravessando a casa. Do seu quarto até a cozinha nos fundos passa assoviando uma melodia despertando toda a vida que à rodeia. Faz uma pausa diante da velha janela de madeira que da antiga tinta verde que antes lhe cobria toda, só possui algumas manchas no centro que vão sendo tomadas pela cor do Ipê de que é feita, mostrando que o tempo, trabalhador silencioso e constante que é, não cessa até revelar a natureza de tudo e de todos.
Com suas mãos enrugadas ela roda a tramela para empurrar a janela e, sem pressa, inspira profundamente o ar daquele dia, o prende por alguns instantes no peito e depois o devolve num sopro longo.
  Ao chegar na cozinha ela se farda jogando o velho pano de prato sobre um dos ombros, e entre suas garrafas, ervas, moedores e bacias, se prepara para mais um dia.
O cheiro da lenha virando brasa e o barulho da agua da torneira escalando as paredes do bule velho e cinza terminam de me despertar. Eu levanto, ainda de pijama, as vezes enrolada na coberta, para encostar na pilastra de madeira da área e observa-la trabalhar no seu quintal.
Lá está ela recolhendo algumas folhas do pé de boldo e dando um cheiro bem fundo no pé de arruda que fica do lado. No pé de espinheira santa ela segura na palma da mão uma das folhas e, sem arrancá-la, a observa bem de pertinho, as vezes até fecha um dos olhos como quem utiliza um microscópio. 
Depois de soltar a folha, ela dá dois passos para trás para observar a erva de longe, e com a mão na cintura mede o pé da raiz até o ultimo galho que olha com a testa franzida por causa da claridade que lhe atinge os negros e atentos olhos.
Minha avó dedicou tanto tempo para observar e aprender as preferências e exigências da natureza, ela fala da fase da lua que é boa colocar a muda na terra e da fase que é boa para podar os galhos. Ela fala também dos benefícios de cada erva, casca, folha, raiz de pau e de como devem ser preparados e consumidos.
Ela também explica que o melhor é quando acha a planta nativa, por isso gosta de ir andar no mato, e sempre volta contente quando acha Teiú, cipó-de-vaqueiro, Manjerioba, Jurema-branca, Jurema-preta.
Hora ou outra alguém que passa tem os olhos tomados pela abundancia verde do quintal da minha avó. É comum pedirem uma ou duas mudas, mas é comum, também, que, dia ou outro, quando encontram minha avó, se queixarem que a erva não prosperou em seus quintais -“É a mão! ” - dizem eles com um sorriso conformado.
 Mas apesar de não haver neste mundo algo ou alguém que não desejasse ter sobre si aquelas mãos macias, ainda que calejadas, e calmantes, ainda que não parem um instante, a verdade é que no quintal de minha avó, as plantas sabem que servirão para um imenso bem e por isso gostam de nascer por aqui.
Neste dia, não dava 7 horas da manhã e a chuva caiu do céu de um instante para outro, como se quem lá de cima derrubasse um balde gigante d’agua. E, em meio àquela barulhada que faz a agua quando cai de tão alto, surgiu uma voz franzina vindo da frente da casa:
– Dona Dulce...dona Dulce.
– Escuta! – Disse ela com o dedo indicador apontado para cima, como quem pede silencio para decifrar se é voz de verdade ou se é da mente.
Mas sem esperar que o chamado se repetisse ela foi olhar no portão.
Pendurado sobre ele estava Leandro, filho mais novo de Dona Ana Santa, amiga de minha avó. Moravam duas casas acima da nossa, na que tem uma porteira larga que vive aberta porque emperrou na terra de tanto a molecada trepar na hora de abrir.
O menino, assim que viu minha avó, encheu pela última vez os pulmões e soltou num golpe só:
– Dona Dulce, corre que é André, fez arte!  Foi mexer onde pai não mandou, agora tá lá, com o braço cai num cai, a mãe acha que é um bicho que picou.
Apesar da cara de espanto do menino, que tinha os olhos arregalados debaixo daquela chuva forte, havia certa satisfação em sua fala, não pelo que tinha ocorrido com o irmão mais velho, mas pela rara oportunidade de relatar uma brincadeira com fim trágico em que não era ele o protagonista. 
Mal terminado o recado, Leandro montou com dificuldade na velha bicicleta que quase não lhe dava pé e partiu pedalando a magrela ligeiro rumo a sua casa, como se sua presença naquela ocasião fosse a mais indispensável, embora tivesse apenas 9 anos.
Ainda que minha avó soubesse que o menino tinha uma imaginação muito fértil que o fazia, muitas vezes, exagerar suas histórias, recebeu o recado com a mão no peito e, sem pensar duas vezes, lá foi ela, armada de garrafadas, tão determinada a chegar depressa que até esqueceu que chovia.
 Pois minha avó sabia que, debaixo de sol forte, ou sob chuva, a curandeira não tem escolha quando lhe mandam chamar, estes são os encargos de seu ofício.
Chegando na casa, já estava André de pé ao lado da porta esperando por minha avó. O pequeno olhava para o braço que tinha uma região inchada e vermelha, muito longe de estar caindo como descreveu seu irmão Leandro, mas é certo que doía.  
O pai, senhor José, que andava de um lado para outro, quando viu minha avó, foi logo explicando:
– Ele estava mexendo em uns sacos velhos que eu tinha deixado no paiol, eu só ouvi o grito e quando cheguei o braço da estava picado. Eu revirei tudo, mas não achei o maldito bicho, mas ele diz que dói muito. – E prosseguiu:
– A Ana foi ver se o neto do senhor Paulo está em casa, e se não emprestava a moto para nos levar ele no postinho de saúde, mas com essa chuva e o barro que fez na estrada, a gente ia chegar na vila só amanhã.
Embora os ouvidos de minha vó estivessem voltados para o pai que, quanto mais falava e pensava na situação, ia sendo tomado por uma irritação, sua atenção e olhar eram para o garoto.  Ela segurou o braço magrelinho que o menino trazia apoiado junto ao peito, e depois de olhar a picada de perto, disse sem titubear:
– É lacraia! Está vendo a mordida aqui em formato de V? – Perguntou para a criança contornando o local com os dedos.
 – Pega no saco a garrafa verde – Disse ela para mim.
 E enquanto eu atendia a ordem, ela tomou nos braços o menino que até então não tinha dito uma palavra e mordia os lábios para não chorar sob o olhar preocupado e irritado do pai. Mas no instante que se debruçou no colo acolhedor de minha avó, deixou que as lagrimas escorressem e, com elas, um pouco de sua dor para ser absorvida por aquele colo que tudo compreende. A cura já havia começado antes mesmo de eu lhe entregar a garrafa.
Ela começou a passar o liquido da garrava sob a mordida que aos poucos foi perdendo a cor vermelha, esfregava e ia dizendo ao menino que a dor já já ia embora.
Além da sabedoria sobre ervas, plantas e remédios naturais, mulheres curandeiras como minha avó também são cheias de amor e bondade, prezam a vida acima de tudo e difundem a empatia por onde passam.
Neste instante chegou D’ Ana Santa, com barro que chegava até as coxas, e depois de ver minha vó, a notícia que trazia angustiada, foi dita de forma aliviada:
– Senhor Paulo não estava em casa – Disse enquanto ia para junto do filho verificar o braço:
– Já está muito menos vermelho, hein? E a dor meu filho, melhorou? - perguntou D’Ana para o filho.
O menino assentiu com a cabeça.
–O que é? – Perguntou D’Ana para minha avó enquanto segurava a garrafa verde nas mãos.
– Essa eu fiz de Casca de salgueiro, Açafrão-da-terra e Arnica, vou deixar aqui, continua passando nele vez em quando para aliviar a dor enquanto o veneno sai do corpo, ele vai ficar bom  – Respondeu minha avó.
– Que benção! Eu até tinha Arnica aí, mas nunca ia saber que era bom. Quem te ensinou esta?
– Ninguém ensina nada pra gente, não, a gente já nasce ensinado – Respondeu minha avó rindo.
Nessa hora, minha avó preparava-se para ir embora, quando D’Ana Santa chegou ao meu lado e, preenchida por um enorme alivio e gratidão, pôs-se a me contar uma história:
– Eu era criança, mas lembro das duas chegando aqui nessas bandas, sua avó e a mãe dela, D’Maria de Fatima Silva Correa. Aqui era muito menor que hoje, dava de contar as casas nos dedos. 
Sua avó, desde pequena já tinha visão de fazer remédio. Um dia, nos ainda era moça, eu corria em meio uns pau velho quando pisei num prego apontado pra cima, eita como doía! O bicho era grande e todo enferrujado. 
Meu pai que puxou pra fora, mais eu ainda fiquei ruim, deu febre que eu delirava, e a ferida só ia abrindo mais e ficando amarelada.  Passei dois messes sem conseguir botar o pé no chão. 
Numa noite de São João todo mundo foi para a festa no Araripe, pras novenas, e eu fiquei sozinha em casa. Pedi a meu pai que fizesse uma fogueira no quintal e deixasse a porta aberta para eu podê ver de onde eu estava deitada. Eles foram todos pra festa e eu fiquei só, mais D’us e um cachorro. 
Aí eu pedi a São João Batista: você é Rei, você é tão forte que foi quem batizou Jesus, por isso estou te pedindo, implorando ajuda para andar de novo. Eu fui dormir e quando eu acordei estava sua bisavó mais sua vó lá em casa, falando com meu pai e olhando a ferida do meu pé. 
Sua bisavó olhou pra mim e disse ‘tá pensando que vai morrer, minha filha?’ Eu disse ‘tô’. ‘Mas não vai, você tem muito que viver ainda menina... ter sus filhos.’ Eu disse ‘aleijada?!’. ‘Não, minha filha, que tudo que tem começo tem fim, daqui a trinta dias você estará boa.’ 
Aí ela passou a receita de uma garrafada a meu pai. As plantas só tinha na Serra do Araripe e meu pai foi caçar. A garrafada tinha de ficar sete dias enterrada num buraco feito de frente para onde o sol nasce. Com 26 dias eu já estava caminhando.
E depois de uma pausa profunda, para retornar da viajem que acabara de fazer, D’ Ana Santa prosseguiu:
– É... Nós não tinha para onde correr não, gente morria aqui até de gripe, esse postinho que tem aí hoje, é mais novo que André, antes era só nos e Deus, até que chegou as duas.... Ajudaram tanto nós. 
A casa de sua avó vivia cheia de gente, quando não era um buscando remédio era visitando um infeliz que estava sendo tratado lá. Elas não paravam. Nunca pediam nada em troca do serviço e nunca se queixavam, uma só vez, ou se recusaram em atender um chamado na madrugada. 
Nesse momento, o olhar de D’Ana Santa, diferente de quando iniciou a história, era abatido e sua feição séria. A sua intenção de agradecer minha avó, exaltando seus feitos, se confundia com um sentimento de pena, pena de seu povo e de minha avó, que já tanto tinha lutado.  
Mas, D’Ana Santa,  não entendia que, minha avó, pesquisadora da vida atenta que é, já descobriu a muito tempo que, assim como as ervas de seu quintal, sua natureza é ser instrumento.
 E, por isso, dorme tranquila, realizada na doação de seus dias na luta pela vida. Luta com aquilo que tem,  se não há livros e professores, a vontade e a necessidade ensinam também.
Se doa, se doa, ajuda, ajuda, quantas avós Dulces pelo mundo já não foram cura? 
Keren L. Baesso 
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