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isetfckngchaos · 4 years

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Prelúdio: sufoque-me. | Seth, Nicha, Hórus.

Abro os olhos e é como se não o tivesse feito.

A escuridão não me incomoda, muito menos me assusta. Não sei onde estou, mas sei que estou deitada, porque posso sentir o chão gelado sob meu corpo. Me levanto devagar e me ponho de pé. Dou passos em direção ao nada, sem saber o que estou fazendo, e, de súbito, sinto algo sob meus pés. Algo quente, escorregadio e viscoso entra nos vãos dos meus dedos. Não demoro para entender o que é — o cheiro forte está por todo lado. É cheiro de sangue, cheiro de caos. Talvez o cheiro da guerra. Continuo andando e não demoro a sentir o líquido subir até meus tornozelos. Instintivamente, me abaixo, procurando por algo ao tatear o chão. Meus dedos enroscam em uma corrente e eu a puxo.

Não, não é instintivamente. Eu já estive aqui antes. Em muitos outros sonhos.

O sangue começa a descer e, de repente, eu também estou sendo sugada. Caio em algo duro e áspero. A claridade me cega por um instante, mas em seguida sou capaz de ver minhas mãos ensanguentadas, assim como meus pés e tornozelos. A barra do meu vestido preto está molhada. Olho ao redor e vejo pilastras enormes com desenhos estranhos. O céu azul no fundo não possui uma nuvem sequer.

Levanto-me e caminho no estreito corredor entre as colunas. Meus pés deixam pegadas vermelhas e o calor começa a me incomodar — agora sei que estou no deserto. Já estive aqui antes, também, em tantos outros pesadelos, em tantas outras situações.

Passo por uma porta e entro numa espécie de câmara. Quanto mais ando, mais baixo o teto fica. Sou obrigada a me curvar cada vez mais, segurando-me às paredes. Ao finalmente sair do corredor, vejo uma sala enorme com um trono de pedra. Fico parada ao encontrar dois leões ao redor dele, mas eles não parecem perceber minha existência. Na verdade, sequer se mexem. Sou impelida, por algo dentro de mim, a caminhar até o trono. Meus pés sujos param à frente dele e o observo. Há duas gravura em seus tijolos enormes: um olho e algo esquisito que parecem ondas ou raios saindo de um retângulo.

Estico minha mão para tocá-los, mas me assusto: o sangue em minhas mãos está preto. E tal como rachaduras, pequenas fissuras começam a subir pela minha pele. Elas me queimam no trajeto. Caio para trás, sentindo-as atingirem meus olhos. Minha cabeça se curva para trás e, de repente, não posso respirar, pois fortes mãos seguram meu pescoço. Um rosto sorri para mim e sussurra:

— Tem sorte de eu depender de você, senão, já teria te matado. Você devia tentar ser mais um pouco parecida comigo, não acha?

Estranhamente, não sinto medo. É como se eu mesma estivesse tentando me machucar, então, incontrolavelmente, sorrio. Ergo minhas mãos e seguro seu pulso.

É quando seu rosto se desconfigura, dando lugar a um homem completamente diferente. Posso dizê-lo porque suas mãos realmente me machucam, agora. Seus olhos lampejam ao mesmo tempo em que uma insaciável vontade de destruição me toma. “Mate ele”, algo me sussurra. “Mate ele antes que ele te mate!”

E eu teria obedecido…

Se não tivesse aberto meus olhos e acordado.

Não reconheço o quarto onde estou. Não estou assustada, nem com o pesadelo, nem com o quarto desconhecido, mas há algo estranho em meu peito que me assusta. Aquela sensação… de que eu seria capaz de matar alguém.

Ela me invade vez ou outra e preciso me lembrar de quem eu sou. Nicha. Meu nome é Nicha e eu não sou uma pessoa inteiramente ruim, não sou louca a ponto de matar alguém. Tenho que repetir até a sensação passar.

Às vezes acho que quando estou drogada demais, coisas estranhas me tomam a mente. Algum interesse bizarro pelo Egito Antigo toma minhas alucinações e um desejo irreal corre pelas minhas veias, me dizendo coisas completamente erradas.

Completamente insanas e monstruosas.

Levanto-me, buscando minhas roupas pelo chão e visto-me rapidamente. Saio antes que o cara na cama acorde.

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