Tumgik
bloodmocn · 4 years
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izerokiryuu‌:
Ele teve um segundo de satisfação ao observar a reação da menor enquanto recebia a arma de volta. Nunca foi irreconhecível para ele o quanto aquele objeto parecia ser importante para Kyou. Mas aquele contato e o sentimento através do olhar que trocaram passou rápido demais, embora ele tivesse deixado escapar um baixo suspiro quando a fitou de volta. Podia jurar que havia sentido o peito aquecer e a ponta dos dedos formigar, como a muito não sentia, trazendo uma sensação quase nostálgica. Havia sentido tanto a falta dela. 
Após se afastar, Zero desviou o olhar para qualquer lugar do espaço, fechando os olhos por um momento para recobrar o foco. Não podia perder o controle. A mão apertou o braço esquerdo, um pouco acima do pulso, onde sentiu uma pressão e algo se remexer abaixo da pele de repente. Sabia que o sangue estava se agitando em suas veias e Zero engoliu em seco. Pela reação da ruiva ao se afastar, imaginou se ela havia sentido algo em si, algo que denunciasse tudo o que havia feito. 
No entanto, a resposta de Kyou havia pegado o vampiro desprevenido. O grisalho a olhou novamente, as sobrancelhas frisando e o rosto assumindo uma expressão quase confusa. ❝ —– Acha que… eu não confio em você?❞ Uma sombra de dor tomou a face de Zero e ele soltou o ar pelo nariz com força, mas deixando que ela continuasse. Ouvi-la dizer algo como aquilo fazia parecer que eram completamente estranhos um para o outro. ❝ —– Como… caçador?❞  Repetiu. Àquele ponto, sentiu a necessidade de dar alguns passos, apenas para ter o que fazer com o próprio corpo e dissipar a sensação em suas veias. Zero se esforçou para convencer a si mesmo que Kyou não queria dizer aquilo de verdade, mas que, por algum motivo, havia dito. ❝ —– Não fale como se eu realmente fosse te tratar apenas como uma arma que ameaça ao Conselho e a Associação.❞ O tom não escondia que estava ofendido, mas ao mesmo tempo era um pedido. Kyou não podia pedir algo como aquilo dele. ❝ —– Fui contra as regras da Associação em diversos pontos para conseguir qualquer mínima informação sobre onde você poderia estar. Fiz-❞ Ele se interrompeu quando percebeu onde aquilo poderia acabar. Não era o momento. Não era.
No fundo, Zero sabia que aquele era um posicionamento muito profissional da parte da ruiva, e que legalmente seria o mais óbvio a se fazer. Mas não precisavam falar um com o outro daquela forma especialmente se estivessem apenas os dois no ambiente. Ele também sabia que havia sido o primeiro a dar aquele passo de distância no reencontro, mas não queria que realmente se tornasse um abismo entre eles. 
Zero havia dedicado grande parte de sua força de vontade e comprometimento a odiar vampiros e caçá-los. Se dedicou fortemente a isso em detrimento de tantas outras coisas. Sabia que, naquele momento, ele mesmo estava em uma situação em que, politicamente, deveria se colocar em alguma posição. E que era esperado que essa posição fosse a favor dos seus: a ordem dos caçadores. Por outro lado, jamais poderia se colocar de tal maneira se isso significasse estar de um lado que não era o dela. Já havia assumido isso e aceitado fazia algum tempo. Mas cada passo tinha de ser cauteloso e precisava que ela entendesse isso sem que a machucasse. 
Realmente queria poder dizer que o problema não era falta de confiança e que cogitar isso era absurdo. Para sua vergonha, o maior de seus problemas era não saber se teria sanidade o suficiente para resistir ao sangue da ruiva, não depois de tanto tempo. Não depois de desejá-la tanto, e dos pesadelos e das vezes que havia suado frio enquanto lutava contra a sede. E a saudade. Que o problema era estar ali e não confiar em si mesmo nem para tocar a pele alva, de modo a destruir todo o autocontrole que precariamente estava mantendo.
Mas ao invés de dizer tudo isso, ele apenas respirou fundo, balançando a cabeça para seguir com o outro assunto. E ouvir Kyou falando brevemente sobre o tempo com os Kurans, de algum modo não o surpreendia. Momo já havia falado certa vez para ele que os puro sangues as via daquela forma e que sempre haviam tentado manter o controle principalmente sobre Kyou. Aquilo apenas o irritava ainda mais. 
Quando Thanatos reagiu a ela, Zero deu um passo de aproximação. ❝ —– Kyou…❞ Mas parou com o pedido dela. Ele já havia passado por uma situação complicada com Blood Rose assim que Kyou havia partido. Lembrava que haviam passado alguns dias até tentar usá-la novamente e era como se tivesse redescoberto a arma, que havia ficado confusa devido a Kaname. Não era fácil, uma vez que cada caçador possuía uma conexão com sua respectiva arma. Ele concordou com um aceno e abaixou para pegar Thanatos novamente, colocando-a no bolso cuidadosamente. Entregaria de volta quando ambas estivessem preparadas.
Zero olhou de relance para a menor à frente. Duvidava que, nesse momento, Yagari fosse tentar algo contra aquela aliança, mesmo que ele não fosse a favor, sabia que a Associação não estava exatamente numa posição de vantagem. Não quando Kaname havia declarado sutilmente poder de decisão sobre a ruiva. Mas, de fato, estavam todos relutantes.
Quando Kyou parou subitamente e pareceu se esforçar para conter alguma coisa, ele se aproximou novamente ❝ —– O que…❞ Mas ao ouvir sobre a caçadora, Zero congelou e xingou baixo. Ele deu alguns passos na direção da porta por onde haviam entrado e espiou do lado de fora, onde tudo parecia tranquilamente normal. O corpo e a atenção se voltaram para Kyou novamente quando ela lhe fez a pergunta. Nem todos os caçadores estavam ali pois, claramente, precisavam de uma certa quantidade cuidando das alocações da Associação e outro grupo estava em missão naquele exato momento. Havia, então, cerca de 17 dos melhores caçadores naquela ocasião. 
Um segundo foi o suficiente, enquanto a fitava, para entender a seriedade da situação. Desde o momento que a vira entrando na sala onde ocorreu a reunião, ele sentiu que algo não estava certo. Ele acenou com a cabeça, concordando com o pedido subentendido. 
Por conhecer exatamente cada rosto dos caçadores que estavam ali, precisava de uma visualização melhor do salão para tentar identificar quem não estava na formação que haviam planejado. Exceto que, pelo que a ruiva havia acabado de compartilhar, sequer tinham tempo hábil. Precisavam agir rápido. Uma calma fria tomou conta de si quando respirou fundo e se apressou pelo corredor. ❝ —– Vamos.❞ Uma máscara de pedra cobriu seu rosto e os sentidos já trabalharam avidamente para localizar Kaname, Yuuki e a puro sangue que haviam encontrado anteriormente. Era suspeita demais para que a deixasse de lado. 
Zero sabia, desde o início, que tudo aquilo era como um teto de vidro. Jamais conseguiriam viver em harmonia, ambas as espécies. Os caçadores existiam para controlar aquilo, e os vampiros não conseguiam conceber a ideia de serem controlados, mesmo que minimamente. Como um vampiro ele mesmo, Zero sabia o que os instintos predadores e de poder podiam fazer com a mente, como podiam lhe arrancar a humanidade sutil e rapidamente. E se imaginasse isso na mente de um puro sangue, ou dos ancestrais… Mesmo com os passos apressados, não deixou de observar o tempo todo ao lado, onde Kyou o acompanhava com a mesma quietude. Todo aquele tempo tempo não havia tirado sua capacidade de reconhecer o franzir da sobrancelha quando estava extremamente concentrada e preocupada. E algo mais, algo que Kyou tentava esconder sob seu comportamento. Mais do que apenas observar, podia quase sentir as emoções percorrendo o corpo da menor, assim como os pequenos gestos e até o suar. Kyou estava com medo e aquilo o corroía por dentro. 
Eles haviam subido as escadas no fim do corredor rapidamente e, quando chegaram ao andar superior, Zero pegou uma das saídas para a sacada que ligava à visão de todo o salão abaixo. Antes que pudesse alcançar onde sabia que seriam vistos, Zero segurou firme uma das mãos da ruiva, parando ambos no que restava das sombras. ❝ —– Me dê um segundo. É melhor que não sejamos vistos juntos… por enquanto.❞ Falou baixo logo a soltando e dando alguns passos casuais adiante. Muito provavelmente saberiam que estavam na companhia um do outro, mas não queria levantar suspeita sobre a situação. Zero não percorreu o olhar nas pessoas abaixo, não inicialmente. Precisava parecer que estava apenas dando uma volta, e não procurando uma caçadora descontrolada. Alguns passos até o outro lado logo o ajudou a visualizar todos a postos, exceto uma pessoa. Ele suspirou e entrou no corredor novamente, fazendo todo o caminho de volta até Kyou. ❝ —– Parte norte e leste parece estar coberta ainda. Sul ficou sob a responsabilidade de Kaito, que deve estar com Wakaba agora… ❞ Ele a olhou sugestivamente, esperando que a menor entendesse. Poderia não ser a melhor informação no momento, mas era a única que tinham, dado que ainda não conseguia sentir. 
Zero voltou a caminhar para direção oeste, entrando pelos infinitos corredores iluminados apenas pela luz da lua que entrava através das grandes janelas laterais da construção de pedra. ❝ —– Onde estão Ichiru e Momo?❞ Zero pigarreou. Mais do que a resposta, precisava mesmo colocar alguns pensamentos na mente. Cada passo que dava em direção a um quarto, sala ou escada, cada porta que checavam, cada dedo que pressionava no cabo de Blood Rose fazia as íris brilharem e um deleite terrível lhe correr pela espinha apenas com a possibilidade daquela caçada. Zero gostava de caçar. E estava esperando por aquele momento a tanto tempo… caçar um puro sangue. Kaito havia o provocado especificamente sobre aquilo também, momentos antes, não sabendo o que aquilo podia fazer com seu interior.  
Por esse motivo, mesmo que precisasse se concentrar em ouvir e sentir cada presença, precisava falar, pois no silêncio era muito fácil imergir naquele modo aterrorizante que havia explorado tantas vezes antes. O cheiro de Kyou tão próxima também funcionava como um estimulante, mas precisava focar adiante. Precisava protege-la. 
Ele parou subitamente, imaginava que estivessem próximos à extremidade oposta do enorme prédio. Zero sentiu, ainda que estivessem distantes. Ele também sentia claramente o cheiro da caçadora, sentia o cheiro de sangue recém derramado. Os olhos escarlates cintilaram quando murmurou para Kyou ao seu lado, enquanto se preparava para correr: ❝ —– Kyou… essa presença…❞ Os batimentos aceleraram e o caçador sequer conseguiu terminar o raciocínio antes de usar toda a força e as habilidades para impulsionar o próprio corpo na maior velocidade que conseguia. Zero não conseguia acreditar no que sentia, ainda que confuso, e ainda assim, o sangue parecia ferver nas veias. Tudo parecia pintado em escarlate em sua visão quando arrombou a porta da sala. 
   Quando os olhos escarlates encontraram os lavanda de Zero, o quarto escureceu e um sorriso satisfeito se moldou nos lábios róseos de Ophelia. A Nobre estava próxima a janela do quarto, o corpo oculto no canto da sala, enquanto no centro uma caçadora e um Purosangue conduziam uma dança sangrenta, que fora interrompida por muito pouco graças ao tilintar de correntes. Não era possível ver por de onde estas tinham início, mas era fato que se originaram na penumbra mais obscura do recinto, se envolvendo na cintura tanto da caçadora, quanto do Purosangue. De forma brusca, ambos os corpos ensanguentados fora, separado, entretanto, a atitude que se sucedeu de ambos era muito peculiar. Enquanto o vampiro se encontrava consciente e sereno, como se tivesse aceitado qualquer que fosse sua sentença, a caçadora grunhia como um animal faminto, a arma anti-vampiros que empunhava era movimentada de forma violenta; disposta a se livrar das correntes a todo custo e finalizar seu trabalho. Todo sangue derramado vinha somente do Purosangue, que mesmo sustentado pelas correntes, acabou por cair de joelhos no chão, em silêncio.
   O salto batia contra o piso frio lentamente, como um prelúdio impaciente, ainda que tivesse demorado um pouco mais do que o Caçador, Kyou adentrou no local, seu corpo se colocando defronte ao de Zero imediatamente. Erguendo o braço direito, os olhos escarlates reluziram e quando a ponta dos dedos se moveram, as correntes responderam a movimentação, salientando a quem elas pertenciam. ❛ Não se mova… Se for até lá agora, vai estar fazendo exatamente o que ela quer… Por favor, Zero... ❜ A menor mantinha a cabeça baixa, o rosto omitido pelas madeixas e ainda que a pouca iluminação colaborassem consigo, nada pode esconder as lágrimas que escorreram pelas bochechas em abundância, entretanto ela não soluçou, um olhar afiado foi sua resposta a Ophelia. No instante em que Zero se pronunciou, o corpo reconheceu aquela presença como muito impacto, entretanto algo dentro de si negava aquela situação tão avidamente que mal teve tempo de conter suas emoções. Era injusto pensar que nada mais poderia dar errado aquela noite.
   Depois de alcançar a coragem necessária, os orbes tremularam no instante em que repousaram sobre a outra, que ainda se encontrava imóvel no mesmo lugar, mesmo depois da chegada de ambos. Os cabelos de Ophelia se encontravam tão longos quanto os de Kyou, tão vermelhos e vividos quanto os dela… Seus olhos igualmente carmesins; era como olhar o próprio reflexo no espelho. Além da essência, algumas características ainda se diferenciavam, como a altura, linhas de expressões,  como se a mais velha tivesse se caracterizado para aquele momento e ainda assim… Nada em si era falso, talvez ela  tivesse ocultado aquela aparência por todo aquele tempo. A sensação que percorreu o corpo de Kyou, a fazendo estremecer, era a de que de fato… Opheia sequer parecia sua irmã gêmea, como Momo era especificamente uma parte de si que a havia abandonado.
      ❛ O que significa tudo isso? ❜ A voz vinha carregada de tantos sentimentos, muito deles conflitantes, como amor, ódio, saudade e arrependimento… Não se lembrava da última vez que havia visto Ophelia tão de perto, mas sentia falta de seus cabelos negros e olhos azuis… O que estava diante de si sequer dispunha de qualquer sentido, como algum tipo de brincadeira estúpida que não estava disposta a colaborar com.
      ❛ Esta se referindo a minha aparência ou as minhas marionetes? ❜ Questionou, piscando rapidamente, enquanto o olhar repousava sobre os Caçadores e suas presas que tiveram sua batalha particular interrompida por Zero e Kyou. ❛ Ah… Zero não teve tempo de dizer a você, não é mesmo? Já que bem, Kaname lhe adotou como o novo bichinho de estimação por tanto tempo, não é mesmo? Você virou a favorita? Nosso querido Kuran-sama não estava nenhum pouco disposto a deixá-la ir de forma alguma. ❜ A destra repousou sobre os lábios e a mais velha se colocou a gargalhar alto.. Sua voz também ecoava como sempre, revelando cada vez mais que era ela mesma e ninguém mais assumindo sua identidade ou qualquer coisa neste sentido. ❛ Eu disse que cansei de você, da sua maldita família, dessa responsabilidade sem sentido que eu nunca pedi...❜
   Os orbes escarlates de Kyou e Ophelia cintilaram em sincronia e no silêncio que se sucedeu, foi como se ambas tivessem trocado ainda mais palavras do que as que foram realmente ditas. A Nobre ocultava algo no fundo de seu coração e Kyou já havia percebido que algo estava errado… Pois durante todo aquele tempo, o único ser capaz de livrá-la das correntes que lhe foram impostas a si era Ophelia… E a ausência da outra significava o pior… Que não estava mais consigo. Lentamente, a penumbra da sala tornou-se ainda mais densa e as correntes de Kyou se firmaram na Caçadora e no Purosangue com força. Mesmo que desejasse a verdade, não havia tempo cabível e pela forma como Ophelia estava se comportando, nada poderia ser feito. Observando a Caçadora com o canto dos olhos, a Purosangue pressionou os lábios, tendo um claro impulso de se movimentar, mas uma vez mais as palavras de Ophelia inundaram a sala.
    ❛ Não existe uma forma de parar isso… Você sabe que a única opção dessa Caçadora agora é morrer ou obedecer às minhas ordens... ❜ Um grito ecoou posteriormente as palavras da Nobre, alto o suficiente para fazer tanto os olhos de Kyou quanto os de Ophelia se arregalaram em surpresa. As correntes uma vez mais sacudiram, o som do atrito entre elas e o mármore do chão se misturavam a voz da Caçadora… Tamanha fora a dor expressa em seu tom de voz, que Kyou não esperou a própria visão se adaptar a escuridão, simplesmente lançando-se do lugar onde estava contra ela, enquanto Ophelia, também se esvaiu da visão de ambos. A porta do recinto se abriu em um baque, a silhueta de Kaien se formando junto a de Ichiru e Momo que o acompanhavam; quando as luzes se acenderam, o corpo de Kyou se encontrava unido ao da Caçadora no chão, enquanto a destra de Ophelia atravessava o peito do Purosangue em resposta. 
       ❛ ONEE-SAMA! ❜ E ainda que Momo tenha sido a primeira a adentrar no quarto, o som do disparo de uma arma a fez congelar junto a Ichiru que se posicionou atrás da ruiva, os braços envolvendo o corpo da irmã mais nova, a puxando para si. Em meio ao silêncio que se sucedeu, enquanto o corpo do Purosangue se desfazia em cinzas, sangue se espalhava pelo chão. Kyou estava de joelhos, o corpo da Caçadora, cujo nome não era capaz de se lembrar, repousava em seus braços; sua arma anti-vampiros, ironicamente cravada em seu peito, acabando com a maldição imposta por Ophelia… E com sua vida também. Por outro lado, a arma em questão se tratava de uma adaga… E o barulho anterior não tinha sido produzido por esta. 
   Lágrimas surgiram nos olhos escuros da ruiva, sangue fluindo de seus lábios, deslizando pela pele em abundância até recair no próprio vestido, já completamente manchado de sangue. Enquanto sentia o braço esquerdo perdendo movimento, o direito reunia suas últimas forças para repousar o corpo da Caçadora com o mínimo de dignidade no chão. A dor em seu braço atingido  era excruciante, ainda que não tivesse gritado, ruídos de dor lhe arranhavam a garganta, enquanto ela se sentava no chão, em pedaços. Por instinto, o rosto se ergueu e ela observou atentamente todos aqueles que haviam chegado… Até se dar conta do cano ainda quente da arma de Yagari… No fundo do corredor… Então havia sido ele… E pensar que era a primeira vez que experimentava a dor de ser atingida por uma arma anti-vampiros em seu estado atual.  A destra repousou sobre o ombro ferido, pressionando-o na tentativa de estancar a ferida. Momo não se importou com o sangue e nem sequer se permitiu continuar envolvida pelos braços do Kiryuu mais novo, livrando-se deles cuidadosamente, enquanto corria na direção de sua irmã mais velha, em prantos. 
      ❛ P-Por que?... POR QUE? ❜ Momo puxou Kyou para si, forçando-a a jogar o peso de seu corpo contra si, repousando uma das mãos sobre a dela, tentando ajudar o sangue a parar de fluir. Sabendo que precisava mantê-la acordada, a mão livre a obrigou a manter o rosto erguido. Diante do cenário que havia se formado, Kaien acabou se precipitando em direcionar os próprios passos na direção das irmãs. desde que o barulho de vidro se estilhaçando pelo chão ecoou… E logo Ophelia não estava mais ali. O Caçador notou a estaca cravada no peito da Caçadora, sua mão envolta na arma e isso o fez ajoelhar imediatamente, suspirando enquanto se ajoelhava ao lado dela, tendo aos poucos todo entendimento do que tinha acontecido.
       ❛ Uma ocorrência realmente lamentável... Aparentemente um de nosso Caçadores... Ficou em uma situação onde a única escolha que lhe restava era tirar a própria vida com sua arma... Ela está lentamente virando cinzas... Começando pela pontas dos dedos... E também... Há marcas em seu pescoço… ❜ As pontas dos dedos de Kaien deslizaram pela ferida, enquanto seu olhar se direcionava a Yagari. ❛ Pelo modo como a outra Nobre saiu e pela forma como ela está segurado firme sua arma... Não há espaço cabível em recair a culpa em Kyou, Yagari-san. ❜ E ainda que as afirmações do Diretor estivessesm certas… Já era tarde demais.
⤹ ✿ . ⃗. .  alone at night .
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bloodmocn · 4 years
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izerokiryuu‌:
Mesmo após uma volta quase completa no salão, Zero não havia encontrado rastros de Kyou. Na verdade, por algum momento, sequer pode sentir a presença dela próximo. Quase como se a ruiva tivesse deixado o local completamente e aquela percepção o fez voltar rapidamente para seu posto inicial, próximo de onde havia deixado Kaito. Os olhos ainda percorriam o salão de forma casual, buscando não atrair qualquer atenção por movimentos exagerados, mas parou quando viu o caçador sutilmente abrir uma bagagem onde Wakaba estava escondida. Rapidamente cessou a distância entre eles, para segurar o mais velho pelo colarinho da veste. ❝ —– Kaito, você perdeu a noção?❞ Falou entredentes. Facilitar a entrada de uma humana num ambiente como aquele, repleto de vampiros. Zero olhou para a garota que uniu as mãos em frente ao vestido de baile, desacreditado de que haviam planejado aquilo às cegas. ❝ —– Relaxa, Zero. Ela é apenas uma humana, podemos protegê-la sem problemas, certo?❞ Kaito deu um passo mais próximo de si, de modo a chamar sua atenção e quando Zero retribuiu, ele direcionou a fala para Sayori. ❝ —– Vá em frente, busque sua amiga. Mas, a única condição é que fique onde eu possa te ver.❞ Ela rapidamente acenou e se afastou de ambos. 
O caçador suspirou, por fim, soltando o outro e se afastando o suficiente para parar ao lado. ❝ —– Bem, agora temos uma pequena cordeirinha…❞ Kaito continuou baixo, quando se virou para a direção onde a garota tinha seguido. Com aquela frase, Zero havia entendido perfeitamente suas intenções. ❝ —– Está vendo? Os olhos dos sanguessugas mudando de cor enquanto ela passa…❞ Ele direcionou um olhar para si, como se provocasse uma resposta do grisalho.
Zero fixou o olhar exatamente para encontrar as reações que Kaito acusava. O que poderia dizer naquela ocasião? Ele mesmo não conseguia evitar as próprias reações impostas pelos sentidos. A prova disso foi ter reagido à Kyou momentos antes e algo em si o dizia que Kaito percebia o que ele estava tentando esconder. ❝ —– E se em algum momento um daqueles vampiros se mover para ferir Wakaba… você teria a perfeita razão para atacar.❞ Completou pelo outro. De alguma forma, o olhar encontrou as figuras de Yuuki e Kaname, não demorando para que a princesa correspondesse e sustentasse a atenção por alguns segundos.  
Yuuki foi a primeira a se mover, saindo do seu campo de visão por um momento. Ao seu lado, percebeu que Kaito também havia se movido dentre a multidão, mas Zero o ignorou e apenas virou o suficiente para encontrar os Kurans, no intuito de não perdê-los de vista. Quando pareceu que havia avaliado todo o salão, de onde estava, finalmente se deu conta da ausência de Momo e Ichiru. Se estavam ali durante a reunião, onde poderiam ter ido? 
Com um suspiro, Zero voltou a caminhar. Pretendia alcançar Yagari, o qual havia acabado de retornar para dentro do espaço, mas não completou o destino pois uma pequena comoção o fez ir em direção onde avistou Kaito. Ele e a pequena que reconheceu como Sayori estavam na companhia de uma certa quantidade de cabelos loiros sob uma presença que sabia pertencer a linhagem de um purossangue. Não era preciso muito para perceber a malícia na aproximação da mulher, por isso, Zero rapidamente se direcionou até os três e antes que ela pudesse tocar em Sayori, surpreendeu a loira segurando firmemente em seu pulso. O olhar que direcionou para a outra deixava claro que não pouparia esforços, mesmo estando no ambiente em que estavam. Aquela mulher não tocaria na estudante enquanto ele estivesse ali.
O dedos se apertaram em torno da epiderme fria, mas, segundos depois Zero pode sentir um toque contido em seu próprio braço, identificando a responsável. Não era exatamente a pessoa que ele gostaria de ter que lidar no momento. ❝ —– O que está fazendo?❞ A voz seca foi direcionada a morena, mesmo que os olhos tivessem permanecido na purosangue a sua frente, que parecia divertir-se com tudo aquilo. O silêncio se estabeleceu, pois ele mesmo não se incomodou em responder. Convidada ou não, Zero estava ali sob um propósito e considerando que havia uma humana em meio aqueles vampiros, sua responsabilidade reforçava sua atenção. Por fim, Zero direcionou o olhar para Yuuki devagar, fitando-a pelo que pareceram minutos, mesmo que houvesse, na verdade, sido apenas longos segundos. 
Até que foram surpreendidos por Kyou. Zero apenas foi capaz de observar o que se seguiu, mesmo que por nenhum momento tenha soltado a mão da puro sangue. Ao toque de Kyou, a própria feição irritada foi substituída por uma expressão leve de surpresa. O que era aquela reação consigo? Zero abriu os lábios para responder, pronto para deixar claro que não se importava de quem se tratava. Se aquela mulher vampira tinha intenções com a garota humana, ele iria interferir. No entanto, os murmúrios que se seguiram em volta deles o impediu, um em particular fazendo o caçador direcionar o olhar cortante na direção do responsável e, em seguida, apertar o maxilar numa tentativa contida. Ele desviou a atenção para a mão da ruiva sobre a sua por um momento mas, por fim, suspirou, voltando o olhar para Sayori. Até ouvir a voz da menor direcionada a si com tanta formalidade, quando a fitou erguendo uma sobrancelha. 
Zero alternou a atenção entre a ruiva e a puro sangue à frente, sentindo o encontro com o corpo da menor quando ele mesmo havia, minimamente, dado um passo à frente, respondendo aos instintos ameaçadores da outra. Mesmo enquanto apenas observava a reação de Kyou, o caçador levou a mão livre a lhe tocar o braço, os olhos estreitando em direção a outra. Antes que Kaito pudesse sair com Sayori e Yuuki, ambos ainda trocaram olhares de forma rápida, pois Zero não deixaria passar o fato dele estar envolvido em toda aquela situação. No fim, sabia que aquela ideia não daria certo.
Quando Kyou se virou para falar consigo, o olhar seguiu de soslaio para as pessoas em volta, se certificando de que não estavam chamando atenção demais. A mão também deslizou sobre o braço dela conforme pendia o rosto de modo a facilitar a comunicação quando ele concordou. Calmamente, Zero afastou um passo e encostou a destra na altura das costas da ruiva, fazendo menção de acompanhá-la de modo casual. Eles caminharam até os cantos do salão e continuaram caminhando até que estivessem próximos das sombras e a uma das portas laterais novamente, aproveitando a primeira oportunidade para entrar. Como esperado, os corredores estavam vazios, mas, ainda assim, quando Zero recolheu a mão e deu alguns passos a fim de se certificar. Por fim, suspirou pesadamente e se virou para Kyou, se aproximando até que conseguisse sentir a respiração alheia. Embora tivesse hesitado a princípio, a destra foi até a mão da menor, dessa vez levantando até que ambos pudessem ver ele transmitindo Thanatos para ela sem problemas. Sempre carregava a arma consigo, até mesmo em suas missões. Não sabia ao certo o motivo, mas imaginava que tinha algo a ver com lembrá-lo constantemente de sua busca. 
A observando novamente, seu primeiro pensamento foi imaginar que não colocaria a ruiva sozinha consigo naquele momento. Quando estavam no salão, não era tão difícil não focar em sua presença e essência, mesmo que se destacasse dentre tantos outros vampiros. Mas sabia que, pela ocasião e pelos acontecimentos anteriores, deveria ser algo sério. O caçador segurou a mão de Kyou por um momento, sentindo aquela tão conhecida energia que compartilhavam ao toque. Tanto tempo que havia esperado sentir aquele toque… Por esse mesmo motivo, a soltou, retomando o passo de distância. 
Mas quando fez menção de desviar o olhar, Zero sentiu que além disso, havia algo mais. Mesmo sem uma iluminação adequada, notou a diferença em sua postura e em seu cheiro, fazendo-o franzir a testa. Algo dentro de si se revirou profundamente, mas o caçador apenas lembrou a si mesmo para focar no motivo de estarem ali. No fundo, estava apenas aliviado de que ela estivesse bem. ❝ —– O que aconteceu?❞
   Kyou prendeu a respiração, unindo ambas as mãos defronte ao corpo, abaixando minimamente a cabeça e a sensação dele tocando suas costas foram o suficiente para criar um rubor sutil em seu rosto. Não perdeu a compostura de forma notável, mas a mente se desfocou um pouco durante o percurso que trilharam de forma tão natural. Era quase como voltar no tempo… Quando havia despertado e retomando os treinos como Caçadora, mesmo durante o período em que não eram capazes de trocar mais do que três palavras um com o outro, ainda assim… Havia quase que uma força sobrenatural que os guiavam para ficarem sozinhos. Tocar um no outro…Trocar olhares, qualquer que fosse o contato era o suficiente para suprir algo mais interno, mesmo que nunca revelassem nada. O silêncio sempre esteve presente, mas nunca os aprisionou, talvez tivesse aprendido tantas outras formas de se comunicar graças a ele.
   A penumbra que se refletiu no ambiente a deixou atenta novamente, quase como um lapso que a fez voltar para a realidade. Estava ali com um único objetivo, desde que problemas surgiram desde que se separou dos gêmeos mais novos. Aki havia dito para Kyou prestar atenção devido a uma atmosfera diferente no baile, e que aparentemente só ela seria capaz de perceber, e com isso, tinha se colocado a vagar pela Mansão o mais rápido que conseguirá... Mas agora precisava de ajuda. Os grandes orbes vermelhos procuraram Zero e quando se deu conta a mão dele estava sobre a própria, reconhecendo Thanatos de imediato ao desviar o olhar para sua palma. Kyou se perdeu de novo na pequena joia que a tanto tempo não adornava uma de suas mãos e um sorriso de canto surgiu; ele teria carregado ela o tempo todo? ❛ Obrigada... ❜ O rosto se ergueu para encontrar o dele de novo, havia poupado palavras, mas o que guardou dentro de si refletiu cuidadosamente em seus olhos, que cintilavam como a muito tempo não faziam. 
   Diante da aproximação dele, Kyou congelou, os olhos se arregalando em surpresa, enquanto alguns passos eram dados para trás… Uma reação extrema quando tudo o que o outro havia feito era segurar uma de suas mãos, mas não conseguiu se conter… Talvez não estivesse esperando por aquilo, não tão cedo e por isso o rosto enrubesceu de uma forma muito mais intensa que antes. Ela pigarreou, cobrindo os lábios com a mão livre e quando o toque se desfez, o olhar também se desviou dos olhos dele. Não tinha intenção nenhuma em esconder aquele tipo de reação ou até mesmo se conter… Passará muito tempo aprisionada para se preocupar com coisas tão pequenas como aquela… Não era segredo, o que sentia não era mais algo a se dissimular.
      ❛ Sabe… Você não precisa relutar tanto assim... ❜ As pontas dos próprios dedos roçaram, sentindo falta da sensação anterior. ❛ Eu não espero uma confiança mútua… ❜ Ela riu baixinho, de uma forma um pouco diferente de como costumava fazer, externando algo doloroso. ❛ Quero dizer, você consegue sentir tudo em relação a mim, e como Caçador, isso deve ser usado para me conter caso necessário… Eu posso mentir para qualquer um, mas pra você não. ❜ Se havia alguém que não conseguiria esconder nada, esse alguém era ele e não se permitiria morrer nas mãos de outra pessoa se não as dele. ❛ Eu vou permanecer, Zero. ❜ Kyou se virou de costas para ele, repousando o indicador sobre Thanatos, circundando-a cuidadosamente. ❛ Eu não tinha qualquer intenção de ir embora… Eu só confiei em Kaname e Yuuki porque o meu sangue despertou e por muito tempo os Kurans foram a minha única família no passado… Mas, eu me enganei e eles chegaram a conclusão de que o exílio era a melhor forma de me manter sobre controle. Porque aparentemente eu preciso se controlada. ❜
   Cuidadosa, ela colocou o anel no anelar direito, mas assim que a joia se encaixou ao redor deste, uma eletricidade impiedosa percorreu seu corpo de uma única vez. Os joelhos encontraram o chão e com um gemido contido de dor ela retirou Thanatos de perto de si, sendo forçada a arremessá-la no chão. A mão esquerda pressionou o chão gélido abaixo de si em busca de apoio, enquanto a destra apertava pressionava o peito, tossindo algumas vezes antes de restabelecer o controle da própria respiração. Os olhos lacrimejaram minimamente, enquanto ela fixava o olhar na arma anti-vampiros para não perdê-la de vista. ❛ Você não vai fazer isso comigo... ❜ Sussurrou, desviando o olhar para baixo, enquanto se sentava desajeitada no chão. Não estava sendo rejeitada, se este fosse o caso, nem sequer teria sido capaz de tocá-la… Estava sendo impedida de usá-la porque o próprio sangue almejava que fizesse uso do poder que carregava… Como uma Purosangue, aquilo que mais temia não ser capaz de controlar o suficiente. Os dentes trincaram e ela permaneceu onde estava.. Apontando para o anel caido no chão. ❛ Por favor.... Continue com ela... ❜ Precisou tomar o próprio tempo para retomar os próprios pensamentos em meio a tanta confusão… E ainda que pudesse acrescentar coisas que pudessem parecer desnecessárias num primeiro momento… Precisava deixá-lo ciente… Precisava se colocar de lado novamente.
     ❛ Todos estão relutantes com essa aliança… E eu sei que ambos os lados vão buscar brechas para quebrar o acordo que foi feito hoje a noite.... Mas...  Vocês não são os únicos...❜ Kyou fechou os olhos, respirando profundamente, os lábios tremulando, quase como se tivesse sentido o gosto de algo e a língua estalou no céu da boca,  fazendo os olhos reluzirem de forma intensa. O corpo estremeceu, a cabeça balançando negativamente. A mente latejava e foi necessário um esforço enorme para não expelir sangue, não quando estava tão concentrada. ❛ Uma… Uma… Caçadora foi… Mordida… E agora ela está agindo de acordo com o comando de quem a transformou. Eu sei disso porque… A ordem que ela recebeu é incomum até mesmo entre Purosangues… Minha mãe é a única que eu conheci capaz de fazer  isso…Eu consigo sentir a agitação no sangue dessa Caçadora, mas embora eu tenha tentado, não consigo encontrá-la. Não sei qual o propósito disso, mas a única forma de quebrar a ordem é matando a Caçadora ou a Purosangue que a aprisionou... ❜ 
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   Julgando pelo tempo que havia se passado desde o início do baile, aquele não tinha como ser um plano impensado, desde que a ordem precisava de um momento específico para se concretizar. Adormecer por tanto tempo causou certa deficiência em certas habilidades que carregava e se continuasse insistindo em buscar pela Caçadora infectada da forma como estava fazendo, Kyou poderia acabar trazendo problemas para si. ❛ Quantos Caçadores vieram? Precisamos encontrá-la... E… Zero… ❜ Kyou suspirou, cobrindo o rosto com a mão direita. ❛ Kaname-sama também não é capaz de realizar esse tipo de ordem… Se pedirmos auxílio a Associação ou ao Conselho… Eu serei a principal suspeita para ambos… Se a ordem for concretizada… Isso se mantém… Kaname-sama é capaz de reconhecer essa habilidade se ela acontecer devido ao contato que tinha com a minha mãe...❜ E considerando o fato de que havia se alimentado a pouco tempo atrás… Mesmo se Momo e Ichiru viessem em sua defesa, dificilmente qualquer um acreditaria a palavra deles. Seja qual fosse a motivação por trás de tal ordem, era fato de que acabaria em problemas e, como se não fosse terrível o suficiente… Estaria nas mãos de Zero a forma como lidariam com tudo a partir de agora.
⤹ ✿ . ⃗. .  alone at night .
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bloodmocn · 4 years
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izerokiryuu‌:
Kaito havia provocado quando ainda estavam a caminho do lugar onde o encontro aconteceria. Mas, ao invés de reagir com seu habitual temperamento, Zero utilizou daquilo como um teste pra si mesmo, tendo em vista que precisaria de todo seu autocontrole exatamente para aquele momento.
No entanto, estava sendo mais difícil do que imaginava. Seus instintos entraram em alerta e os ombros se ergueram ainda mais, reajustando a postura assim que os viu irromper pela porta da sala. Não pode deixar de encarar profundamente do Líder Kuran, permitindo que a escuridão lhe abraçasse, convidada pelo ódio frio que tomou forma de escudo contra a presença ditadora do purossangue. Zero podia jurar que até o próprio sangue corria frio pelas veias. 
Apesar da sensação, manteve-se inexpressivo com a revelação de Seiren em seguida, já que não era exatamente uma surpresa e sustentou o olhar do presidente, sabendo que ele entenderia a afirmação. Não haviam conversado tanto a respeito no passado, mas Zero sentia certa resistência vinda do diretor quando, de alguma forma, o assunto era Kyou e os Kurans. No fim, ele entenderia por si só.
O mesmo não poderia dizer de Yagari, que claramente se remexeu desconfortável, direcionando um olhar cheio de reprovação para a vampira silenciosa. Também não deixou de notar o olhar de Kaname sobre si, embora de forma alguma caiu em sua breve provocação. Ele sabia que Kaname estava aproveitando os momentos de poder em estar ali, sem a presença de Kyou ou Yuuki, como se usasse disso para expor maneiras de manipulá-lo. Pois Kaname sabia que era exatamente nela que seus pensamentos se concentravam. Mas o caçador nem mesmo se permitiu apertar o olhar em ameaça para o outro, permanecendo exatamente com a postura que havia erguido. 
Era uma luta interna ter que permanecer imóvel para as provocações veladas do Kuran, afinal, a Ordem dos Caçadores só existia pela necessidade de exterminar os seres sobrenaturais que desequilibraram o rumo natural das coisas. E ainda que soubesse ser uma postura não muito adequada, ele se sentia contemplado pelo temperamento de Yagari ser resguardado por sua posição na hierarquia. Em alguns momentos, Yagari parecia ainda mais intolerante do que ele próprio, mas confiava o suficiente para saber que ele não soltaria nenhuma das informações relevantes que havia levantado nas últimas missões. Ainda não era o momento. 
Com isso, apenas escutou e absorveu todas as informações, ao tempo que observava o mínimo movimento de qualquer um no recinto. Até que Kaname se dirigisse diretamente a si. Ele sabia que aquelas palavras não eram um ato nobre e confirmou isso com a última sentença: passar um tempo. As mãos que estavam cruzadas atrás do corpo se apertaram em um punho, fitando o vampiro por alguns segundos antes que sua única reação fosse direcionar um olhar para Kaien quando o sentiu fazendo o mesmo. Ele sabia o que Kaien estava pedindo e o quanto aquilo significava, mas não poderia deixá-lo sem uma resposta. Zero não sabia como aquela noite iria terminar, mas certamente não seria da forma de o Kuran pudesse estar esperando. A cabeça pendeu quase imperceptivelmente, ao passo que o canto dos lábios se ergueu, exatamente como ele havia feito assim que pôs os olhos sobre si. Não era uma tentativa de esconder que estava afetado, mas sim uma promessa de violência para o vampiro caso ele resolvesse agir.
Naquele meio tempo, imaginou como poderia assumir tal posição de liderança dos caçadores em algum momento, uma vez que aquela conversa não parecia seguir um caminho para quem busca paz entre duas frentes. A paz não poderia ser sustentada em meio a uma guerra de poderes. De reais poderes, muito além do que a humanidade poderia controlar. Por isso, aquilo nunca acabaria, era apenas uma bolha que podia estourar a qualquer momento.  
Mas a feição se desfez assim que a sentiu. Zero se virou para a porta um segundo antes que essa abrisse, permitindo que uma voz alcançasse seus ouvidos assim como a presença conhecida. Mesmo que tivesse identificado imediatamente a diferença em sua essência, tê-la no mesmo recinto o fez congelar e ao mesmo tempo deixou seus instintos em alerta. Algo dentro de si, mesmo sem permissão, o fez piscar algumas vezes, forçando o grisalho a se mexer para reassumir o controle das próprias reações, ainda que os batimentos tivessem acelerados. 
Por uma fração de segundo, ele abaixou o olhar, engolindo em seco pela mão invisível que o segurou pela garganta, fazendo-o se concentrar em conter a respiração. O olhar também alcançou os gêmeos logo depois e Zero franziu o cenho em questionamento para aquilo. Havia retomado a postura no mesmo instante e, por ordem natural, o caçador de aproximou um passo a mais do presidente quando a figura desconhecida se posicionou. Aquilo definitivamente não lhe cheirava bem, considerando que não era uma pessoa da Associação e, ao parecer, também não era do Conselho. No entanto, foi Yuuki quem realmente tirou de si uma reação mais expressiva, quando o caçador torceu os lábios, se esforçando para não repuxar a feição em raiva.  
Quando Ichiru falou, Zero pressionou o maxilar. Claro que ele estaria envolvido no fim das contas, assim como Momo - e por esse motivo, também não escondeu o olhar irritado para nenhum dos dois. Qual atraso exatamente? Ambos sequer deveriam estar ali. Seu olhar os acompanhou até estarem próximos, ainda os fitando por breves segundos. Eles iriam explicar aquilo muito em breve. Mas assim como os demais na sala, sua atenção acompanhou a fala de Momo e, logo em seguida, Yuuki. 
Naquele segundo olhar, Zero refletiu que, mesmo com o último encontro conturbado que tiveram, era difícil observá-la tão desconfortável como naquele momento. Ao menos até que Yuuki verbalizasse o que havia negado para si mesmo desde o início. E mesmo que quisesse, Zero havia sustentado o contato visual, sua total e completa atenção até as últimas palavras. Não justificava, nada poderia justificar. E Zero sinceramente quis rir de escárnio quando o Kuran mais velho a complementou.
Talvez devesse questioná-la posteriormente por que havia o poupado de tal gentileza. Talvez pudesse questionar, na ocasião, por que uma vampira havia manipulado humanos em vontade própria desde que não era uma real situação de risco, e isso por si só violava as leis que estavam discutindo exatamente naquele momento. E para que expressasse o pensamento, Zero a encarou por alguns segundos até que a risada de Kyou o chamasse atenção novamente.
O grisalho estava sinceramente chegando ao limite diante de toda a situação, mas, ao menos inicialmente, prestou total atenção ao que a ruiva pretendia dizer. Parte do que ela falava Zero já estava ciente, mesmo quando todo o caos aconteceu, mas, aquela última informação… as mãos que estavam atadas às costas se soltaram e ele fez menção de mover a cabeça em negativa quando sentiu a mão de Ichiru encostar à sua muito pontualmente para ter sido um gesto casual. Ele sabia que o mais novo clamava por atenção e, mesmo assim, resistiu alguns segundos antes de encará-lo. O que Kyou estava armando? 
Ainda que tivesse a realização de que aquilo não era verdade, qual parte poderia ser mentira? Qual parte daquela história poderia estar, de fato, ligada a ele? Zero deixou de notar boa parte do que estava acontecendo, ainda que usasse as últimas forças para manter a postura. Não era possível, nada daquilo era possível. Não era possível que pudesse carregar algo tão importante sem notar pelo tempo que fosse. Não era possível que estivesse presente na vida de Kyou antes daquela noite na neve quando havia encontrado as irmãs sozinhas. Mas por algum motivo, ela havia revelado isso naquele momento. Não poderia dizer que não havia o ferido, caso fosse verdade, saber de tal informação naquelas circunstâncias. Assim, ele soltou a respiração devagar, relaxando os punhos antes que as unhas pudessem ferir as palmas das mãos. 
Enquanto Kyou prosseguia, Zero sutilmente trocou olhares com Yagari. Haviam chegado àquele ponto, enfim, o que o ajudou a retomar seus pensamentos para o presente e a responsabilidade que havia assumido. Zero seria um tolo se deixasse que as emoções assumissem o controle sobre suas ações e pensamentos novamente. Não mais. Principalmente quando estava ali para reunir os pontos mais importantes que Kaname e o Conselho expressavam, ainda que fosse contra. Por fim, mesmo que todos começassem a dissipar, Zero permaneceu próximo a Kaien, apenas desviando a atenção quando o mestre parou ao seu lado. O grisalho acenou para o mais velho que não demorou a seguir seu caminho, direcionando um último olhar para Ichiru ao seu lado. 
Zero se questionou, enquanto observava Kaien seguir com os demais, se deveria acompanhá-lo, como a posição demandava. Mas se viu incapaz de mover o corpo quando apenas os quatro permaneceram, até que as últimas presenças familiares dos irmãos os deixasse. Apenas Kyou e ele. Ainda assim, forçou os músculos a responderem, prestes a seguir em frente ou não saberia como reagir. À primeira menção de movimento, Zero sentiu o toque de Kyou sobre si e imediatamente fechou os olhos. Não ousou mover o olhar, os músculos ou até mesmo respirar. E nem conseguiria, caso quisesse, pois era como se algo estivesse preso a garganta e aos membros. O peito doía igualmente e ele tinha receio de que qualquer reação que pudesse ter, fosse o suficiente para que desmoronasse a fachada que havia mantido erguida durante todo aquele tempo. 
Durante aqueles meses.
No entanto, ao ver a reação de Kyou, sem avisar, as lembranças de tudo o que havia feito vieram a si e ele apertou os lábios em uma linha fina, os olhos respondendo imediatamente em rubro vívido. Ele abriu a boca, mesmo sem a real intenção de dizer algo. O vampiro a fitou, enquanto Kyou permanecia com o olhar baixo, para a mão que o segurava. Ela estava sentindo o mesmo que ele? Ele sabia que a pele dela era fria, porém, era como se lhe transmitisse um calor incomum. Uma energia impossível.
A mão virou sob o toque dela, de modo que as pontas dos dedos pudessem tocar o pulso pálido, mas no mesmo instante a sensação se foi, assim como o contato. Ele teve medo. Foi tomado por um medo ridículo de que aquilo… que ela… não passasse de uma ilusão. Ou que abrisse a boca para dizer que não poderia ficar. Que jamais retornaria. Que Zero não poderia acompanhá-la. Que levaria Momo e, consequentemente, Ichiru consigo. Que seu lugar agora era ao lado dos Kurans. 
Havia tanto que queria perguntar e dizer que mal poderia começar. Não poderia começar pois também não estava pronto para confessar todos os pecados que havia colecionado naquele tempo. 
Por enquanto, ele a fitou, sabendo exatamente o que se passava com a ruiva e engolindo em seco. Os instintos de Zero, mesmo que majoritariamente predadores devido ao seu lado vampírico, gritavam em ordem para ir até Kyou. Para protegê-la. Para destruir aquilo que a fazia sofrer. E sabia que, de alguma forma, o sangue dela que existia em si também era responsável por incitar tais reações. Mas, além de tudo isso, o destruía vê-la daquela forma quando Zero sabia que tudo o que mais havia desejado antes de toda aquela herança biológica da ruiva vir à tona era que ela pudesse ter uma vida longe de tudo aquilo. Longe daquela realidade e daquela agonia. 
Todo aquele tempo, ela estava…
Os olhos cintilaram novamente à menção de sangue e as mãos se fecharam em punhos, fazendo-o apertar os dedos com força. Não podia se deixar levar pelas emoções, nenhum dos dois podia, não ali. Mas as palavras seguintes de Kyou o trouxeram de volta, o atingindo com força. A garganta ardia e o vampiro estava usando uma força além do comum para permanecer exatamente onde estava. Zero lembrava exatamente dos últimos momentos com Kyou antes que apagasse no Colégio, e por isso, o peito apertou ainda mais. Não sabia quando havia sido a última vez na vida que ouvira tal frase direcionada para si. E sinceramente, não as merecia. 
O caçador soltou a respiração de forma pesada, inclinando o rosto minimamente à uma lembrança do toque dela em sua face. Mas tudo o que fez foi direcionar o olhar para as grandes portas que davam para a saída do salão, podendo ouvir a movimentação mais à frente. E ainda que o medo o consumisse, Zero precisava saber. ❝ —– Quando isso acabar…❞ A voz falhou e o olhar voltou para a direção de Kyou. ❝ —– … Você… irá permanecer?❞ Ele desviou o olhar quando os orbes escureceram em um rubro intenso. Era um risco não dizer tudo o que precisava ser dito ali, enquanto ainda podiam. Mas Zero não podia colocar toda a missão em risco, e, consequentemente, a própria Kyou, por conta de suas reações imprevisíveis. Por esse motivo, não esperou uma resposta concreta antes de dar alguns passos na direção da menor para observá-la. 
Se precisasse ser sincero, poderia segurar a dela mão e sair dali o mais rápido possível, para o mais longe possível. Ainda que soubesse que nenhum local do mundo seria longe o suficiente para que fugissem dos fantasmas daquele passado, ainda assim, se permitiu vislumbrar tal possibilidade, mesmo que já tivesse a considerado tantas vezes antes. Mas, no fim das contas, não era uma decisão sua, não era o passado dele em jogo. E sabia que Kyou jamais viraria as costas para aquilo. E além, muita coisa havia acontecido naqueles meses. Por isso, dessa vez ele não expressou nenhuma palavra. 
Cada vez que percebia o quanto a amava, também percebia o quanto aquele sentimento era doloroso para ambos. O quanto aquilo tinha o potencial de se transformar em suas fraquezas. 
Quando Kyou voltou a sentar, passando os próprios braços pelo corpo trêmulo, Zero estendeu os dedos, pronto para tocar uma mecha do cabelo ruivo na frente do rosto da menor. Mas parou no meio do caminho, fechando a mão e deixando que o braço pendesse ao lado do corpo. Se a tocasse ali, não seria capaz de parar mais. Com uma dor lancinante no peito ele respirou fundo, sentindo e vendo a visão embaçar ao fitá-la. ❝ —– Gostaria de ser capaz de tirar você de tudo isso.❞ Falou baixo o suficiente para que apenas ela pudesse ouvir, enquanto recolhia as mãos para os bolsos. O vampiro respirou fundo, se virando para a mesma porta que Kyou havia entrado. ❝ —– Precisamos ir.❞ A voz estava rouca pelo esforço de falar ainda tendo aquela mão invisível em volta do pescoço. Zero havia resistido por tanto tempo, então poderia lidar com aquela situação mais um pouco. 
Zero se adiantou para aquela saída e evitou o caminho mais visível, que era a escada central, preferindo descer por uma escada anexa até estar nas laterais do salão, pronto para entrar por uma das portas dispostas pelos cantos discretamente. Tudo aquilo para que tivesse tempo de se recompor. Por isso, segurou a maçaneta e encostou a testa na madeira pesada e fria à sua frente, fechando os olhos por um momento e tentando fazer seu corpo e seus instintos vampíricos se acalmarem até estarem aceitáveis. Contava com o selo para isso, que não demorou em executar seu trabalho.
Quanto àquela sede… Zero entendia Kyou. Ele mesmo, como um mero vampiro, com a sede, precariamente conseguia manter o controle. Na verdade, havia o perdido semanas antes. Também não queria ter reagido a Kyou daquela forma, não depois de tanto tempo. Não com as mãos trêmulas e ávidas para tocá-la. Não com a vontade que teve de trazê-la para seus braços até que se tornassem um. Não depois das palavras… 
Zero respirou fundo algumas vezes e apertou os olhos. A mão que percebeu apertar a maçaneta com força demasiada, afrouxou o toque. 
Estava voltando a si. Os caçadores ainda precisam de sua presença, tinha muito trabalho a fazer e um papel a cumprir. Zero também pretendia conversar com Kaien e Yagari em algum momento, sem a presença da ruiva. Diante de toda aquela situação, ainda que parecesse egoísta, Zero seguiria os próprios termos desde que significasse a mínima segurança para Kyou. Ele entrou no salão, buscando os caçadores que estavam dispostos pelo local e fazendo um checklist mental para tudo o que haviam discutido para a ocasião.
Uma vez que estava convencido de que tudo estava em seu lugar, por enquanto, Zero seguiu na direção da entrada principal do prédio, descendo para a área da frente quando avistou Yagari e seguiu até parar ao lado do caçador, que estava fumando às escuras de uma sombra. Ele levou as mãos aos bolsos, aguardando e observando o céu escuro até que o mais velho lhe direcionou o olhar ❝ —– Consigo ouvir as engrenagens na sua cabeça trabalhando formas de tirar vantagem de tudo isso. Só não sei para quem.❞ Zero respondeu o olhar, o questionando mesmo que não precisasse. ❝ —– Não que eu duvide da sua índole, Zero. Mas quer usar isso, de alguma forma, para protegê-la, certo? Apenas cuidado. Não sabe com o que está lidando❞. 
❝ —– Exatamente.❞ A voz saiu baixa, mas convicta. ❝ —– Não sabemos e, de alguma forma, os Kurans nos revelaram esta noite que eles também não sabem. Pelo menos não completamente. Creio que, até que toda a verdade seja revelada, a execução de Kyou traz mais benefícios para o Conselho do que para a Associação… ainda que represente algum risco para ambos os lados, é do nosso interesse manter os olhos nela e nos certificarmos de que os Kurans não estão a controlando.❞ Zero lutou contra a vontade de engolir em seco, sentindo as palavras amargas na própria boca. Ainda assim, se forçou a continuar: ❝ —– Ao que me pareceu, o Conselho a manteve consigo por esses meses mais por medo do que o poder de Kyou poderia representar. Compartilhar essas informações hoje não me pareceu um ato de gentileza, mas sim de ameaça.❞ Ele aguardou, até que o caçador se virou para ele por completo, avaliando sua expressão. ❝ —– Você sabe o que poderia significar para a Associação, então, se você ainda possuísse essa parte da essência de Kyou, certo?❞
O grisalho uniu as sobrancelhas enquanto encarava o mestre. ❝ —– Não é uma guerra pelo controle de uma arma! Ela ainda está sob nossa proteção. Além disso, não esqueça de que foi o sangue dela que sobrepujou o sangue de Shizuka em minhas veias. Você sabe o que isso significa.❞ 
Pelas constatações de Kaien, Zero tinha alguma influência na Associação naquele momento, mesmo que estivesse sendo completamente observado, até o mínimo piscar de olhos. Teria cuidado com as palavras, mas usaria isso, e entraria na dança política que envolvia a Associação e o Conselho. ❝ —– Poderia significar um pouco mais de conhecimento sobre com o que estamos lidando exatamente. E talvez até como isso reflete nos interesses do Conselho sobre ela. Ainda assim, preciso lembrá-lo que Kyou não é mais uma humana. E o poder que ela representa… não há como protegê-la disso, por mais que você tente, Zero. Nenhum de nós sabe o que aconteceu com ela durante esse tempo com os Kurans.❞
O grisalho apertou o maxilar, entendendo o que Yagari poderia estar insinuando. Mas ele sabia que não era o caso, pois Kyuo jamais os trairia. Era absurdo e se apegaria fortemente àquela afirmação. ❝ —– Eu não a entreguei.❞ A primeira reação do mais velho foi de confusão, mas quando ele direcionou o olhar rapidamente para a entrada do salão, Zero soube que ele havia entendido. ❝ —– Também não sabia dessa informação até hoje.❞ Esperava, profundamente, que não tivesse cometendo o maior erro de sua vida. Mas precisava ter a confiança da Associação. E, apesar de tudo, confiava em Yagari. 
Zero finalmente fez menção de retornar para o interior do salão, mas o mestre ainda completou atrás de si: ❝ —– Seu inimigo tem tanta influência sobre você pois o entregou exatamente o que ele precisava saber: sua maior fraqueza. E isso é a derrota de qualquer caçador.❞ Ele seguiu para assumir mais uma vez sua posição dentro do grande salão, recebendo um olhar de Kaito. Logo, passou a se mover pelas laterais, dentre as pessoas, enquanto os olhos buscavam uma figura conhecida.
   Era como se tivesse congelado exatamente no lugar onde estava, na posição em que havia se colocado e mesmo prestando atenção nas palavras de Zero, Kyou não fora capaz de responder nenhum dos questionamentos feitos pelo mesmo. A cada minuto que passava e não sentia o toque dele, um terror abrasador a consumia… Não havia ninguém ali, sua prisão fora dizimada… Então o que era aquela densa camada que se formou entre ambos? No instante em que a porta se fechou, os dedos afundaram na pele, controlados o suficiente para não a ferir desde que o derramamento de sangue seu próprio sangue traria problemas; com sorte, algo em seu subconsciente ainda era capaz de assumir o controle de pequenas coisas como esta.
      ❛ Você passou um pouco mais de meio ano fora… Ainda havia esperanças em seu coração de que alguma coisa voltaria ao normal diante do seu retorno? ❜ A medida que as lágrimas deslizavam em abundância pelo rosto de Kyou, a presença feminina de longos cabelos púrpuros se materializava próxima a porta de saída, as costas repousando ali, os braços se cruzando nervosamente. Aki possuía um ar diferente do que habitualmente carregava, algo mais agressivo.  ❛ Você foi deixada em um casulo enquanto o mundo inteiro estava em chamas, Kyou. Acredito que até o tempo de pensar nessas circunstâncias tenha sido negado a você.  ❜ A ruiva não respondeu, mantendo o olhar fixo no chão, enquanto as próprias lágrimas caiam num pranto incessante. Soluços reprimidos alcançavam a audição aguçada da Ancestral, que se aproximou um pouco mais. ❛ Nada pode voltar a ser como era antes… E você é a única capaz de encontrar as peças que estão faltando… Sobre seu passado, sobre você, sobre tudo. ❜
      ❛ Zero-nii passou por muita coisa… ❜ O rosto de Kyou se ergueu no momento em que a voz de Momo alcançou seus ouvidos. A mais nova se aproximou até mais do que Aki, deixando Ichiru, que claramente sempre a acompanhava, cuidando da porta por onde haviam adentrado. No fim, Aki também se moveu um pouco mais pelo ambiente, concentrando-se em algo mais especifico, suas ações dependiam de determinados resultados e, por tanto, não se moveria até tê-los de fato. Momo agarrou ambas as mãos de Kyou, pressionando-as contra o próprio peito, forçando a mais velha a se concentrar em si. ❛ Ele cuidou muito bem de nós por todo esse tempo, e sei que ele nem sequer se deu conta disso… Eu não teria sobrevivido sem ele… Sem Ichiru. Ficar sem você me deixou muito doente… Mas eles me lembravam constantemente de que você estava viva e então eu esperei ansiosamente pelo seu retorno. Eu sei que ele nunca deixou de pensar em você, de procurar formas de te trazer de volta… Foi terrível pra ele… ❜
      ❛ A posição dele como Caçador é completamente diferente agora… Tudo vai muito além do seu conhecimento atual e embora você tenha se tornado praticamente o centro de tudo… Os pormenores precisam continuar sendo levados em consideração… Então, por favor, não desista... ❜ O Kiryuu mais novo carregava um tom de voz bem mais ameno e preocupado, incapaz de manter o olhar fixo em Kyou enquanto ela estivesse naquele estado. Tinha pleno conhecimento de como as coisas haviam mudado e de como tudo seria mais difícil dali em diante… Só esperava que a ruiva conseguisse se encontrar novamente em meio a tudo.
   As palavras dos gêmeos cessaram suas lágrimas, mas ainda se manteve imóvel e em silêncio. Talvez tivesse chorado mais nos últimos tempos do que em toda sua vida antes de ser levada pelos Kurans. Tudo que Momo e Ichiru diziam carregavam um peso enorme, entretanto… Era quase como se já soubesse sobre tudo, o problema não eram as circunstâncias ou o modo como o mundo funcionava atualmente, o real problema é que não esteve presente, durante todo aquele tempo. Não foi capaz de evoluir com nenhum deles, dar apoio, dividir o peso… Esteve presa no tempo, recuperando tudo que haviam tomado de si a força, procurado respostas que pudessem ajudar a desvincular sua existência de uma possível calamidade ou algo que confirmasse a periculosidade de sua existência… Só desejava saber se era alguém que valia a pena ser protegida ou se a própria destruição traria ordem ao caos. Estava orgulhosa, era visível como todos haviam evoluído, sendo capazes de controlar os próprios sentimentos nas situações mais árduas, lidar com alguém como Kaname… Suas feições carregavam novos traços e esperava poder entender tudo que haviam passado em algum momento também… Quando o silêncio voltasse a lhe pertencer… Talvez fosse a hora de ceder também.
      ❛ Ichiru, venha aqui… ❜ A destra de Kyou segurou firmemente uma das mão de Momo, enquanto a canhota se estendeu na direção do mais novo, que arregalou os olhos levemente, mas a aceitou. ❛ Aki, eu preciso que você nos isole, não deixe nada se externar para fora daqui... ❜ Um sorriso quase cruel se moldou nos lábios da Ancestral, que prontamente assentiu em resposta, se retirando do local com cuidado. Os irmãos, embora confusos, se mantiveram próximos a Kyou, aguardando uma resposta. ❛ Eu preciso do sangue de vocês… Mas não em uma quantidade pequena… Não posso garantir que ficaram conscientes depois disso... ❜ Momo foi a primeira a concordar sem quaisquer questionamentos, entretanto a relutância de Ichiru fez com que Kyou se erguesse da mesa, mantendo-os um de cada lado de si. ❛ Momo vai confiar em mim, pois somos ligadas por algo muito maior… Você compreende isso, já que compartilha dessa mesma ligação com o Zero... ❜ Os dedos do Kiryuu mais novo se entrelaçaram aos dela, ainda que estivesse com medo, aquela era uma afirmação que o preenchia com algo que superava sua covardia diante de tal situação… Era capaz de compreender aquele laço, entretanto não sabia se era capaz de confiar plenamente em qualquer ação que Kyou pudesse tomar dali em diante.
      ❛ Você vai se colocar em risco de novo… ❜ O menor sussurrou baixo, desviando o olhar e mordendo o próprio lábio inferior. ❛ Não me conforta saber que não vou estar consciente para intervir... ❜ Pouco se importava com o próprio sangue, mas não estar presente num momento como aquele… Aquilo o atormentava.
      ❛ Você sabe da restrição imposta a mim… Preciso me alimentar, mesmo que eu não queira, se eu continuar no estado em que eu estou, não vou conseguir fazer muito e o único sangue que eu sou capaz de aceitar é o de vocês…  Momo porque é sangue do meu sangue... Você, Ichiru, porque compartilha do sangue do Zero... O cheiro de sangue não vai se espalhar, Aki vai garantir isso. ❜ Os olhos reluziam fracamente, como um vislumbre de sua sede, mas nada muito além disso. Mesmo que cada sangue possuísse uma singularidade, tomar o sangue de Momo e Ichiru mantinha seu sangue limpo, apenas com sangue do seu sangue... E dos Kiryuus. ❛ Maria vai estar com vocês em um dos quartos… Você deve ser capaz de despertar antes mesmo de Momo, mas precisam repousar e se alimentar logo em seguida. O motivo de eu pedir o sangue de ambos é porque a dose que eu necessito mataria um ser humano normal… ❜ Não havia orgulho em suas palavras, ainda que a voz não falhasse, a dor em seu peito se tornou crescente e precisava aceitar aquilo como sua única punição. Ou beberia do sangue de ambos, ou provavelmente perderia o controle até o fim da noite diante de qualquer situação que se sucedesse e seria levada por Kaname de novo, e, desta vez, nem um possível apoio da Associação serviria de ajuda. ❛ Meu familiar está vagando ao redor da Mansão desde que chegamos e eu sei que tem algo errado… Existem coisas que a Associação e nem o Conselho podem controlar, vocês sabem disso... ❜ Ela apertou um pouco mais as mãos de ambos. ❛ Eu vou falar com Zero e a Associação, eu prometo, só vou agir sozinha se não houver outra opção. ❜
                                                                               ❛✿:≀ eıns::。 
      ❛ Jovem dama, você... Faz idéia do que se trata essa reunião...? ❜ 
     ❛ Convidar uma garota humana tão jovem a esse baile... Kaname-sama fez algo bastante perigoso...! ❜ 
      ❛ Com licença... Poderiam gentilmente me deixar passar? ❜ Atravessar o grande salão se mostrou uma grande tarefa. Enquanto Sayori transpassava pela multidão de vampiros, os murmúrios se dividiam entre très assuntos principais: a humana, os kurans e os purosangues convidados. A estudante vagou o olhar pela sala em busca de Kaito e ao avistar o mesmo, se aproximou com cuidado. ❛ Yuuki já chegou, eu ouvi uma agitação vindo da outra sala, poderíamos ir até ela agora? ❜ Tinha prometido não se afastar do Caçador e embora tenha vagado sozinha por um tempo, obedeceu a regra de não sair do campo de visão dele. Kaito apenas assentiu a cabeça positivamente, afinal, esteve atento ao baile durante todo momento e a chegada dos Kurans jamais passariam despercebidas aquela altura.
     ❛ Vamos... ❜ O mais velho segurou uma das mãos de Sayori, mas mesmo sua presença não fez com que os vampiros recuassem o suficiente, tornando o próprio espaço e o de Sayori limitados no salão. A língua estalou no céu da boca e ele suspirou impaciente, passando a buscar um caminho alternativo e, que de preferência, causasse menos incômodo.
      ❛ Pessoal... Não há motivos para se preocuparem, afinal, essa noite estamos entre damas e cavalheiros e somos todos convidados confiáveis, trazidos aqui por nosso anfitrião Kaname-sama, não é...? ❜ A voz desconhecida e aveludada ecoou num timbre impecável e como um feitiço de comando, ela conseguiu uma atenção maior de quem ela queria que a notasse, enquanto os demais provavelmente pararam no centro do salão apenas admirados por sua beleza. Cabelos longos e dourados, adornados por fitas brancas que acompanhavam o enorme vestido que trajava, os olhos dela cintilavam num azul profundo, como a parte mais funda e inalcançável do oceano, quase abissais. Ela exalava nobreza... E o sangue que corria por suas veias tornavam qualquer um ciente de seu status como uma Purosangue sem esforço. Um sorriso sutil moldou os lábios rosados, enquanto ela tombava a cabeça para o lado, claramente interessada e direcionada a Sayori. ❛ Você não ficou com medo? Mesmo acompanhada por um Caçador, a senhorita é uma jovem corajosa e... Também muito bonita. Estava procurando nossos anfitriões? Eu me chamo Sarah, Shirabuki Sarah e ficaria feliz em me oferecer para levá-la até eles. ❜ Sua beleza era tão surreal que tanto Sayori quanto Kaito não conseguiram dar uma resposta imediato e com isso, a mão de Sarah se aproximo de uma das mãos de Sayori, verdadeiramente disposta a guiá-la consigo.
                                                                              ❛✿:≀ zwei::。
   Caminhar pelos corredores da Mansão lhe causavam arrepios, entretanto, Kyou conseguiu executar tal tarefa melhor do que o esperado. Era como se aquelas paredes pudessem a fechar e a aprisionar a qualquer momento… De novo, de novo e de novo. Depois de absorver o sangue dos mais novos e deixá-los sobre os cuidados de Maria, Kyou precisou tomar um tempo para si; quase como se o corpo tivesse demandado tempo para se adaptar ao sangue ingerido. Os sentidos se aguçaram como a muito tempo não fazia, era como se readaptasse a um corpo novo… Mas, precisava admitir, sentia-se quase inteira. Tudo que havia treinado, tanto em teoria quanto prática, o poder que Aki havia sobrepujado, pareciam voltar e se adequar, como se o corpo finalmente estivesse pronto para receber tudo que havia sido instruído.
   Havia tomado para si como primeira missão encontrar Zero e como a intenção era continuar despercebida, Kyou diminuiu a intensidade da presença de seu sangue e caminhou com a cabeça coberta pelo capuz que usou para chegar ali. Não foi difícil trilhar um caminho, não quando os Nobres sussurravam sobre todos os acontecimentos e sem dificuldades ela chegou até ali…
      Uma das mãos de Zero envolviam o pulso de uma suposta Purosangue...       E a canhota de Yuuki se apoiava no braço de Zero.
       ❛ Poderia, por favor, soltá-la…? Ela é uma de nossas preciosas convidadas. ❜
      As próprias mãos se guiaram até o laço envolto no pescoço e as pontas dos dedos os desfizeram, alargando o capuz que lhe cobria o rosto. Quando o mesmo caiu do topo da cabeça, as madeixas avermelhadas se soltaram, recaindo sobre os ombros cuidadosamente revelados. Os Nobres que a circundavam se distraíram por um único instante e quando os incontáveis olhares se fixaram na ruiva, os olhos dela comprimiram imperceptivelmente, reluzindo em uma faísca. Pela primeira vez, o salão fora tomado por um silêncio avassalador e imediatamente os que se encontravam no centro abriram espaço e Kyou caminhou até onde Zero estava, os olhos fixos na mão de Yuuki repousada no braço do Caçador. Quando atingiu distância o suficiente, a Caçadora agarrou o pulso de Yuuki, o puxando para cima, obrigando a Vampira a tirar a mão de Zero. A Kuran estremeceu, os lábios trêmulos revelavam que queria se pronunciar, mas estava assustada… Assustada demais com a essência que a ruiva exalava. Depois de livrar Yuuki de si mesma, Kyou se colocou defronte a Zero, desta vez era ela quem repousava a mão sobre a dele, as pontas dos dedos pressionando a pele do mais velho com uma força fora do comum, demonstrando o quão estava irritada, ainda que fosse difícil determinar um motivo específico.
      ❛ Então essa é a Purosangue vinculada a família Kuran? ❜
      ❛ Ela é realmente linda e deve ser a melhor amiga da Princesa Kuran. ❜
      ❛ Que tipo de relação ela deve ter com o Kaname-sama? ❜
      ❛ Qual o nome dela? De que família será que ela vem? ❜
      ❛ Ouvi dizer que ela é uma Caçadora desde pequena... ❜    Logo o salão se agitou novamente, a atenção dividida entre as duas Purosangues… E a Princesa Kuran.
      ❛ Por favor, Kiryuu-senpai… ❜ Talvez tivesse exagerado com tanta formalidade, mas não havia muito o que pudesse fazer mediante aquela situação.
      ❛ Ara… Ai está você… A melhor amiga dos Kurans! ❜ Toda atenção que se formou sobre Sayori se dissipou e no instante seguinte pairaram sobre Kyou. Sarah até mesmo diminuiu a distância, forçando Yuuki a ir um pouco para o lado e Kyou recuou, sentindo as costas baterem contra o corpo de Zero. ❛ A Purosangue que na verdade é uma Caçadora, não é? ❜
   Kyou respirou fundo, repousando a mão livre sobre o peito e fazendo uma leve reverência… Não pareceu ter qualquer intenção de afastar o corpo de Zero e muito menos de soltar sua mão, precisava deixá-lo ciente de que precisava dele ali. ❛ Não presuma meu relacionamento, por favor, Shirabuki-sama... ❜ Os olhos piscaram rapidamente, como se algo a tivesse trazido certo tom de familiaridade, mas não conseguiu distinguir o quê e precisou dar continuidade para encerrar a comoção de uma vez. ❛ Eu sou realmente uma Caçadora, mas também sua semelhante e por isso gostaria de pedir para não se aproximar de Sayori, por favor, ela está aqui como convidada de Yuuki-sama e Kaname-senpai e tem toda proteção da Associação. ❜ A Purosangue sorriu, desta vez apenas observando as ações de Kyou e o movimento no salão. ❛ Kaito-san, acompanhe a Sayori-chan e a Yuuki-sama, eu cubro sua posição por aqui... ❜
   Kaito agarrou as mãos tanto de Sayori quanto de Yuuki, aproveitando o espaço que ganhara para se livrar da multidão de vampiros e seguir para onde quer que as amigas pretendessem ficar. Ele claramente não agia pelas ordens de Kyou e a ruiva estava contente por existir algo a mais que o fazia acatar seu pedido.
      ❛ Vamos nos encontrar mais tarde! ❜ Sarah seguiu numa direção contrária ao grupo, sorridente e acenando como uma despedida, que Kyou não correspondeu, observando  toda situação se dissipar e finalmente tudo voltou a uma normalidade.
      ❛ Precisamos conversar… ❜ A ruiva sussurrou baixo, de uma forma que somente Zero poderia escutar, enquanto repousava ambas as mãos sobre os ombros dele, pressionando os dedos ali como se pedisse para ele se abaixar e diante da situação, Kyou precisou se colocar na ponta dos pés, aproximando os lábios de uma das orelhas dele. ❛ Tem algo errado… Temos que voltar para os corredores e eu preciso da Thanatos... ❜ Os olhos vagavam pelas pessoas mais próximas, certificando-se de que ninguém estaria atento a eles. 
⤹ ✿ . ⃗. .  alone at night .
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bloodmocn · 5 years
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izerokiryuu‌:
Talvez seu maior erro tivesse sido se entregar ao momento e dedicar toda sua atenção a ruiva. Havia isolado todo o resto, se deixando cegar pela preocupação, pela sensação da pele, pelo cheiro dela. Zero poderia punir a si mesmo por ter sido tão tolo àquele ponto. E alguma coisa, bem no fundo, o fazia sentir que não aquele não era o primeiro descuido.
Foi o que conseguiu raciocinar naquele breve segundo.
Sequer notou qualquer oscilação no ambiente até que fosse tarde demais e os pelos da nuca tivessem se eriçado meio segundo antes de sentir o toque que fez o tempo desacelerar. Que o afastou das sensações, das vozes, do próprio controle sobre o corpo e mente, que ficaram tão distantes tornando-o incapaz de entender o que era dito ou de quem era a voz.
Então Zero foi jogado no abismo.
                                                                          ⌘
Uma pequena garotinha de cabelos escarlates e olhos carmesins, pele clara como a neve e uma expressão claramente emburrada, pisava forte no chão, fazendo um barulho irritante com o salto que calçava. Seu vestido era com o de uma princesa, tantos detalhes que nem valia a pena ressaltá-los.
Ele sentiu o corpo congelar quando a pequena ruiva se aproximou de si e logo em seguida começou a tremer levemente. O caçador se abaixou devagar em frente aquela figura e, esticando uma das mãos, lhe tocou a bochecha com a ponta dos dedos. Ela estava corada.
Não podia ser…
                                                                         ⌘
Uma sensação de leveza o atingiu e era como se estivesse suspenso no ar depois de uma longa queda.
Em meio a escuridão, ele conseguia ver uma pequena faísca oscilante, tão distante. Uma joia que o vampiro reconhecia muito bem, mas, mesmo que tentasse estender a mão para alcançá-la, não conseguia se mover. Ele não conseguia se mover e impedir que aquela luz se apagasse aos poucos, até sumir, deixando-o sem nada novamente.
Calafrios o percorria, fazendo a garganta fechar e uma sensação de bile lhe atingir. Toda e qualquer energia parecia ter sido sugada do corpo, então Zero apertou os olhos, tentando trazer de volta os sentidos. Mas todo o processo parecia uma eternidade, e sequer mover qualquer membro se mostrou uma tarefa árdua.
O que tinha acontecido?
Ainda assim, o caçador se moveu minimamente, apoiando o tronco com os braços quando foi impedido por mãos pequenas e frias que lhe seguraram o rosto. Zero obrigou as pálpebras a se abrirem, mas a pessoa já estava próxima demais, os lábios tocando os seus e, de repente, todos os sentidos voltaram a si como uma parede se chocando contra o corpo. Os olhos se arregalaram, mas o corpo alheio se impulsionou contra o seu.
Estava tão surpreso que foi como se aquele segundo tivesse parado. Yuuki o havia beijado. De todas as situações possíveis, não poderia ter ficado mais confuso. E apesar do toque frio que havia sentido antes, os lábios de Yuuki pareciam mornos pressionados contra os dele, a respiração lhe atingindo o rosto.
Com os olhos abertos, após um segundo fitando o rosto dela, Zero não pode deixar de notar que Kyou não estava em lugar algum do cômodo. As mãos se moveram para segurar os ombros de Yuuki, e talvez ela não tivesse entendido sua intenção de afastá-la, a princípio, mas uma movimentação no ambiente a fez pular para longe. Só conseguia olhá-la petrificado. E estava prestes a perguntar o que inferno estava acontecendo, quando a porta do quarto irrompeu.
Momo entrou como um furacão, trazendo consigo os sons do mundo e cheiros e todo o resto. Antes que ela chegasse a si, os olhos do vampiro percorreram o quarto, buscando e analisando o que quer que tivesse despertado seus instintos.
Ele abriu a boca para dizer que estava bem, na medida do possível, pois não estava ferido. Mas o estado dela e a próxima pergunta veio, fazendo Zero apertar os olhos. ❝ —– O que v…❞ Algo estava muito errado, e ser interrompido pelas palavras de Ichiru apenas reforçaram. Os olhos dispararam para as mãos do mais novo, fazendo o mundo cair quando viu os cabelos ruivos.
Quando tentou buscar na memória, as lembranças pareciam distantes demais e, em algum ponto, sumiram como fumaça. E Zero não conseguia ir mais distante, sentindo a raiva tomar conta do peito.
Apesar do tom de voz direcionado a si, apesar dela sentir o sangue esquentando na veia em desafio, Yuuki se manteve visivelmente calma. Soltou um curto suspiro, o olhar voltando-se para Zero enquanto recordava daqueles momentos na velha construção. Das palavras que jogou contra a ruiva.  
❝ —– Há muito pouco que você sabe e entende sobre o passado dela. Entenderia se soubesse…❞
Ele também conseguia ler pelo olhar da morena ao que ela se referia, e Yuuki estava satisfeita que tivesse conseguido fazê-lo lembrar. ❝ —– Eu disse pra você que nada disso é real. Eu disse que não permitiria isso. Disse o porquê de precisarmos fazer isso Zero! Você… você não pode apenas confiar em mim?❞
Disse que você é importante para mim. A vampira respirou fundo, controlando as emoções.
Zero soltou um riso de escárnio. No entanto, isso só fez com que Yuuki se movesse, levantando com uma calma incrível. ❝ —– Você está confuso porque ela não sabe como controlar aquele poder destrutivo. Todos nós estamos.❞ Continuou o fitando, mas logo completou num sussurro: ❝ —– Jamais deveríamos tê-la perdido de vista.❞
Toda aquela comoção era o que Yuuki não queria ter de passar. Tendo Kyou como o centro de todas as atenções e conflitos, no fim do dia, sempre se resumia a isso. Ela suspirou novamente e tocou os lábios com a ponta dos dedos por um momento, como se ignorasse toda a situação. Depois de tudo aquilo, das transformações, das palavras ditas e não ditas entre eles, não queria que acabasse assim. Tinha de haver outra forma!
Não é Zero? Yuuki pensava que tinha de haver, pois não suportava a ideia de se tratarem como inimigos.
❝ —– Você sempre quis ter o controle de tudo, não é?!❞ A voz de Momo se fez presente e quando ela estava prestes a se mover para avançar em Yuuki, Zero lhe pressionou a mão, segurando-a no lugar.
Ao menos porque ele mesmo precisava de algum apoio naquele momento, permaneceu com os dedos firmes em torno dos da mais nova. ❝ —– Onde ela está Yuuki?❞ A voz saiu rude e fria, fazendo a morena lhe lançar um olhar magoado e se virar. Ele ainda não sabia qual era o envolvimento de Yuuki em tudo aquilo, e ainda estava digerindo o significado dela tê-lo beijado momentos antes.
O vampiro já estava expandindo cada gota de força que tinha em busca de traços de Kyou, ele a sentiria. Se ela estivesse próxima, sentiria. No entanto, para o desespero, o único indício de presença se encontrava ali nas mãos de Ichiru. E, absurdamente, nada mais.
O caçador se moveu rápido, parando ao lado do irmão e pegando o cabelo cortado.
Se a única gota de essência que conseguia sentir se resumia aquilo… Zero entendeu. Ele se virou novamente, devagar, para Yuuki. ❝ —– Quanto tempo faz?❞ A pergunta lhe escapou baixa, uma raiva fria tomando conta de si quando os olhos brilharam escarlate.
A morena apertou os lábios em uma linha fina. Ainda que já estivesse longe, havia estragado tudo. ❝ —– Zero, ela já causou tantos danos… Essa existência…❞ tentou se aproximar com a mão estendida. No entanto, ele sabia que tudo aquilo era apenas uma perda de tempo. Por isso, se virou rapidamente para a porta, na mesma velocidade que Yuuki se pôs no caminho, bloqueando.
❝ —– Ela está bem, Zero.❞ Ele desviou do corpo menor, seguindo. As mãos fechadas em punhos numa tentativa de controle.
No meio do corredor, Yuuki o alcançou, fazendo ambos pararem novamente. Momo e Ichiru correram para fora do quarto, mas, àquela distância não conseguiram ouvir quando a vampira respondeu baixo: ❝ —– Ela partiu com o Kaname-sama.❞ O grisalho piscou. ❝ —– Estará segura com ele, você sabe disso… E ela também sabe.❞ Por isso havia partido — leu no olhar dela. ❝ —– Somos os únicos que podem ajudá-la.❞
Sem mais uma palavra, o caçador sacou Blood Rose, apontando-a para a morena que respondeu estendendo Artemis à frente de si. ❝ —– Me leve até Kyou, e deixe que ela diga isso para mim.❞ Por mais que tentasse controlar, o coração parecia que sairia do peito e já podia sentir o tremor tomando conta dos membros. ❝ —– Eu cansei de tudo isso. Do jogo que vocês puros-sangue jogam enquanto vivem sob as regras desse mundo podre. Não posso perdoar mais nada… Yuuki.❞ A voz tremeu ao final da frase, mas só conseguia sentir a raiva e revolta por parecer tão impotente quando rodeado pelas tragédias que envolviam aqueles vampiros. Pelo poder de controle e político que possuíam.
Chega.
❝ —– Não posso fazer isso com você, eu não posso. Você não entende, eu… Zero, eu decidi há muito tempo atrás que eu vou ficar do seu lado. Mesmo você me considerando sua inimiga.❞ A voz dela estava triste, apesar dos olhos decididos.  ❝ —– Mas… não é justo… que seja apenas comigo…❞
Ainda que sentisse raiva, olhando para Yuuki naquele momento, ele não conseguiria puxar o gatilho. Não conseguiria usar a arma pois sentia que ainda estava preso as conexões do passado.
                                                           ⌘
Pequenas mãos macias seguraram seus punhos com força, ainda que tivesse um cuidado claro de não machucá-lo enquanto as afastava da epiderme já ferida. ❝ —– Está tudo bem agora… tudo bem.❞ A garotinha sussurrou com a voz embargada, o fazendo apertar os lábios em uma linha fina. Não queria que ela o tivesse descoberto ali.
Yuuki encolheu o corpo perto do seu, lágrimas já escorrendo pelo rosto que sempre lhe parecia tão alegre. ❝ —– Vou continuar aqui desse jeito, Zero-kun.❞ Com isso, uma das mãos foi até o pescoço dele, cobrindo o machucado que havia feito ali com as unhas, onde o sangue escorria e lhe manchava a camisa, assim como os dedos dela. ❝ —– Se você não consegue esquecer da sensação da mordida daquela mulher vampiro, então vou continuar segurando seu pescoço desse jeito para que possa esquecer…❞
A mão dela era tão morna e macia…
Não é só isso… Yuuki. Não era só isso e imaginou como ela reagiria ao saber que havia tentado atacar Kyou não muitos dias antes. Do que ele havia se tornado.
❝ —– Ok…❞
Zero não conseguia parar de se perguntar por que era ela quem estava chorando. Pensou que, na próxima vez, apenas se certificaria de que ela não o descobriria.
                                                                         ⌘
Ele afastou a lembrança, passando por Yuuki com as madeixas entre os dedos apertados, correndo por todo prédio. E verificou em cada dormitório. E depois na velha construção em pedaços. Também percorreu toda a extensão da floresta ao redor.
Eu não quero perdê-la de novo… Então, por favor, não desista dela… A voz de Momo parecia trazer um peso ainda mais significativo em sua mente.
Em algum momento, Zero retomou a possibilidade da própria Yuuki levá-lo até o Kuran e voltou para a Academia. A morena havia partido não muito tempo antes e, aparentemente, não havia se esforçado para encobrir o próprio rastro, então ele seguiu. Mesmo sabendo que poderia ser uma armadilha, seguiu. Até os limites da Academia, já próximo a cidade quando os encontrou - esperando. Kaname e Yuuki, lado a lado, onde começava o caminho da estrada que os levaria para longe. Em algum lugar entre as árvores atrás, podia sentir outra presença vampírica, embora nenhum rastro de Kyou. Então Zero avançou com passos firmes, os olhos em um vermelho gritante.
Todo o cenário contribuiu para que sacasse Blood Rose, uma ira tão grande ao recordar de quando Shizuka havia aparecido, Ichiru, e então Rido. Tudo o que haviam causado de sofrimento para Kyou apenas pelo sangue que ela havia herdado. De alguma forma, Kaname estava sempre ligado aqueles acontecimentos.
Uma mistura de desespero apertou o peito por, ainda assim, não estar sentindo a essência de Kyou em lugar algum perto, e quando o grisalho encarou o puro-sangue, por algum motivo, a arma se uniu a si através de espinhos que percorreram seus braços e tronco. O momento não o permitiu sentir mais do que apenas a conexão se fortalecendo, tornando-os um só.
❝ —– Poupe suas energias, Kiryuu. Não tenho intenção de lutar contra você.❞ O caçador o encarou, podendo ler o “ainda” que completava a frase no olhar do outro. ❝ —– A pedido da nossa querida Kyou, você terá minha proteção, assim como Momo e Ichiru. Mas não me teste.❞
❝ —– Ela… tomou uma decisão, Zero.❞ A voz baixa da morena completou, sem emoção alguma dessa vez.
Era ridículo, e Zero sequer se deu o trabalho de responder, a arma alternando a mira para Yuuki também. Nesse momento, o Kuran mais velho uniu as sobrancelhas numa expressão irritada e ergueu uma das mãos, fios de sangue surgindo sob seu controle. Quando se moveu em direção ao caçador, fosse através dos instintos ou não, os espinhos se expandiram até que estivessem enroscados na destra estendidas do Puro-sangue, a meio caminho de si. ❝ —– Sei que não a mataria. Mas não posso perdoá-lo por apontar essa arma para Yuuki.❞
Então Kaname avançou novamente, fazendo Zero atirar em resposta e Blood Rose se encarregou de esmagar pele e osso com as raízes enroscadas no pulso do Kuran. O sangue do vampiro escorreu pelo punho e só não atingiu o chão devido a suas habilidades de controle sobre o líquido. Kaname não pareceu nenhum pouco abalado, no entanto.
❝ —– Onii-sama…❞ Yuuki fitava diretamente o pulso destruído do irmão, seus próprios olhos brilhando em escarlate naquele momento.
O vampiro manipulou o sangue para que reconstruísse o membro destruído e segurou um punhado de espinhos que ainda o circundava. Quando os olhos encontraram os do caçador, as palavras saíram como uma ordem, mas não para si ❝ —– Ainda que apenas pelo sangue de Kyou… Bloody Rose, se você conseguiu despertar esse tanto, será que consegue reconhecer minha voz?❞
Zero o olhou confuso quando sentiu um pulsar no pescoço, no punho e onde mais conseguia sentir os espinhos unindo-se à sua pele. ❝ —– Assim como reconhece o gosto do meu sangue. Você poderia, gentilmente, me libertar?❞ Com isso, não pode evitar olhar para o vampiro em choque. De repente, era como se a arma simplesmente não estivesse mais conectada a si. ❝ —– … Há alguém que quero proteger.❞
❝ —– O que… o que você fez?❞ Zero podia senti-la voltando-se contra si, contra sua própria natureza. Bloody Rose esteve consigo desde sempre, nem mesmo o rejeitando quando Zero era um vampiro. Mas, naquele momento… A mão livre seguiu para o punho onde ela estava presa, sugando seu sangue. Mas antes que pudesse agir, Kuran Kaname avançou em sua direção, uma arma de sangue pronta para finalizar com o caçador.
Exceto pelo momento que Yuuki apareceu diante de ambos, as mãos estendidas. ❝ —– … Parem agora!❞
❝ —– …Yuuki! Se afaste. Não posso perdoá-lo por pensar em ameaçar sua vida.❞
❝ —– Ainda assim, nós prometemos onii-sama. Não o Zero. Apenas… apenas vamos.❞ Os olhos se voltaram para Zero mais uma vez, e mesmo que estivesse decidido, baixou o olhar para a morena, que parecia prestes a chorar. Mesmo que a vida do caçador já não lhe servisse àquele ponto, Kaname não arriscaria carregar a mágoa de Yuuki. Não quando ela havia demorado tanto para retornar.
Ajoelhado no chão, sentindo as forças se esvaindo enquanto tentava empunhar Blood Rose novamente, Zero viu ambos se afastarem, a morena parando apenas mais uma vez, por apenas um segundo antes de desaparecer por completo na floresta. Ele não havia deixado de notar as lágrimas que escorriam pelo rosto dela.  
Tudo o que Momo tinha lhe contado antes, todas as memórias. Tudo o que haviam passado com os Kurans. As últimas palavras de Yuuki.
Não desista dela…
Zero tentou se levantar, ainda que a energia se esvaísse aos poucos, lançando-se para frente a tempo de ver Seiren surgir como uma mancha entre ele e o caminho. Ela olhou para a mão do grisalho, onde a arma reagia assim como reagiria a qualquer outro vampiro. A uma ameaça. Mas não demorou muito para que fosse jogado para a escuridão novamente.
                                                          ⌘
Kaien permanecia sério, os dedos cruzados embaixo do queixo e o pensamento distante, enquanto Zero olhava para o jardim de uma das enormes janelas do escritório. Estivera um tempo andando de um lado para o outro, exatamente como Ichiru fazia agora. Mas a inquietude estava impedindo-o de pensar direito e Zero precisava se concentrar em achar uma solução.
O caçador teve de, finalmente, juntar os cacos do próprio caos e organizar todo aquele momento, não só com Kaien mas também com Ichiru. O diretor, de fato, não lembrava de absolutamente nada da ruiva e a julgar pela reação, estava considerando se aquele era um problema que colocaria acima dos problemas da Academia em ruínas. Dos alunos mandados para casa. De tudo o que havia lutado para construir.
Apesar da vontade instintiva de ameaçá-lo, Zero compreendia o dilema de Kaien. Se não existiam memórias, os sentimentos estavam perdidos e confusos. Além disso, claro, havia o acontecido com o presidente da Associação. Antes que pudessem conversar, Kaien havia se reunido com alguns membros e Yagari numa longa discussão. E sabia que ele mesmo havia sido citado, bem como Kyou, após os caçadores analisarem toda a destruição causada no Colégio e arredores, calculando o quanto eles representavam uma ameaça.
O diretor não estava em uma boa situação ele mesmo naquele momento. Foi a presença de Momo para reforçar o desaparecimento de Kyou, Yuuki e Kaname que o havia deixado reflexivo e com aquela expressão por longos minutos. Claramente, nas horas que haviam se passado até então, a mais nova havia entrado num ritmo acelerado de sofrimento. E Zero definitivamente não estava com temperamento para ajudar em absolutamente nada nem com o diretor e, muito menos, para consolar a mais nova.  
Então guardava para si os próprios pensamentos que o sufocavam. Quando acordou depois do encontro com os Kurans, Momo estava ao seu lado, em desespero. Ele não sabia como ela havia chegado ali, mas Blood Rose estava jogada um pouco mais afastada de si. O punho se fechou com força, pela raiva, por não conseguir entender, ou pelos sentidos ainda turvos. Por ter perdido todo e qualquer rastro. Parando para pensar, todas as atitudes compulsivas que havia tomado haviam eliminado qualquer chance de chegar até Kyou. Ele não poderia se perdoar por isso.
E carregou essa culpa por muito tempo desde então.
                                                                         ⌘
Era bastante raro que o caçador se permitisse aquele tipo de reflexão. Que deixasse a mente vagar, mesmo que minimamente, sobre memórias que havia enterrado bem fundo na mente. O primeiro passo, depois dos primeiros esforços de todos em minimizar o caos instalado na Associação e no Colégio, com Ichiru e Momo, foi simplesmente retornar ao trabalho. É claro que fizera isso com o objetivo próprio de explorar cada vez mais distante em busca de qualquer pista que denunciasse o paradeiro dos Kurans e, logo, de Kyou.
Passar tanto tempo em caçadas o levou à segunda decisão mais importante desde tudo: Zero se mudou. Consequentemente, não houve solução a não ser levar os gêmeos consigo. Precisava estar mais próximo da cidade, da Associação e também de toda a ajuda que pudesse para Momo — fosse essa ajuda humana ou não.
Ele puxou o capuz da capa preta que lhe cobria boa parte do rosto para observar a fumaça escura que saia dos corpos queimando naquele beco. Embora odiasse o fedor que emanava, havia se mantido por perto para ter certeza de que nenhum curioso que vagasse pela madrugada por aquela parte da cidade, próximo às margens mais distantes do portuário, tentasse se aproximar para verificar o que poderia estar acontecendo. Com um suspiro, e percebendo que até mesmo os farrapos que cobriam os corpos haviam se desintegrado na fogueira improvisada, Zero suspirou devagar.
O caçador virou as costas, novamente puxando o manto preto por cima da cabeça e, conforme se afastou, passou por outras duas figuras que se mantinham imóveis na entrada do beco. Nenhum deles falou nada até que estivessem distante o suficiente e seguros dentro do quarto alugado para aquela ocasião. ❝ —– Vocês podem retornar para a Associação amanhã. Entreguem o relatório da missão.❞ A voz saiu baixa e rouca, talvez por ter passado parte do dia sem dizer uma palavra sequer.
❝ —– Quatro assassinatos de humanos, antes mesmo que você pudesse encontrar os vampiros responsáveis e eliminá-los. Parece que não estamos encontrando os rastros a tempo de impedir os ataques.❞ Os caçadores que o haviam acompanhado sabiam o plano de trás para frente e haviam discutido cada mínimo passo e distintas possibilidades ao longo do dia anterior. Ainda assim, não era a primeira vez que toda a cautela parecia em vão, apesar de ter encontrado os alvos da lista em todas elas, sempre parecia tarde demais. As ordens sempre chegavam tarde demais.
Zero também odiava missões em que não podia seguir sozinho, embora daquela vez… ele sabia que os outros dois haviam sido enviados por Kaien e Yagari para verificar sua situação.
❝ —– O que você fará agora?❞ O primeiro perguntou, fazendo Zero lhe direcionar um olhar cortante. Apesar disso, o segundo pigarreou baixo, se desencostando da parede ao lado da porta e direcionando o olhar uma vez antes de completar a frase dele: ❝ —– Por que não irá voltar conosco? Acho que já passou tempo o suficiente fora.❞. Uma semana inteira. A cabeça baixa do vampiro não permitiu que os dois vissem a expressão contida no olhar de Zero. Ainda não.
❝ —– Há coisas que ainda preciso resolver.❞ Um silêncio se instalou no recinto. E sem mais uma palavra, voltou ao próprio aposento. No fim das contas, o caçador conseguiria se virar sozinho, embora estivesse preocupado com o que pudesse estar ocorrendo enquanto estava tão distante.
Zero também sabia que, tempos atrás, Momo havia ido falar com ele tentando convencê-lo para que os irmãos mais novos pudessem acompanhá-lo e ajudá-lo. Obviamente era impossível dada as condições de ambos, mas ela conseguia ser tão teimosa quanto a irmã. Momo havia piorado consideravelmente e sua saúde parecia cada vez mais fragilizada. E Zero, em todas aquelas missões, tentava encontrar algo, qualquer coisa, que pudesse amenizar aquilo. Por meios legais, ou não. Pensava que se, em algum momento, chegaram a conhecer alguém como Nyx que tentou ajudar Kyou, poderiam existir mais pessoas como ele. Mais pessoas como… Ophelia.
Dias antes, havia tentado conversar com um comerciante, dentre os becos mais rebaixados do mercado local. Sem sucesso, pois a solução que supostamente ajudava pais caçadores do infortúnio de ter gêmeos, eram para encerrar uma vida antes do nascimento. Certamente não servia para a situação de Momo e Ichiru.
Zero ainda permaneceu um bom tempo olhando para as pouca luzes acessas nos cantos afastados do centro da cidade, uma cortina branca de renda esvoaçava com o vento que vinha de fora da pequena janela. A verdade é que havia recebido, mais cedo, uma carta de Kaien perguntando sobre como iam as buscas e a missão. Então, além do relatório usual, Zero descreveu um pequeno relatório sem muitos detalhes para o diretor, que seria enviado junto aos outros dois caçadores.
Em uma cidade a meio dia de distância de onde estava, rumores de ataques em massa circulava e amedrontava a população. Mas esse não era o fato suspeito, e sim a forma como corpos eram deixados em ruas escuras ou prédios abandonados — como se houvessem sido dilacerados por animais. E sem uma gota de sangue. Informações como aquela não eram tão comuns, mas nos últimos meses ainda pareciam ocorrer ocasionalmente, fazendo com que Kaien acreditasse que após o assassinato dos membros do Conselho, àqueles que eram a favor da matança de humanos haviam se rebelado.
Até então não havia identificado nenhum padrão, nos locais, ou nas pessoas escolhidas — coisa  que conseguiam verificar através de histórico de desaparecidos. Quando uma quantidade significativa de pessoas desapareciam, era sinal de que algum ataque estava próximo. O que os fazia quebrar a cabeça é que nunca ocorrida no lugar dos desaparecimentos. Zero suspirou, irritado.
Apesar de ser algo que o tirava do sério constantemente, se sentia, de certa forma, aliviado por ter tanto o qual se ocupar. O sumiço de Kyou havia transtornado seu temperamento e influenciado em tudo o que ocorreu depois. Era comum que estivesse em situações como aquela, mesmo na presença dos gêmeos mais novos, Zero não tinha muito o que compartilhar. Havia direcionado sua energia para as atividades da Associação, para o que era preciso, pois sentia que se não mantivesse a mente ocupado, seria puxado para aquele abismo novamente.
Mesmo sem rastros para seguir, Zero ainda tentou alcançar os Kurans. Retornou muito mais que horas depois, sem fôlego e sem forças de tanto correr. Na Academia, descobriu que não apenas uma pessoa, mas todos pareciam sequer saber da existência de Kyou. Não conseguiu informação alguma com quem quer que fosse. E ter apenas aquele rastro, apenas os fios como evidência da essência dela naquele lugar, era desesperador.
Zero passou a ter ataques durante a noite, sentindo minimamente a essência da ruiva próxima, para então descobrir que era apenas os fios que havia mantido por perto. Por isso, jogou as madeixas para queimar na lareira da sala do diretor tempos depois.
Buscar pistas sobre o paradeiro de Kyou fora da cidade, depois de algumas semanas, foi a primeira viagem que fizera. Mesmo com os contatos que havia buscado através de alguns caçadores conhecidos, suas primeiras tentativas não renderam nada. Mesmo quando passou a arriscar mais com as fontes, frequentar bares e casas noturnas sufocantes em busca de pessoas que sussurravam fofocas em troca de algum dinheiro… ainda assim, ou sequer sabiam da existência dos vampiros, ou preferiam morrer a revelar algo sobre àquela família. A única pista inútil é que estavam vivendo em uma mansão. Onde? Não sabia.
Foi durante aquele tempo que ouviu os primeiros sussurros sobre as mortes e massacres. E quando uma coisa se uniu a outra. Então Zero passou a caçar. Principalmente quando a última conversa com Yuuki lhe preenchia a mente. Ninguém poderia dizer que o grisalho sequer estava vivendo na mesma realidade. Ele planejava, investigava e caçava. Sem parar, sem dormir, sem se alimentar.
Se alimentar. O vampiro tinha sede.
Por meses depois, Zero teve pesadelos. Passou a tê-los no primeiro momento que conseguiu dormir, povoados pelos mais diversos cenários - reais ou não. Poderia ser um campo cheio de corpos, dentre eles, o de Kyou. Poderia ser a forma como ela o beijou e o tocou. Ou de como havia tentado atacá-la anos antes. Poderiam ser as memórias que ela havia compartilhado consigo. Poderiam ser memórias de cenas que jamais havia vivido.
Poderia ser a primeira vez que sujou as mãos com sangue humano, após descobrir sobre um homem envolvido com crimes realizados por vampiros, em que ele os ajudava encobrindo passos para não serem descobertos, sequestrando e sumindo com pessoas inocentes. Zero o observou por um tempo para entender seus movimentos e motivações. Apesar de tudo, não era de se surpreender que alguns humanos conseguissem ser tão monstruosos quantos os próprios vampiros — não quando se olhava nos cantos mais afastados da cidade, para onde ninguém prestava atenção durante a noite.
Até o dia em que encurralou o homem na saída de um daqueles bares noturnos, junto com dois outros que montavam sua guarda após uma negociação que rendeu a vida de duas jovens. Na madrugada, no silêncio, no escuro. O vampiro havia, pela primeira vez na existência miserável, mordido alguém até a morte. E o gosto era horrível.
Ele não sabia dizer quais daqueles pesadelos eram os piores. Mas o tempo e as buscas fracassadas pareciam alimentá-los. E haviam se passado meses. Àquele ponto, entretanto, sabia com mais clareza que Kyou estava viva. Ele apenas sentia e sabia. Mas tanto tempo depois e nenhum rastro, nenhuma notícia e o mundo parecia ter seguido normalmente. Mesmo que tivesse parado para ele.
Então, após tudo isso, Zero não tinha nada que pudesse fazer se não focar na solução dos casos que foram surgindo, enquanto buscava soluções para Momo e Ichiru. Levando-o para lugares cada vez mais distantes. Exceto àquela vez, não passava mais que dois ou três dias fora.
Com um suspiro, ele se obrigou a arrastar os pés até a cama, sentando-se após finalmente tirar a longa capa escura, o corpo se encostou nos travesseiros mas Zero não deitou, apenas apoiou a cabeça na cabeceira atrás de si e se permitiu algum descanso. Na manhã seguinte, partiria para a próxima cidade sozinho novamente.
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O vampiro mantinha as mãos no grosso sobretudo, parte da gola cobria o queixo e a boca, ocultando o ar frio que exalava. Na destra, Zero segurava firmemente a caixa que guardava o pequeno frasco de vidro, adquirido recentemente, os olhos fixos à frente em um caminho que conhecia muito bem.
Daquela vez, foi muito difícil tentar ignorar as lembranças do que havia feito, e Zero já havia desistido de lutar contra elas. Momo não precisava saber, Ichiru não precisava saber.
Quando Zero seguiu os rastros do humano que ajudava vampiros com contrabando e máfia da primeira vez, descobriu que se tratava de uma teia muito além do que poderia imaginar. Como sabia que, no momento em que reportasse, havia a possibilidade de Kaien mandá-lo voltar imediatamente, decidiu investigar por si mesmo mais um pouco. Havia encontrado não só alguém que poderia informá-lo de como funcionava todo o sistema, mas que, obviamente, era a pessoa mais invisível de toda a rede de mercado negro.
Ele soube que era arriscado, e antes de fazer qualquer coisa, se livrou dos próprios rastros, para que não fosse pego e denunciasse de onde vinha e para quem trabalhava. Também observou e planejou por dias, até a execução, descobrindo no meio do caminho outro nome que já estava na lista de execução. O que fazia total sentido.
E essa foi a segunda vez que Zero matou humanos, junto com o vampiro por trás. Não havia sido tão fácil quanto a primeira vez, uma vez que o caçador os atacou enquanto estavam juntos — cercados por seguranças. Mas foi também quando descobriu algo muito interessante no sangue do homem. Uma mistura que não poderia ser humana, levando-o a suspeitar de que algum vampiro trocava serviço ou informações por aquele… favor. Não sabia de onde vinha aquele sangue, não havia conseguido ir tão longe para descobrir se se era um ou mais vampiros que estavam envolvidos, mas não houve remorso daquela vez. Ele também levava consigo um pouco do sangue do homem, para que pudessem, de alguma forma, analisar.
Tanto tempo sem se alimentar havia tornado sua volta mais lenta, levando em consideração que havia sido ferido e, por pouco, escapado. Ele chegou nos limites da cidade que, de um lado, dava espaço para a estrada e a floresta que rodeava a Academia Cross, mas seguiu para o lado oposto, na cidade vizinha onde encontrava-se seu apartamento. Não era tão tarde, mas as ruas já estavam, em sua maioria, vazias, fazendo Zero preferir andar ainda mais discretamente pelas vielas menos iluminadas.
Não demorou muito para que escutasse, de longe, passos apressados e um choro infantil abafado. Zero rapidamente pulou para o terraço do prédio mais próximo, aproveitando as sombras para se esconder a tempo de ver um vampiro correndo com uma criança presa aos braços. Ele sacou a arma anti-vampiro e correu, acompanhando silenciosamente o homem, observando o caminho que ele fazia e se adiantando.
Levou apenas alguns segundos para que percorresse algumas quadras, ultrapassando ambos e identificando logo à frente o outro vampiro que os esperava. Quando pulou do terraço onde estava em direção ao vampiro que aguardava, Zero já havia disparado e encostado na parede novamente. Assim que o primeiro que carregava a pequena menina virou no beco onde estava e não viu o companheiro, xingou baixo. Ele ainda deu alguns passos quando parou de súbito, provavelmente sentindo o cheiro de Zero antes que ele se revelasse.  
❝ —– Deixe-a ir, e corra.❞ Com o maxilar trincado, viu as narinas do vampiro se dilatarem enquanto ele tentava identificar porque o grisalho tinha cheiro de vampiro e onde estava o outro a quem deveria estar esperando. O vampiro riu, dando um passo para trás enquanto a menina em seus braços se debatia ainda mais. ❝ —– Por que eu a deixaria para você?❞
❝ —– Para não acabar como seu parceiro.❞ Ele respondeu, deixando que a luz precária da lua que iluminava o beco atingisse BloodRose na destra. Novamente, o vampiro xingou baixo, largando a menina no chão e correndo em direção onde Zero ainda permanecia nas sombras. O caçador correu na direção oposta, escalando algumas escadas para cima do prédio atrás de ambos. E o vampiro não viu, mas havia enroscado alguns fios de Thanatos no percurso e bastou que o homem fizesse os mesmos caminhos para acabar em cinzas quando o grisalho os puxou de volta.
Não se deu tempo de esperar e retornou para onde a menina estava, pulando novamente da construção alguns passos de distância dela, que tremeu e encolheu ainda mais o corpo pequeno. Zero ajustou a postura, suspirando baixo quando a viu espiar entre as mãos que cobria o rosto. Ela estava apavorada — e pensar que por muito pouco…
❝ —– Você é incrivelmente corajosa.❞ Falou com a voz branda, sem se aproximar ainda, pois ela estava claramente com medo. ❝ —– Está tudo bem agora, o homem mau que queria te levar foi embora. Não se preocupe.❞ Ele tombou o rosto para o lado, estendendo a mão para ajudá-la, mas vendo ela se encolher ainda mais.
Zero se abaixou, apoiando-se em um joelho e inclinando mais o rosto para tentar encontrar o olhar da pequena. ❝ —– Hey. Sei que posso parecer assustador, mas prometo que não irei te machucar. ❞ Estendeu a mão novamente na direção dela. ❝ —– Vamos, vou te levar de volta para sua avó. Ela está preocupada.❞ À essa menção, finalmente ela se moveu, apoiando-se sozinha na parede para ficar de pé e, só então, estender a mão para o caçador. O corpo era tão pequeno e ela estava tão assustada, que Zero procurou ter todo o cuidado ao pegá-la no colo e voltar calmamente pelas ruas onde ainda conseguia ouvir a mulher aos prantos, exigindo solução de um policial. Assim que virou a esquina onde conseguia vê-los, Zero pôs a pequena no chão. ❝ —– Vá, você está segura agora.❞ Ela se voltou para ele, segurando no tecido do casaco e lhe oferecendo um pequeno sorriso antes de sair correndo. Zero não esperou ser visto e saiu do local o mais rápido possível.
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Zero subiu as escadas do prédio onde morava em direção ao tão esperado descanso. Pensar que um ataque havia acontecido tão ocasionalmente no bairro o havia irritado o suficiente pela noite. Apenas uma criança. E se levasse em consideração todas as pessoas que não havia conseguido salvar a tempo…
No entanto, assim que entrou no corredor, ele suspirou fundo. O dia estava sendo longo demais. Os passos pesados seguiram firmes até que chegasse a metade do caminho para a entrada do apartamento. Ele sentiu uma presença vampírica dentro do cômodo que permanecia em total silêncio, ao tempo que também conseguia sentir os gêmeos lá dentro, embora nenhum cheiro de sangue. Os passos cessaram quando Zero socou a parede ao lado, fazendo pedaços de entulho voar por todos os lados ao passo que sacava e apontava Blood Rose para o alvo do outro lado.
❝ —– D-d-desculpa!❞ Kaien ergueu ambas as mãos em total desespero, olhando-o incrédulo. ❝ —– Não sabia que você ainda não tinha chegado quando vim e, Zero, se você não for mais cuidadoso vai colocar o prédio abaixo. Essa construção é bem antiga e, por isso, seja gentil, sim?❞ Como usualmente, o diretor não parou de falar coisas sem sentido. O caçador abaixou a arma e deu a volta até entrar no apartamento para olhá-lo de frente. Momo já estava parada em frente a porta com o rosto vermelho em fúria e as mãos fechadas em punhos. ❝ —– O que… Por que?!❞
❝ —– Sua aura… é horrível de distinguir porque algumas vezes se parece um pouco com a dos vampiros.❞ Ele uniu as sobrancelhas em direção ao mais velho. Estava aliviado que não era um vampiro mas, mesmo assim, o olhar percorreu rapidamente por Momo para checar se estava tudo bem.  
❝ —– Z-zero!❞ Momo foi devagar até onde agora havia uma cratera na parede, podendo ver perfeitamente o corredor do outro lado. A mais nova olhou para trás, na direção onde Ichiru estava parado em frente ao quarto de ambos, não parecendo nenhum pouco abalado ou surpreso. De onde estava, Kaien suspirou alto, fazendo um gesto com a mão e sorrindo para que a mais nova não se importasse com aquele comportamento.
❝ —– O que está fazendo aqui, afinal? Achei que a Associação e mais um tanto de pessoas estavam atrás de você, e que você estava completamente sem saídas.❞ Ele passou pela mais nova, encostando a mão no topo da cabeça dela em cumprimento no meio do caminho. Obviamente a ruiva não amenizou o olhar que o fuzilava, furiosa pela destruição no apartamento. Zero foi até o próprio quarto, se jogando sentado na cama e levando as mãos para apoiar o rosto.
Estava cansado. Estava faminto.
❝ —– Resumindo, minha sentença foi adiada. E pelo que me disseram, parece que será decidida baseado em como as coisas vão terminar. Você sabe Zero…❞ Kaien o olhou de esguelha da entrada do quarto, indo em direção a janela mais próxima e afastando a cortina. ❝ —– … muitas coisas acabaram mudando nesses meses. E muitas ainda irão mudar… Mas❞ Zero sentiu o olhar dele sobre si novamente. ❝ —– Sobre o dormitório… vocês não voltarão a viver lá?❞ Ele sabia que aquilo era preocupação, assim como sabia que, apesar de estar afastado, o diretor preferiria manter os olhos nos gêmeos mais de perto. Principalmente Momo.
❝ —– Sempre que puder, irei à escola durante o dia e, pela noite, irei a missões para caçar vampiros, como a Associação deseja. Em troca disso, ganhei a liberdade de viver aqui. É melhor para nós. Além disso, não quero ficar no dormitório…❞ Zero levantou o rosto, fitando Kaien diretamente. ❝ —– Minha sede…você sabe que isso pode se tornar incontrolável. Por mais especial que… o sangue de Kyou seja, são 8 meses…❞ De alguma forma, não tinha problema em admitir aquilo para o diretor, mas a voz se manteve baixa devido a presença dos gêmeos no cômodo ao lado. Não gostava da ideia de esconder coisas, mas não precisavam adicionar aquilo a lista de preocupações. Além disso… ❝ —– Se eu não passar minhas noites caçando vampiros… ou pistas… não sei o que poderia acabar fazendo…❞ Ele pressionou as têmporas, desviando o olhar para o chão. ❝ —– Por que não posso matá-los quando quiser? Assim não há o bastante para…❞ Ele já sabia a resposta, não era uma pergunta genuína. Mas ainda assim.
❝ —– Zero, as listas de execução existem exatamente para não nos tornamos um bando de assassinos que caçam vampiros ao acaso.❞ Ao acaso. Mesmo depois de tudo o que havia visto, das pessoas que haviam morrido, daquela criança que quase teve o mesmo destino… Como matar vampiros poderia ser algo ao acaso? ❝ —– Na verdade, eu já esperava sua chegada alguns dias atrás, devido ao tempo previsto para a última missão. O que aconteceu?❞
❝ —– Alguns humanos estão agindo em conjunto com vampiros para desaparecer com pessoas. Eu encontrei alguns deles e sabia que estavam trabalhando para alguém mas… não consegui fazê-los dizerem mais nada.❞ Ele passou a mão pelo rosto mais uma vez. ❝ —– A caminho daqui dois outros vampiros haviam tentado sequestrar uma criança humana.❞
❝ —– Kiryuu-kun, não me diga que por não haver matança o bastante para te satisfazer, ou encontrar algo sobre o paradeiro da Kyou que você tanto procura… você foi e…❞ Será que ele não estava ouvindo?
❝ —– Não se preocupe diretor, eu não perdi o controle. Os dois vampiros desta noite já estavam na lista e quanto a missão… preciso que você ouça o report primeiro. As buscas não foram infundadas também.❞ Zero fitou o caçador, sustentando o olhar que era direcionado a si.
❝ —– As buscas… por falar nisso, sei que você utiliza dessas oportunidades para procurar por ela, mas, Kiryuu-kun, até quando pretende ir atrás de becos sem saída?❞ O grisalho odiava quando Kaien utilizava aquele tom de voz com pesar quando entravam naquele assunto em específico. Apesar de nunca insistir para falar sobre, o diretor sempre se mantinha contido. E apesar de não admitir, Zero sabia que, muito provavelmente, ele também entendia que se Kaname não queria ser encontrado…
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❝ —– Até encontrá-los.❞  Ele levou a destra até o bolso do sobretudo, tirando de lá uma pequena caixa com as pastilhas para vampiros dentro. Todo o conteúdo foi prontamente despejado na boca do caçador enquanto ouvia Kaien resmungar desculpas, pois estava a tempos sem vê-lo e isso acabava deixando-o preocupado.
❝ —– Desde quando você começou a engolir tabletes de sangue em quantidades como essa?❞ Desde que havia matado o primeiro humano. O vampiro grisalho fechou novamente a caixa e a jogou ao lado. ❝ —– Desde que voltei a sentir sede.❞ Pontuou. Ter Momo e Ichiru por perto também não ajudava, eventualmente.  
❝ —– Eu sei que todos vocês estiveram muito ocupados nesses meses que se seguiram a tudo, depois do Conselho ter sido eliminado. Todas as confusões que os vampiros que saíram de controle causaram. Estão causando, na verdade. Mas prefiro que você me conte o que aconteceu amanhã, na Associação.❞ O mais velho suspirou levemente antes de continuar:  ❝ —– Por enquanto, Zero-kun, preciso lhe dizer que o Kaname-kun nos contactou.❞ Aquela informação o pegou de surpresa e Zero não escondeu a reação quando fitou o mais velho. O diretor parecia, automaticamente, ter assumido uma postura mais séria quando continuou: ❝ —– Ele quer restabelecer uma ordem com a Associação com propósitos de coexistência. Pelo que parece, ele esteve trabalhando bastante nas sombras para deixar a atual sociedade dos vampiros novamente sob controle. E agora que todos os preparativos foram feitos, ele pediu para falar diretamente com a recém estruturada Associação… como o representante da raça dos vampiros.❞ Não havia como mentir, Zero não poderia ter ficado mais impactado. A cabeça abaixou ao tempo que uniu as mãos apertando os dedos uns nos outros. Zero tentou controlar a respiração.
❝ —– E você realmente… espera que eu acredite nele, apenas com isso? Como os caçadores podem saber que ele não está se preparando para fazer uma declaração de guerra nesse momento?❞
O presidente da Associação pareceu refletir por alguns segundos. ❝ —– Hm. Eu pensei, por um momento, que você diria algo relacionado a matar o Kuran-kun caso ele aparecesse ao ar livre.❞ Zero suspirou, teria rido daquela declaração pois era exatamente algo que ele falaria e faria. No entanto, o Kuran era o único com informações valiosas demais. Ele era quem havia sumido sem rastro algum por oito meses.
❝ —– Não, ainda não. Mesmo agora, mesmo com toda a confusão existente, precisamos que os sanguessugas se comportem. E… se para isso… precisarmos dele vivo, então por enquanto…❞ Ele encarou os próprios dedos, a força que exercia enquanto limpava os pensamentos. De fato, Kaname ainda tinha influência sobre o mundo vampírico, apesar do que havia acontecido e, também, havia Kyou. Zero não sabia o que havia acontecido, onde ela estava. Se estava bem. Se estava presa. Se partiu… por opção.
❝ —– Se você se sente mesmo assim, então… Sua posição será diferente daqui para frente, Kiryuu-kun.❞ Kaien deslizou a ponta dos dedos sobre as rachaduras que se formaram na janela. Ele não tinha dúvidas quanto ao que vinha visualizando para a jornada de Zero. Sabia que ele tinha os próprios interesses naquelas palavras, mas, ainda assim, não havia duvidado um minuto do caçador e do que planejava para ele no futuro. ❝ —– Vim trazer novas ordens para você, da Associação.❞
❝ —– Não sem antes pararmos e jantarmos. Zero-nii mal chegou e você já está trazendo trabalho novamente. Ele não pára mais em casa!❞ Momo reapareceu na entrada do recinto, uma das mãos na cintura enquanto a outra era usada para se apoiar na parede. Aquela era uma visão bem comum de Momo em seus melhores dias.
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Claro que a ordem havia sido fazê-lo participar da reunião. Zero não protestou, nem mesmo uma palavra. Nem mesmo quando Kaien completou dizendo que aquela seria uma introdução oficial à sociedade dos vampiros de que, devido a suas habilidades, ele provavelmente se tornaria o presidente da Associação no futuro.
Com aquilo ainda em mente, Zero foi até o escritório do presidente na Associação, acabando por encontrá-lo conversando com Yagari fervorosamente. A princípio não deu muita atenção e logo apoiou os dois frascos de sangue que havia carregado consigo durante a viagem de volta em cima da mesa em frente a Yagari.
❝ —– O que…❞ O antigo mestre se aproximou dos recipientes, pegando um dos frascos com a mão para analisar o espesso líquido vermelho dentro.
❝ —– Um deles encontrei sob o pertence de um mercador nos confins de uma cidade. Aparentemente um mercado negro, embora tão raro que é tratado como lenda, que está contrabandeando esse sangue sob consentimento de algum vampiro. E o outro, é o sangue de um humano, que também contém sangue de vampiro.❞ Zero então explicou como havia acontecido as capturas, e tudo o que fez para descobrir como aquele comércio estava conectado, acabando, por fim, num beco sem saída quando não conseguiu arrancar mais informações do último homem.
❝ —– Aqui, foi onde ouvi sobre o primeiro caso.❞ Zero apontou no mapa que estendeu sobre a mesa do diretor. Ele seguiu com o dedo para cima até um outro nome, depois outro e outro, indicando mais três cidades.  ❝ —– Essas foram as cidades que investiguei depois, até que esses informantes me levaram para essa cidade, Brielle.❞ Zero olhou para Kaien, enfatizando o fato de que, aquela cidade, ficava bem ao centro das outras três que havia indicado. O caminho não formava um triângulo perfeito, mas o acesso dela para as outras era facilitado por estradas pouco utilizadas. Manter um tráfico ativo entre os comércios não parecia tão complicado depois que Zero chegou a toda aquela conclusão. ❝ —– É a maior de todas e, apesar de ser a mais isolada, o submundo do comércio por lá é mais próspero.❞ Ele suspirou, se afastando um passo para analisar o mapa de longe novamente.
❝ —– Isso torna a circulação mais fácil pelo mesmo motivo, embora ainda mais engenhosa e… sigilosa.❞ O diretor completou e ele concordou, suspirando.
Ele se lembrava bem, a fim de conseguir investigar o que acontecia por trás da possível venda ou troca daquele sangue e da trilha de crimes cometidos por humanos com vampiros, Zero precisou ser muito mais cauteloso. Após matar o primeiro mercador, os ventos passaram a carregar a notícia de um lobo branco que, aparentemente, estava se metendo nos negócios. Pelas características, o vampiro não pode arriscar. Então, cortou o cabelo novamente, e acabou tingindo os fios com uma tinta negra que até saiu depois de algumas lavadas. Também havia arranjado uma pasta no seu tom de pele para cobrir a tatuagem evidente no pescoço.
❝ —– Mas ainda me pergunto como essa rede é mantida sem que a Associação saiba. Ou, ainda, o quanto dos esforços de Kaname Kuran estavam direcionados para acabar com isso.❞ Zero refletiu em voz alta. Ele mesmo só descobriu por mero acaso, enquanto buscava informações sobre o paradeiro de Kyou ao mesmo tempo que buscava soluções para Ichiru e Momo. Muito ao acaso.
❝ —– E todas essas ações completamente fora das ordens as quais recebeu inicialmente e, além disso, sem envio de reports.❞ Yagari foi o próximo a se pronunciar, fazendo Zero fitá-lo. Não iria se desculpar por aquilo, não era seguro que enviasse as informações por qualquer meio que fosse. Também não poderia perder tais pistas. Mas, ainda assim, o grisalho acenou para o mestre.
❝ —– Inicialmente, imaginei que… que talvez pudesse descobrir mais a respeito desse sangue. Sei que Momo e Ichiru jamais aprovariam, mas, se o sangue de… Shizuka os manteve vivos e fortes antes, imaginei que o sangue de outro vampiro puro-sangue pudesse fazer o mesmo.❞ Ele admitiu baixo. Parecia algo absurdo agora que ele mesmo externava. Mas eram suas últimas opções. Zero estava esgotado e sem saída.
❝ —– Isso é estúpido, Zero!❞ O caçador declarou com o tom de voz irritado, ao passo que Kaien apenas o observou em silêncio.
❝ —– Exatamente por isso os trouxe para cá, e não fiz nada idiota.❞ Suspirou pesadamente. ❝ —– De qualquer forma, acredito que isso deva ser tratado com cautela durante as negociações. Não sabemos o quanto Kaname está envolvido nisso. O quanto os vampiros… nobres… estão envolvidos nisso.❞
❝ —– Sim. Devemos manter essa informação por enquanto.❞ Kaien levou a canhota a ajustar os óculos no rosto e pigarreou. ❝ —– Zero, sei que você é independente, mas da próxima vez, tente não despistar os caçadores para fazer investigações por conta própria.❞
Após alguns segundos de silêncio, Yagari tamborilou a ponta dos dedos na mesa à frente de onde estava sentado. ❝ —– Bem, falando nas negociações. Sobre o baile, precisamos que mantenha o controle sobre-❞
❝ —– Baile?❞ Zero olhou irritado para ambos. Um baile? Desde quando a reunião havia tomado aquelas proporções? E entre a Associação e os vampiros? ❝ —– O que diabos vocês estão pensando?❞
Kaien audivelmente se sentou na própria cadeira, suspirando pesado em derrota. ❝ —– Não era bem assim que planejei te contar…❞ Ele gesticulou com a mão para uma grossa lista, com capa vermelha logo na mesa ao lado, o qual Zero encarou por um tempo. ❝ —– O propósito para ambos os lados é socializar, reforçando a ideia de que continuaremos trabalhando juntos pela paz.❞
❝ —– Ou ao menos é o que foi oficialmente declarado.❞ Completou Yagari, nenhum pouco mais feliz que o próprio grisalho. ❝ —– Os vampiros que tinham posição de poder na sociedade anterior também participarão dessa reunião. E toda a parte nobre também se fará presente. É uma forma de reforçar as decisões que forem tomadas e um símbolo de poder para a ascensão dos Kurans sobre eles.❞ O caçador mais velho o observou por um tempo, analisando as reações de Zero que se manteve quieto. Toda aquela demonstração de poder parecia ser não somente para a sociedade dos vampiros e ambos sabiam bem disso também.
❝ —– De qualquer forma, essa é a lista dos vampiros que estarão no baile. Grifados, os que estarão na reunião. Memorize todos e cuide da fiscalização disso durante a noite Zero. Espero que possamos contar com você.❞
Zero segurou o bloco de papel, apertando entre os dedos enquanto tentava não fazer o coração acelerar ou as mãos tremerem por imaginar o que encontraria anotado ali. Mas não foi preciso que folheasse sequer uma página, antes que Kaien continuasse. ❝ —– Além disso, Kaname-kun pediu para avisá-lo… que Kyou estará lá também Zero.❞ A testa do diretor estava enrugada, claramente preocupado com o que aquela sentença poderia implicar. Zero permaneceu estático, como se houvesse parado de respirar.
Não sabia o que sentir.
Mesmo oito meses depois, nada pareceu alterar a perda da memória relacionada à Kyou por parte de qualquer um na Academia. Também não conversaram muito sobre isso além das informações que Zero trocou sobre todos os acontecimentos que envolveram a destruição da propriedade naquela época. O grisalho não reuniu forças para compartilhar muito mais coisas que isso e, por esse motivo, tudo o que Kaien e Yagari sabiam é que ele buscava incessantemente por Kyou - sempre que podia. ❝ —– Apesar do que aconteceu, Zero, acredito que você não é do tipo que quebraria as regras da Associação dos caçadores e colocaria toda essa missão em risco por motivo algum.❞
❝ —– Sim. ❞  O tom havia sido mais seco do que esperava.  ❝ —– Sim você está certo.❞ E assumindo que as informações haviam acabado por ali, Zero finalmente se retirou. Apesar de tudo, apesar da cabeça cheia, foi até a biblioteca da Associação, até os últimos corredores e últimas mesas, apoiou as mãos em punhos em cima da escrivaninha mais próxima em decadência e respirou. Ele arremessou o livro que estava ao seu lado na parede mais distante, levando as mãos aos cabelos em seguida, apoiando-as na nuca. Era difícil respirar. Era difícil aceitar que, mesmo após tantos esforços sem nenhuma pista sequer, nenhum rastro, eles apareceriam apenas pelo querer de Kuran Kaname.
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Ele respirou fundo mais uma vez, de forma sutil. Havia acabado de chegar aos salões em companhia de todos os caçadores — incluindo Kaito. Zero ainda se sentia confuso sobre a repentina aparição daquele que fora seu companheiro de treinamento durante grande parte da adolescência deles. Havia visto o mais velho nos corredores do Colégio no dia anterior, enquanto caminhava para a sala do diretor que o havia chamado por meio de Wakaba.  
Todo o encontro fora extremamente estranho e Kaien havia lhe dado a curta explicação de que ele fora contratado como professor pela insistência de Yagari, no intuito de ajudar com a nova organização do sistema — seja da Academia ou da Associação. Ele não perguntou mais.  
De qualquer forma, o antigo parceiro ajudou Zero na certificação de que todos os caçadores que manteriam os turnos estivessem posicionados em seus devidos lugares, inclusive aqueles que estariam ali de forma casual. Também bastou apenas alguns olhares para que identificasse no salão os nobres da lista infernal que havia sido designada para si.
Ele fez rápidas anotações mentais sobre cada um, mas logo se juntou aos outros caçadores de alta hierarquia poucos momentos depois deles utilizarem o tempo para a socialização, unindo-se para o infinito caminho até a sala reservada para a reunião.
É claro que, mesmo após se acomodarem, Kaname demorou mais alguns minutos para chegar, e o caçador, que tinha os olhos fixos na porta sem ao menos piscar, manteve a respiração exatamente controlada quando ele irrompeu, pelas grandes portas duplas do recinto. As mãos estavam cruzadas às costas, enquanto Zero obedientemente estava posicionado de pé ao lado direito de Kaien.
Zero era uma máscara inexpressiva.
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                                                                                  ( ❀ ashes ) 
     ❛ Tem certeza de que vai ficar bem? ❜ Um suspiro prolongado, enquanto as mãos trabalhavam avidamente para acertar os últimos detalhes. Ruka ajustou o tecido do longo vestido negro uma última vez, certificando-se de que não haveria sequer uma única dobra dentre os paralelos que moldavam a costura. Escovou as madeixas avermelhadas, ajeitou a franja que recaia nos olhos da outra com as pontas dos dedos e mesmo quando se afastou minimamente para visualizar melhor sua pequena obra de arte não obteve uma resposta.
     Kyou respirou profundamente, as pálpebras se abrindo lentamente, apenas para revelar os orbes do mais profundo carmesim, que imediatamente se fixaram na Nobre. Moveu-se no lugar onde estava, movimentando os braços e checando a veste que fora proposta para si. Certamente não era uma vestimenta do qual estava habituada, mas teria de se adaptar, era algo que faria parte de si com muito mais frequência dali em diante. Não podia negar que era intrigante, sentir-se como se fizesse parte da mais significativa realeza… E apreciava o cuidado que Ruka tinha em ajudá-la e organizar um conjunto que não fosse tão extravagante e nem mesmo desconfortável; e a forma como as cores escuras contrastavam o vermelho de suas enormes madeixas lhe trazia uma sensação incomum… Ficaria bem.
     Ainda que Kyou não tivesse dado uma resposta audível, Ruka entendeu tudo quando notou um sorriso quase imperceptível se moldando nos lábios alheios e seu coração se aqueceu de forma a transparecer em seu rosto corado. Havia sido um ano quase interminável, meses extensos que não pareciam se esforçar minimamente para findar aquele ciclo; e se era capaz de senti-los tão vividamente, não conseguia sequer imaginar em como tudo havia sido para a Purosangue. Tinha consciência do próprio amadurecimento, abandonar os sentimentos constantes por Kaname, a reestruturação do Conselho, e, principalmente, a árdua tarefa de reeducar duas Purosangues que haviam renascido com tantos problemas que era incapaz de mensurar.
     Ciclos se sucederam como fases da lua para Kyou e Ruka sentia como se o satélite realmente tivesse algum tipo de influência sobre a outra. Yuuki pareceu estagnada de início, porém evoluiu rápido, de sua própria maneira, talvez mais por influência de Kaname do que sua própria ou de qualquer outro presente na Mansão. Kyou havia mudado a si mesma em muitos sentidos, as conexões que se estabeleceram, os sentimentos intensos que ela era capaz de transmitir por possuir aquela humanidade tão excêntrica para si… Afeto, estava tão cativada por aquela pequena figura de forma maternal. Ruka repousou as costas da mão em uma das bochechas de Kyou, que tombou o rosto para o lado, se confortando ali, enquanto a mente vagava um pouco longe.
                                                                                    ( ❀ death )
     Teria sido mais doloroso se ainda estivesse em sua forma primária… Mas o corpo puramente vampírico não seria afetado por uma simples queda. Ainda assim todos os músculos contraíram ao entrar em contato com o chão gélido, a dor excruciante que a queimava de dentro para fora ligada muito mais ao fato de ter recuperado a consciência. Lágrimas trilhavam lentamente caminhos alternados pelo rosto alvo, o pranto se delimitando a um soluço baixo e nada mais. Kyou precisou apoiar as mãos no móvel mais próximo de si para conseguir se erguer e trincou os dentes quando se viu incapaz de reconhecer o lugar onde estava.
     Aos poucos e com muito esforço se lembrou de como havia perdido a consciência nos braços de Kaname e posteriormente a sensação de ter sido restringida a um espaço mínimo, incapaz de distinguir com clareza o que havia acontecido, mas certa de seu destino final… Estava longe do Colégio Cross, estava longe de tudo… Estava longe de Zero.
     Somente a luz provinda de um candelabro iluminava o lugar o suficiente para a Purosangue reconhecesse o recinto como um quarto grande e luxuoso, muito fora da realidade onde se habituou a viver… Mas não lhe era estranho, estava familiarizada com cada cômoda bem disposta, cada detalhe cuidadosamente pensado. Se permitiu vagar por ali, explorando o que era possível e não se surpreender por não encontrar nada de incomum. Ao se esforçar consideravelmente, foi capaz de reconhecer algumas presenças e quatro delas pareciam trilhar caminho a seu quarto pela forma como se aproximavam, sobrepujando a própria aura em ascensão.
     Fora Ruka quem girou a maçaneta, se deparando com Kyou encolhida próxima a cabeceira da cama. A Nobre não teve qualquer reação significativa, desde que bloqueou pensamentos desnecessários naquele instante, adentrando e deixando espaço suficiente para que os demais entrassem também. O primeiro a se estabelecer fora Kaname, seguido por Seiren e Akatsuki, os quatro assumindo suas respectivas posições, obviamente planejadas antes mesmo de chegarem até ali.
     Seiren foi quem se sentou inicialmente na beirada da cama, esticando os braços na direção de Kyou que se encolheu ainda mais, trêmula, os soluços se intensificando de uma forma que não podia ser contida. A Nobre notou que apesar do medo, não havia qualquer repulsa em relação a si e por isso procedeu. Ao alcançar e tocar a pele da Purosangue, algumas marcas remanescentes surgiram sobre a pele de Kyou que as reconheceu quase de imediato.
     Kaname puxou Seiren para que se afastasse, quando Kyou sentiu um grito gutural arranhar-lhe a garganta, se remexendo na cama. As marcas reluziam negras e os orbes brilharam escarlate, o vermelho das curtas mechas de cabelo acompanhando o mesmo tom de seus olhos. Mesmo com o corpo contraindo e a intensa sensação de que estava derretendo de dentro para fora, seus movimentos eram limitados por uma força maior, a impedindo de cair da cama. A visão tornou-se turva, as garras crescendo exponencialmente e por mais que tenha tido a intenção de conter-se, não conseguiu. Ela sentiu toda transmutação de seu corpo, a energia de sua essência transbordando sem qualquer controle e não havia nada em que pudesse se agarrar para não cair… No abismo que se tornou sua consciência trágica e a única sensação que restara antes de se perder completamente fora a sede… E a animalesca necessidade de caçar, não só para saciar a sede, mas para corresponder às expectativas de seus instintos mais primitivos.
     Subitamente tudo cessou, sendo possível ouvir somente o baque de corpos se chocando contra o chão, sendo Kaname o único a restar consciente e de pé. Tudo que era constituído essencialmente de forma, assim como o corpo de Kyou, se perdera, sendo substituídos por uma composição sobrenaturalmente sombria; a matéria primordialmente negra em seu núcleo carregava uma cor intensamente avermelhada nas bordas. O espaço onde o corpo de Kyou jazia voltou a tomar uma forma aparentemente humanoide somente depois de um tempo e ainda que sua estrutura fosse bastante semelhante a original haviam muitos aspectos que Kaname era capaz de distinguir como novos. Dos ombros para baixo, ainda que tivesse forma, o corpo da Purosangue se resumia a algo etéreo e sombrio, mas seu rosto voltara sem nenhuma anormalidade… Se não fosse o sorriso repleto de malícia em seus lábios. Os cabelos, grandes e volumosos se espalharam pelo ar e era possível para Kaname afirmar que agora estavam maiores que seu próprio corpo. Ela permaneceu estática no lugar onde estava, apenas observando o Ancestral com uma curiosidade quase infantil.
     ❛ Durante todos esse tempo… Nunca imaginei que eu pudesse voltar a ver essa forma abominável diante de meus olhos, uma das muitas essências do poder dele… ❜ Kaname se aproximou calmamente, guiando as mãos para que tocassem ambos os lados do rosto de Kyou delicadamente. Em resposta ao toque dele, ela se aproximou e Kaname respirou fundo, acreditando ter sido capaz de desviá-la de sua função primária… Lidar com os corpos de seus companheiros no chão, desde que a energia que emanava da ruiva os havia sobrepujado. ❛ Me diga… Como se sente? ❜ Mesmo ansiando por uma resposta, o Purosangue não se viu no privilégio de receber algo além de uma risada baixa, que sequer sabia de onde se originava, dos lábios da criatura ou de qualquer outro ponto dentro do espaço que a mesma havia criado.
    O Kuran se lembrou da origem de tudo, do motivo pelo qual tal forma ter sido rejeitada, desde que fora capaz de estabelecer um consenso entre aqueles de sua raça de que aquela existência não acompanhava a evolução da criação. Um Purosangue era incapaz de desejar algo além de sangue e poder e por isso era preciso abrir mão de uma determinada quantidade de poder para se tornar somente um Ancestral, igualmente forte, mas racional. ❛ Você é o motivo pelo qual perdemos tantas vidas em uma guerra sem qualquer sentido… Conde. ❜ O vampiro fechou os olhos, deixando que a própria essência fluísse através do corpo numa tentativa de conter o poder esmagador que Kyou pressionava contra si. ❛ Mas é injusto que seus filhos sejam responsabilizados por sua teimosia… ❜ E isto era o que o motivava a não findar a vida de Kyou naquele exato instante... E o fato de que não conseguia mensurar as consequências de tal ato, ainda não...
     O Purosangue se afastou, deixando a forma etérea confusa e ainda inerte onde estava. O braço direito se estendeu na direção donde a porta do quarto se encontrava anteriormente, vendo a figura de um corvo se materializar e repousar nas costas de sua destra. A Ave não pareceu se agitar e apenas se focou numa direção aleatória, antes de desvanecer. ❛ Abra seus olhos, Kyou… ❜ Os olhos escarlates de Kyou se arregalaram em choque, o rosto se contorcendo enquanto pontos esbranquiçados começavam a assumir forma em meio a matéria negra, até que olhos se revelassem de todas as direções. As pupilas dilataram, tremulando frenéticas, como se avistassem algo verdadeiramente assustador. O grito que ecoou desta vez possuía mais do que uma única entonação de voz que lamentava em coro e o corpo se contraiu em torno do próprio eixo, deixando o que parecia ser sangue fluir dos olhos como lágrimas.  
     ❛ Se não for capaz de lutar contra seu próprio sangue nunca mais irá vê-lo. ❜ Com isto, o Kuran recolheu os corpos e se retirou do quarto, abandonando sua amiga de infância que seria eliminado por suas próprias mãos caso não fosse capaz de retornar a si.
                                                                                  ( ❀ dream )
               ( Sangue… Sangue… Tudo pertence à você… Então consuma tudo… )
     Bastou um impulso para o corpo se erguer, a destra cobrindo o rosto enquanto a canhota se apoiava na cama abaixo de si. O corpo gélido tremulava em resposta ao sangue que corria rápido por suas veias, despertando-a de um sono quase profundo. Um murmúrio baixo e Kyou curvou o dorso para frente, deixando a cabeça pender, fitando o próprio colo. A canhota percorreu por debaixo do travesseiro, retirando um pequeno recipiente repleto de pastilhas dali. Com os olhos incandescentes, Kyou virou todo conteúdo, sem se preocupar com a quantidade que ingeria, no fim não fazia diferença, nunca era o suficiente. A cabeça afundou no travesseiro e por um tempo ela fitou o teto, aquela voz que ecoava em sua mente todas as noites era mais inconveniente que os pesadelos de quando era humana.
     Vagarosamente a destra repousou sobre a barriga, trilhando um caminho cuidadoso até o próprio pescoço, onde Kyou pressionou com força suficiente para perfurar a pele com as unhas. O cheiro do próprio sangue deixava a visão turva, seus sentidos entorpecidos se tornarão tão apurados que era capaz de distinguir o próprio sangue… O sangue que consumia tudo sem deixar qualquer vestígio, mas que ao mesmo tempo nunca eliminava a essência de Zero, sua presença permanecia. Depois de se infligir dor o suficiente para acalmar o que havia dentro de si, Kyou deslizava a língua entre os dedos, absorvendo o próprio sangue de volta. Por se recusar a tomar o sangue de qualquer um ali de forma continua, somente quando se aproximada do estado mais crítico possível e então recorria a Ruka, precisava fazer desta prática quase um ritual todas as noites; não saciava sua sede da forma correta, mas servia como distração, contanto que poupasse da própria energia, sentia que era capaz de aguentar por mais tempo, mesmo que seus impulsos se intensificassem toda noite. Os orbes vermelhos fitaram a imensidão da noite através da janela e as mãos repousaram sobre a barriga.
 Sentia-se solitária, ainda que evitasse esse tipo de sentimento com os demais, Kyou passou a ponderar consigo mesma nos raros momentos em que se encontrava sozinha. Tinha deveres a cumprir, conhecimento a adquirir, tudo perfeitamente disciplinado e programado; mesmo rodeada de presenças familiares o tempo todo, nada possuía um único resquício do calor que tanto amava. O aroma da comida de Kaien, os pulos de Yuuki pela cozinha, os gêmeos extremamente tímidos ao sentarem-se na mesa, buscando conforto no olhar que transmitiam um para o outro. A agitação da Day Class pelos corredores, os resmungos de Tomoya, dos quais dificilmente prestava atenção, pois sabia que com a chegada de Rea aquela carranca logo desapareceria… Mesmo depois de recobrar tantas memórias não havia nada que sentisse mais falta do que o Colégio Cross… Sua vida meramente humana, havia se apegado tanto a ela.
          E ainda havia… Ele.
  Cansada das lembranças que se acumulavam aos montes, apenas para atormentá-la com o vislumbre de algo que não poderia ter, a Purosangue se moveu. A coberta fora retirada de cima do próprio corpo e Kyou sentou-se na beirada da cama, deixando as pernas recaírem e a ponta dos pés tocarem o chão. Assim que a sensação gélida se contrapôs a pele quente, os dentes trincaram, os olhos se fechando apenas para buscar uma concentração maior. O corpo pulou em um espasmo repentino e, gradativamente, era como se dedos repousassem sobre sua pele, um par de mãos agarrando-lhe os ombros e a puxando delicadamente para trás. Ao abrir novamente os orbes vermelhos, se viu deitada, mesmo que de forma desengonçada…  E não era o teto quem se colocava em seu campo de visão, mas sim um enorme par de olhos em tom lavanda, cujo brilho acelerava o ritmo de seu coração assustadoramente.
  ❛ Zero? ❜ Questionou confusa, mas o outro apenas repousou o dedo indicador sobre os lábios em resposta, como se pedisse por silêncio; e com isso, Kyou não pronunciou mais nenhuma única palavra sequer. Os olhos se fecharam, uma vez mais, enquanto sentia as mãos alheias afagarem seu rosto, acabando por corar, remexendo-se minimamente no lugar onde estava, buscando ainda mais daquele contato ao mover a face na direção da palma alheia. A medida que os dedos deslizavam para baixo, Kyou grunhiu, lacrimejando em antecipação, juntamente com a respiração que se descompassou. A sensação que transcorria a espinha fazia as costas arquearem e diante da escuridão que a sobrepujou, nada a satisfazia mais do que as mãos dele sobre si.
  Havia medo refletindo em suas ações, nas pálpebras trêmulas que faziam menção em se abrir, pois almejava muito mais do que simplesmente sentir… Queria vê-lo, tocá-lo por si mesma, mas temia perder tudo que havia conquistado até então. Numa tentativa quase tola, ambos os braços se ergueram e os olhos se abriram, tornando possível guiar as mãos até o rosto dele. Sentir a pele alheia entre os dedos fora assustador, de modo a contorcer os lábios em angústia. Agora compreendia os inúmeros elogios que recebeu em relação as ilusões que era capaz de criar em tão pouco tempo; uma pequena fonte de seu poder que havia despertado, um de seus aspectos favoritos quando era apenas uma criança envolta por um mundo vampírico.
  Repentinamente ela se ergueu, abandonando a cama aturdida, correndo até o centro do quarto, onde caiu de joelhos e envolveu a si mesma com os próprios braços. ❛ Eu não posso fazer isso… ❜ Sussurrou, curvando o corpo para frente, deixando que as lágrimas atingissem o chão, enquanto continha o soluço para que não saísse exagerado; não queria atrair atenção. Era noite e, por tanto, estava ciente de como todos na mansão Kuran estavam despertos e, eventualmente, teria de sair. Não demorou muito para sentir certo peso sobre as costas, braços largos embalando seu pequeno corpo, a fazendo se encolher aflita, cobrindo o rosto com ambas as mãos e  balançando a cabeça negativamente. ❛ Não posso fazer de você uma ilusão… ❜ Suas ilusões eram baseadas em objetivo ou na vontade de conceder desejos,  por isso havia tanta realidade presente nelas… Mas era a primeira vez que se via capaz de realizar algo como isso para si mesma… Afinal, não é tão simples acreditar numa ilusão própria, desde que se tem a consciência de que tudo é apenas uma mentira.
  Não havia ninguém no mundo cuja existência fosse capaz de recriar através de suas ilusões com perfeição quanto ele, pois se lembrava de cada mínimo traço. Foram tantas as vezes que se pegou admirando a expressão serena que ele fazia enquanto dormia, a sensação inesquecível de tocar-lhe a pele gélida e alva. Mesmo que raras as vezes em que esboçava algum tipo de reação, seus olhos sempre tinham tanto a dizer; costumavam carregar uma determinação intensa quando criança, mas agora… Havia tanta tristeza e medo refletido neles, mas tudo isso era ofuscadas pelo ódio crescente que carregava consigo depois da noite em que fora transformado. Foram inúmeras às vezes em que desapareceu em seus braços, os raros sorrisos de canto que se delineava nos lábios castos só para si. Talvez devesse ter externado mais como se sentia especial por ver tantos lados reservados só para si… Mas a verdade é que a simples tarefa de olhar para Zero parecia esmagar seu coração de muitas formas diferentes. Sentia-se culpada pelas vezes que não o protegerá, culpada por amá-lo, mesmo sendo aquilo que deveria ser destruída por suas mãos eventualmente… E ainda era correspondida, o amor dele era o que tornava sua vontade de viver eminente e por isso não podia se permitir findar, não agora, não por outras mãos que não fossem as dele.
  O rosto levemente inchado pelo choro ganhou um tom enrubescido e as mãos de Zero se ergueram para limpar as lágrimas que continuavam se formando ali. Kyou ergueu ainda mais o rosto e agarrou os braços alheios com uma força demasiada, pretendendo dissipar a imagem dele a todo custo, entretanto não conseguiu. Um grito contido lhe arranhou a garganta, o vermelho de seus orbes se intensificando, enquanto se erguia e jogava o próprio corpo contra o outro; desejou tanto alcançar somente o chão, mas mais uma vez foi capaz de sentir o corpo dele abaixo de si. Ele olhava para si de forma tão serena, enquanto apaziguava a própria queda, as mãos se mantendo apoiadas em sua cintura… Aquele conforto era tão real, tão vivido que não se via mais capaz de lutar contra ele; ambas as mãos tomando o rosto do mais velho, enquanto os polegares acariciavam as bochechas gélidas. O corpo de Kyou voltou a se curvar para frente, enquanto os cabelos cobriam seus olhos. Os lábios se uniram aos dele e a ruiva sentiu-se queimar, estava cruzando a linha de uma forma tão patética… Era egoísta demais pedir para estar enganada? Talvez tivesse enlouquecido e ele realmente estivesse ali para livrá-la mais uma vez de sua prisão… Mas mesmo naquele torpor, mesmo com a mente trabalhando insistentemente para a levar a beira da loucura… Era seu sangue que a mantinha consciente. Tudo não passava de uma ilusão, a mais sublime e bela que já criará em todos os seus anos de existência. As mãos envolveram os pulsos alheios, apenas para pressioná-los contra o chão, enquanto as pontas dos dedos vagavam sobre a pele. Era a única capaz de aprofundar o beijo e assim o fez, se perdendo no calor que havia criado por tanto tempo que não percebeu a noite passar.
  Quando a manhã se ergueu, uma luminosidade natural refletiu na janela, mesmo com o sol estando sempre ausente naquela parte obscura da cidade. As pálpebras tremularam e Kyou despertou gradativamente, sentindo-se extremamente desconfortável devido a superfície lisa abaixo de si. Ela se sentou, esfregando um dos olhos com as costas da mão direita; se perguntou o motivo da janela aberta, mas se limitou em se erguer do chão, ajeitando as vestes que trajava e caminhou até a beirada da cama. A medida que se tornava mais consciente, relembrou minimamente do que acontecera; e mais do que isso, se deu conta dos hematomas que surgiram em sua pele, havendo um pouco de sangue seco em baixo das próprias unhas. O lábio inferior fora pego entre os dentes e ela se jogou na cama, se escondendo embaixo da coberta, ouvindo o som da maçaneta girar e a porta do quarto se abrir, o aroma de Ruka se espalhando pelo ambiente, marcando o fim de seu doce sonho.
                                                                                ( ❀ knowledge )
  ❛ Kyou-nee! Kyou-nee! ❜ As mãos de Maria tocavam o rosto da Purosangue com cuidado, se certificando de não despertá-la de forma abrupta. Conforme os olhos rubros se revelavam, um sorriso radiante surgia nos lábios da mais nova, que imediatamente erguia o olhar a procura de outra figura no recinto. ❛ Shouto-sama! Ela está acordando, onde você está? ❜ Maria foi se afastando da mesa no centro da biblioteca, procurando dentre as enormes prateleiras mais próximas a presença familiar que parecia ter se esvaído.
  Kyou repousou a destra no topo da cabeça, gemendo baixo com a dor intensa que percorreu seu corpo. O olhar vagou pela sala em busca de Kurenai, mas por um instante se viu sozinha. Tinha sido capaz de reconhecer a voz que a despertou, mas o lugar onde estava, que se assemelhava muito a uma biblioteca, não apresentava qualquer familiaridade. Estava prestes a descer da mesa onde fora repousada, quando a silhueta de Maria surgiu diante de seus olhos. A pequena repousou ambas as mãos em seus ombros, mantendo-a sentada onde estava. ❛ Por favor, não se desespere de novo, vai ficar tudo bem, eu estou aqui com você. ❜ A Purosangue sentiu a grisalha agarrar suas mãos e mesmo confusa, algo dentro de si manteve a agitação que se formava em seu estômago sob controle. A ruiva poupou palavras, mantendo o olhar sobre a Nobre, visto que está parecia levemente ansiosa em seguir com suas explicações.
  Maria deu alguns passos para trás, vendo que a situação estava indo melhor do que esperava. Ao deixar as mãos de Kyou, a vampira levou às próprias para trás das costas, o rosto corado fazendo seu olhar desviar para outro lugar. ❛ Eu prometi que te levaria para fora da Mansão… Mas eu precisava de ajuda… ❜ Não era forte o suficiente, a grisalha tinha plena consciência de suas limitações e isso a assombrava até certo ponto. ❛ Eu encontrei uma amiga muito antiga procurando por você… Mas muitas coisas aconteceram, Kyou. Quando chegamos aqui, você ficou tão assustada e perdeu o controle… Tivemos que te colocar para dormir… ❜ Não era difícil ver a premissa do que seriam lágrimas se formando nos orbes acinzentados, entretanto, Maria engoliu seco, mantendo tanto sua postura quanto tom de voz firmes. ❛ Eu sinto muito, mas não tivemos outra opção! ❜
  Ambas as mãos se apoiaram na beirada da mesa, impulsionando o corpo para frente, tocando os pés no chão com leveza. Por algum motivo, sentia-se estranhamente calma, mas a noção de estar fora da Mansão dos Kurans não parecia atormentá-la mais… Mesmo que de forma inexplicável. Lentamente, Kyou se aproximou do lugar onde a Kurenai estava, envolvendo os braços ao redor dela e a puxando para si em um abraço cuidadoso. A destra repousou sobre as madeixas grisalhas, afagando-a ali com todo seu coração. ❛ Estou feliz por vê-la bem, Maria-chan… ❜ Sabia que a pequena havia feito muito por si na noite em que Rido surgirá, entretanto não fora capaz de sequer visitá-la, ajudar com suas feridas e demoraria um tempo para se perdoar diante daquelas questões. Kurenai por sua vez apenas retribuiu o abraço, afundando o rosto no peito da mais velha para abafar breves soluços; ainda que fizesse força para conter as lágrimas, não conseguiu evitar algumas de rolarem sobre seu rosto.
  De forma súbita, o ar se condensou acima de Kyou, fazendo seus braços ao redor de Maria apertaram um pouco mais. A mais nova percebeu a dose de nervosismo que simplesmente alcançou a ruiva e fez o mesmo, enquanto buscava pela presença que se aproximava. Uma silhueta pairou em pleno ar, ganhando forma à medida que conquistava a atenção de ambas, deixando um aroma açucarado, que remetia vividamente a um punhado de cerejas, se espalhando em seu entorno. Mesmo com o coração acelerado e o corpo estremecido, Kyou não fez muito além de olhar para a nova figura por cima dos ombros. Ela possuía um sorriso travesso, que por um motivo inexplicável foi a primeira característica alheia que lhe chamou a atenção, longos cabelos púrpuros dançavam pelo ar, tão vívidos quanto as madeixas avermelhadas que possuía. Os grandes olhos vermelhos reluziam propositalmente, assim como sua aura vampírica que buscava espaço para se estabelecer num patamar distinto dentre as criaturas ali presente. Uma Nodachi permanecia embainhada em sua cintura e Kyou reconheceu esta rapidamente como uma arma anti-vampiros; um tanto inapropriado para uma Purosangue, mas não era como se pudesse contra argumentar muito sobre isso.
  A figura enigmática permaneceu onde estava, repousando o queixo sobre a mão esquerda, enquanto analisava a ruiva com um interesse fora do comum. ❛ Vejo que está muito mais calma agora… Lamento por reduzir o seu poder, prometo devolvê-lo com o tempo… ❜ O olhar pairou sobre Maria, que imediatamente se afastou com cuidado de Kyou, apenas para dar o espaço que a Purosangue demandava. A ruiva se limitou a virar-se na direção da outra, um olhar inerte refletia sua exaustão e não encontrou sentido em proferir qualquer palavra. ❛ Você não me conhece, mas eu me chamo Shouto Aki. ❜ A púrpura se moveu em pleno ar, até diminuir a distância o suficiente para segurar o rosto de Kyou entre as mãos. ❛ O que fizeram com você, minha pequena? ❜ Desde de que pairou os olhos sobre a outra, era como se Aki se deparasse com uma presença tão familiar a si, que precisou conter a necessidade de abraçá-la. A pele alva que se assemelhava a mais esmerada das porcelanas, o cabelo de tom avermelhado, que buscava acompanhar a intensidade dos olhos; tudo sobre ela era igual a Mina de uma forma assustadora e estava fascinada.
  Mesmo que o impulso inicial tivesse sido o de se afastar, algo dentro de si a impediu. Kyou ergueu a cabeça, apenas para estabelecer contato visual com a outra e por muito pouco lágrimas não se formaram em seu rosto. Estava ciente do próprio estado minimamente entorpecido, como se algo dentro de si tivesse sido colocado para dormir… Mais especificamente, seu sangue parecia ter perdido forças naquele instante. Se lembrou da forma como chegara ali, Maria havia surgido como um sonho na Mansão, pedindo para que confiasse nela e assim o fez. Quando se deu conta, não estava mais na Mansão Kuran e este fato a fez perder o controle, tinha certeza disso, embora só recordasse do desespero que a consumiu, seguido da forma como a visão escureceu. Kyou tropeçou entre os próprios pés, escorregando das mãos de Aki e encolhendo-se no chão. ❛ Eu sinto muito, mas eu… Eu preciso voltar… ❜ As mãos se ergueram para cobrir os olhos e Kyou soluçou, um grunhido de dor escapando da garganta, enquanto Maria se aproximava, ajoelhando-se atrás dela e repousando ambas as mãos em suas costas, procurando confortá-la e estabelecer algum apoio.
  ❛ Humanos são tão frágeis… ❜ Os pés da Ancestral finalmente tocaram o chão e respirando profundamente, a mente dela vagou por uma memória bastante nítida em suas lembranças. ❛ Maria… ❜ A menor se ergueu rapidamente em resposta ao chamado, correndo para alcançar uma peça de roupa que repousava sobre a mesma mesa onde Kyou estava anteriormente, retornando para a ruiva logo em seguida. A grisalha descansou o sobretudo sobre a cabeça da Purosangue, que no mesmo instante agarrou o tecido, torcendo-o entre os dedos com uma força esmagadora. A Ancestral da família Shouto notou a forma como os olhos da ruiva acenderam em um vermelho intenso, assim como suas madeixas, as presas se mostrando tão imponentes que, de imediato, Kyou levou a própria canhota até a boca, perfurando a epiderme, para que o sangue escorresse lentamente Sua aura vampírica se mostrou muito mais densa e um sorriso se estendeu nos lábios de Aki de forma quase mortal. ❛ É isso… Você está aí, minha amiga! ❜
  Naquele momento Kyou teve certeza de que a figura Ancestral defronte a si não estava exagerando ao afirmar que havia reduzido seu poder. O corpo tremulava de forma contida, enquanto ingeria o próprio sangue em goles considerados. Aquele calor, aquela pequena chama que acendeu e se expandiu por todo seu corpo, fazia tanto tempo desde a última vez que esteve consciente naquele estado. A garganta arranhava, assim como as unhas que por muito pouco não desfizeram a costura do tecido do sobretudo que cobria seu rosto. Era o cheiro dele, não havia dúvidas quanto a isso, sabia bem a quem aquela veste pertencia. Uma risada baixa escapou dentre os lábios rosados e Kyou se ergueu, abraçando e pressionando a roupa contra si, numa tentativa inútil de conter-se. A canhota se ergueu, as garras fincando-se no próprio pescoço e causando feridas que demorariam um tempo a se cicatrizar, pois precisava daquela dor… O pouco do poder que ainda restava em si era o suficiente para machucar alguém, seu sangue gritava por uma caça incessante, enquanto corria forte por suas veias.
  ❛ Kiryuu Zero, não é? Não foi difícil, Kaien-sama parece cuidar muito bem dos pertences de seus filhos queridos… Pena que às vezes consegue ser tão desatento… Ou será que ele me deixou obter esta peça guiado por seus instintos de que eu faria a coisa certa? ❜ Os sentidos não haviam se acalmado, mas é fato de que Kyou ajeitou a própria postura, apenas para olhar na direção de Aki, extremamente interessada em suas palavras e era isso que a Ancestral precisava… Era isso que estava tentando conquistar desde a chegada da ruiva. ❛ Como eu havia dito, me chamo Shouto Aki, sou a Ancestral da família Shouto e irmã, infelizmente não de sangue, de sua Ancestral, Mina. ❜ A mão livre de Aki ergueu um pouco a saia, como quem traja um vestido, curvando o corpo para frente em um cumprimento bastante cortês. ❛ Peço para que não se preocupe, posso ter despertado recentemente e não possuir uma habilidade tão apurada em ilusões, mas creio que fiz um bom trabalho e para qualquer um além de mim e Maria, você ainda permanece na Mansão dos Kurans. ❜
  ❛ Pastilhas… Eu preciso de pastilhas ❜ O olhar de Kyou pairou sobre o chão, quase como se ignorasse tudo que a outra havia dito até então, entretanto a realidade não era bem essa e tanto Maria quanto Aki eram capazes de distinguir isso. A ruiva ajeitou o casaco em seu braço esquerdo, enquanto a destra limpava como podia a bagunça que tinha feito com o próprio sangue. Maria estendeu uma pequena caixinha preta na direção de Kyou, que aceitou o conteúdo com um pequeno sorriso nos lábios. Em um único movimento, a vampira consumiu todas as pastilhas armazenadas ali, mantendo a cabeça erguida e os olhos fechados. Meses haviam se passado dentro da prisão que a Mansão tinha se tornado para si… E era estranho como durante aquele tempo, se via somente em um estado completamente monstruoso ou o de uma boneca sem vida… Fazia tempo desde a última vez que sentiu a mente leve como agora, mesmo sabendo que estava sendo forçada a isso, por aquela nova presença. ❛ O que está acontecendo, Shouto-sama? ❜
  Aki pulou do lugar onde estava, agarrando uma das mãos de Kyou extremamente ansiosa, mesmo que não tivesse conquistado nenhuma reação considerável por parte desta. Um bico se formou nos lábios delicados e a maior bufou, movendo os dedos para arrastar uma cadeira até o lado direito da ruiva, enquanto alguns livros específicos flutuavam para fora de suas respectivas prateleiras. Como alguém que adormeceu por tanto tempo, não era estranho que estivesse fazendo uso de seus poderes em tarefas simples, precisava treinar aqueles músculos para recuperar as próprias forças. Maria ajudou Kyou a se sentar, colocando-se ao lado de Aki logo em seguida.
  A Ancestral cruzou os braços defronte ao corpo, tombando a cabeça para o lado descontraidamente. ❛ Você não estava conseguindo se controlar, variando entre uma besta faminta e um brinquedo indefeso, então eu selei uma grande parte do seu poder temporariamente e forcei o que restou dele a sobrepujar seu lado humano através da fome e talvez algo mais… O cheiro dele realmente mexeu com você, por um instante pensei que teria minha garganta cortada. ❜ Aki riu de forma assombrosa com a ideia, entretanto manteve-se atenta a Kyou, que não esboçou muito além de uma confusão momentânea. ~
      ❛ Ainda que não faça muito sentido para mim… De alguma forma eu consigo compreender… ❜ Não havia uma explicação muito coerente, mas Kyou entendia a sensação de oscilar… Quase como se seu âmago não conseguisse distinguir o que era na realidade… Humana ou vampira?… Humana ou vampira.
     ❛ Se continuar pressionando sua mente assim, vai acabar se perdendo… Por favor, apenas nos escute. ❜ Desta vez foi Kurenai quem tomou um passo à frente, reunindo ambas as mãos em frente ao peito e diante daquele pedido, Kyou tentou se concentrar somente nas duas, afastando qualquer outro pensamento que pudesse levá-la à beira da loucura novamente. ❛ Kyou o Conselho dos Anciões foi destruído, Kaname-senpai te contou sobre isso? ❜ Os orbes escarlates da ruiva se arregalaram, a cabeça se movendo de forma negativa, fazendo Maria prosseguir.. ❛ Durante todo esse tempo Kaname-senpai precisou reestruturar a sociedade vampírica, mas não estava sendo uma tarefa fácil. A Associação está tendo muitos problemas com recém-criados e até Nobres mais novos… ❜ Aki pousou a mão sobre o ombro de Maria, pedindo a palavra e dando o que considerava ser o tempo necessário para Kyou processar todas as informações até então.
  A ruiva estremeceu, quase como se uma brisa gélida a envolvesse, mesmo sendo reeducada na Mansão, como uma vampira, não estava ciente de toda movimentação que acontecia do lado de fora. Kaname nunca estava presente e os Nobres não falavam nada além do necessário. perto de si e de Yuuki. Se não fossem as anotações feitas durante seus períodos de estudo teria perdido toda perspectiva de passagem de tempo lá dentro. Mesmo sendo uma Purosangue… Estava sendo tratada somente como um recém-criado. Os dentes trincaram e as mãos se fecharam em punho, estava afastada da Associação, o que diminuía a força dos Caçadores no controle das listas de observação e execução… Estava fora de seu maldito lugar
     ❛ Ara, é bom ver este brilho. ❜ Aki se viu forçada a interromper os devaneios da ruiva, que imediatamente fitou a si com os olhos predatórios. ❛ Não me olhe assim… Eu sou apenas sua humilde guardiã, certo? ❜ A Ancestral tomou um dos livros que pairavam sobre o ar em mãos, folheando algumas páginas antes de lançá-lo na direção de Kyou. ❛ Além dos conflitos com os humanos, nós vampiros ainda precisamos lidar com nós mesmos, é um infortúnio. ❜ O corpo fora jogado para trás e mesmo fazendo menção em cair, Aki apenas se apoiou na beirada da mesa, precisando de um único pulo para sentar-se na mesma. ❛ Você daria ouvidos a alguém como eu? Gostaria de fornecer respostas aos seus questionamentos... Porém não posso falar sobre tudo. Você sabe como cada Purosangue possui uma peculiaridade, um poder principal... Assim como os Kurans nascem líderes natos, a sua família também tem uma função a cumprir dentro da nossa sociedade e por isso não posso afetar todo seu julgamento e concepção de vida... Com o tempo, Kyou, você irá entender o motivo de estar aqui... Então, por favor, me deixe ajudar.❜
  Os orbes vermelhos delinearam a silhueta alheia uma última vez, antes das pálpebras pesarem suavemente, o olhando sendo redirecionado para o livro em seu colo. Tudo parecia correr tão depressa e seu eu fragmentado nunca parecia capaz de acompanhar a forma violenta como tudo decorria. Mesmo em um ambiente que não se encontrava em nenhuma de suas memórias, mesmo diante de uma existência desconhecida… Havia uma certa familiaridade presente em tudo. Kyou era capaz de distinguir que nada relacionado a história de seu nascimento, pertencia aquele lugar… Mas seu sangue, era como uma entidade capaz de transmitir sensações, pensamentos, era assustadoramente vivido. Mesmo tendo dificuldade em estabelecer certa conexão, agora que o excesso havia sido forçado para fora de si, era capaz de senti-lo com mais clareza.
  A forma como o corpo fora capaz de relaxar gradativamente, o modo como seu sangue, tão predominante, deixou-se ser facilmente controlado pela Ancestral… Era como se a própria essência colaborasse com aquela existência para alcançar seu eu real. Era impossível desenvolver algo como confiança com apenas uma troca de olhares… Mas sentia-se envolvida por algo além da própria compreensão… Algo que sussurrava gentilmente em seus ouvidos de que tudo ficaria bem… De que diante de si, estava o que procurou por tanto tempo. O conteúdo do livro no entanto, era indecifrável, agora que lhe dava a devida atenção, notou que as escrituras contidas ali era de uma língua desconhecida para si.
 De forma desinibida, e até mesmo prepotente, o corpo de Aki pairou sobre Kyou, que imediatamente se ergueu do lugar onde estava sentada. A Purosangue manteve-se próxima a Ancestral, de costas a ela, com os braços envolvendo o livro com firmeza. A mais velha envolveu as mãos ao redor do pescoço da ruiva, os dedos pressionando o lugar de forma cuidadosa, forçando-a erguer o rosto e fitar o teto da enorme biblioteca. ❛ O fragmento do sonho que você me deu permanece escondido nesta noite sem fim… ❜ Os lábios repousaram delicadamente sobre a testa da menor, deixando que o próprio rosto cobrisse seu campo de visão.
      ❛ Uma das estrelas de uma constelação desapareceu… E a ária do amanhecer ressoou… ❜ Era a voz de Kyou ecoando, mas aquelas palavras não lhe pertenciam. Foram seus olhos que se fixaram no rosto a cima de si, mas não era aquela quem estava olhando. O sorriso que se delineou em seus castos lábios também não lhe pertencia, aquelas emoções concerniam a um outro alguém, cujos resquícios da existência se encontravam em seu sangue e esta existência estava muito feliz em rever Aki através de seus olhos.                                                                                  ( ❀ kurans )     
   Um pequeno laço rendado e vermelho fora acoplado ao enorme corvo, que repousava tranquilamente no parapeito da janela, a fim de garantir que a pequena carta enrolada em formato de pergaminho não se desprendesse dele. Kyou respirou profundamente e quando o olhar encontrou o rosto da ave, os olhos desta se abriram imediatamente, os tons escarlates de ambos se chocando por um instante. A vampira deu um único passo para trás, sentindo-se letárgica, forçando-se a desviar o olhar. O corvo se acomodou melhor, mantendo-se na direção da ruiva, que cruzou os braços e suspirou pesadamente.
   ❛ Eu vou ficar bem, você sabe que eu vou... ❜ O corvo abaixou a cabeça, ocultando seu olhar uma vez mais e Kyou estendeu a mão em sua direção, deslizando a ponta do dedo indicador sobre as penas dele. ❛ Você precisa levar isso, está bem? ❜ Mesmo em um tom tranquilo, Kyou ofuscou certa angústia nos confins de seu âmago e a ave respondeu a sua oscilação ao repousar a ponta de seu bico em sua pele. A Purosangue estremeceu, balançando a cabeça positivamente, a ligação que compartilhavam era recente, porém intensa, devido a forma como o corvo externava suas intenções. Havia ficado claro para si que caso algo acontecesse, ele ignoraria sua missão e voltaria para si em um piscar de olhos e embora se preocupasse com a possibilidade da carta não chegar a seu remetente… Se sentia mais segura por saber que ele viria por si caso precisasse.
   Com um crocitar grave, a ave se afastou gradativamente, enquanto Kyou observava suas asas o levarem para longe, até que a neve ofuscasse completamente a visão que tinha da figura familiar. Três batidas na porta de seu quarto e Kyou abriu um sorriso, fechando a enorme janela de vidro por onde o corvo havia partido. 
      ❛ Kyou-chan! ❜ A voz de Ruka ecoou e a ruiva não demorou a destrancar a porta e conceder passagem a Nobre, que permaneceu na entrada, apenas repousando a destra sobre o topo da cabeça de Kyou, que correspondeu inflando as bochechas levemente. Souen não compreendia como a recuperação da Purosangue tinha acontecido tão rápido, mas era bom ver as energias da menor renovadas. Ambas permaneceram daquela forma por um tempo, até que Ruka cruzou os braços, assumindo uma expressão mais séria. ❛ Kaname-sama quer ver você... ❜ Alegou em um tom sombrio e descontente, visto que não trazia nenhuma mensagem agradável.
   Se opondo a resposta que Ruka provavelmente esperava, Kyou apenas alargou ainda mais o próprio sorriso, tombando a cabeça levemente para o lado. ❛ Agradeço por vir até aqui, eu iria até eles de qualquer forma hoje antes do sol se erguer. ❜ Dito isso, Kyou segurou ambas as mãos da Nobre,  curvando-se minimamente para esta e seguindo rumo até os aposentos dos Kurans.
   Os pés descalços pisavam fracos no chão frio, enquanto o corpo rodopiava conforme uma melodia suave repercutia em sua mente. Não havia uma única luz capaz de iluminar seu caminho, entretanto os olhos eram capazes de enxergar muito além do que se escondia nas sombras. Era fato que seus sentidos haviam se aguçado muito mais durante o tempo que passara na Mansão Kuran, talvez agora estivessem mais fortificados do que quando era uma criança… Quando vivia sua real natureza. Não havia nada além de um curto vestido esbranquiçado cobrindo-lhe o corpo, enquanto as madeixas avermelhadas uniam-se em uma dança lenta com a brisa que adentrava pelas janelas. 
   A Mansão Kuran, que um dia fora seu abrigo, agora tinha se transfigurado em sua prisão, pouco existia para Kyou além daquele espaço. Em noites muito específicas, Kurenai lhe visitava e então era levada para a biblioteca, até então desconhecida e que muito a intrigava, onde conheceu Aki. Nestas noites, criava uma ilusão de si mesma, que se mantinha deitada na cama do quarto designado para si e embora Kaname nunca reagisse, sempre teve a sensação de que o Purosangue estava ciente de sua ausência. De acordo com Aki, a biblioteca em questão pertencia a própria linhagem e os livros ali dispostos se tratavam não só de sua história, mas a história dos vampiros desde seu surgimento. A língua contida neles trazia uma sensação de familiaridade, porém Kyou não se recordava.
   Mesmo depois de recuperar as memória que havia perdido e de se reconhecer, haviam coisas sobre seu passado que pareciam encobertas por uma névoa densa; como se algo dentro de si soubesse que não estava preparada para se lembrar com clareza de algumas situações,. incluindo aquela língua em específico. Aki se responsabilizou em ajudá-la a recuperar os poucos fragmentos que faltavam, mas pediu para que não se forçasse, pois agora que estava completa, tudo voltaria com o tempo. Com isto, esteve absorvendo todo conhecimento necessário sobre suas principais habilidades vampíricas com Aki e Maria, enquanto era reeducada dentro da sociedade dos vampiros na Mansão dos Kurans, com a ajuda de Ruka e Seiren. Por agora, precisava se lembrar da língua contida nos livros, saber o paradeiro de seu próprio pai, algo que somente Momo poderia ajudar e voltar a se restabelecer como Caçadora… E, para que tudo fosse possível, precisava deixar aquele lugar de uma vez por todas. Sua prisão se destruiria  ali e agora, de uma forma ou de outra, estaria livre antes do sol nascer.
   A destra tocou a maçaneta da porta pertencente aos aposentos de Kaname e Yuuki, entretanto, recuou logo em seguida. Os orbes cintilaram por breves segundos e a ruiva comprimiu as palpebras, fazendo a tranca se abrir apenas por sua vontade. Era muito comum que executasse funções básicas através de seus poderes, era como um músculo atrofiado que necessitava de uso para se recuperar. Se estavam a sua espera, não via motivo para fazer cerimônias ou anunciar sua chegada, entretanto a voz nítida e clara de Kaname a fez permanecer no corredor ainda assim.
      ❛ A sede de um vampiro pode apenas ser extinta pelo sangue de seu amado... Você se lembra disso, Yuuki? ❜ O Purosangue questionou em um tom de voz frio e Kyou cruzou os braços, fitando a porta defronte a si, concentrando-se nas palavras emergindo do quarto
.     ❛ Sim... Porque mesmo agora, há uma parte do meu coração que ainda está ligada por um elo que não posso cortar... É por isso que minha sede não pode ser totalmente extinta... ❜ O peso das palavras de Yuuki vinham de uma forma incomum para si, não se lembrava de um dia ter conhecido aquela faceta dela… Mas era difícil  discernir algo tão profundo… Do que exatamente ela estava falando? ❛ … Uma parte dele ainda está ligada ao Zero, então… Apesar disso, tudo bem... Se eu ficar ao seu lado...? Eu quero estar junto de você para sempre... ❜ Quando a porta se abriu, as mãos de Yuuki, que relutantemente se aproximaram de Kaname, fizeram menção a recuar, pois ao olhar para a entrada, os olhos da vampira se arregalaram. ❛ … Ky-Kyou? ❜ A expressão da ruiva tornou-se fria como mármore e o brilho nos olhos carmesins se perderam tão rapidamente, que qualquer um poderia afirmar que havia morrido naquele instante. Yuuki sentiu uma energia estranha percorrer sua espinha ao deparar-se com um olhar tão fúnebre direcionado a si e se Kaname não tivesse agarrado seus pulsos e a puxado para si, teria se afastado.
      ❛ E eu aqui me perguntando... O que você ia dizer. Yuuki eu jamais te rejeitaria por algo assim. É claro que pode ficar comigo para sempre. ❜ O Kuran mais velho tomou a mais nova em um abraço, trocando suas posições de uma forma que Yuuki se virasse de costas para a porta e que ele mesmo fosse capaz de fitar Kyou sem qualquer pudor. Quando o olhar do Purosangue encontrou os da ruiva, ela teve certeza que ele sabia da sua chegada, ele devia ter acompanhado sua trajetória desde o momento em que Ruka a encontrou momentos atrás. ❛ Tudo bem, Yuuki... Não me importo que haja outra pessoa em seu coração. Uma Yuuki sem o coração cheio de amor e compaixão não seria você de verdade... E mesmo tendo sentimentos por ele, você disse que queria ficar ao meu lado... ❜ O sorriso que se delineou nos lábios do Ancestral era algo que Kyou não via a muito tempo, a forma como as mãos dele passaram a segurar o rosto de Yuuki, mas seu olhar ainda se mantendo sobre si… A intenção clara de lhe mostrar como ele havia tomado tanto de seu tempo ao lado de Zero, enquanto ele mesmo tinha sua amada em seus braços somado a consciência de como as próprias palavras, e as de Yuuki, trariam dor a ela.
    ❛ Eu estou retornando para a Associação e o Colégio Cross. ❜ A voz de Kyou cortou o ar e ao erguer o rosto, era possível ver nela rachaduras que se estendiam por toda epiderme de forma caótica, da ponta dos pés até o queixo. O vestido branco fora tingido de um vermelho tão vívido, que se assemelhava a sangue fresco. A aura que emanava se assemelhava muito a que Kaname tinha visto quando chegara ali, mas desta vez, estava muito mais controlada e menos densa, embora fosse possível ver os músculos de seu rosto se comprimindo quase que imperceptivelmente, em sinal de dor. Kyou caminhou até o centro do quarto, parando defronte aos Kurans e alternou o olhar entre Yuuki e Kaname.
   Mesmo sem deixar transparecer, algo no cerne de Kaname sentiu-se extremamente surpreso perante tal visão. Com cuidado, ele afastou Yuuki, deixando que esta repousasse sobre a beirada da cama, enquanto ele retornava até onde Kyou se encontrava. A canhota do Purosangue tocou o rosto de Kyou, que respirou profundamente em reação ao toque, fechando os olhos por um instante. Oito meses haviam se passado e ele não pensou que a ruiva fosse capaz de controlar o sangue que herdara daquela forma… Tão forte, tão majestoso e ao mesmo tempo tão impuro e quase incompreensível. Havia submetido Kyou aos maiores extremos que era capaz de criar dentro da Mansão, desde obrigá-la a ver os demais vampiros se alimentando, quando ela mesma não podia provar uma única gota de sangue a impedi-lá de ter qualquer contanto com humanos. 
   Yuuki trincou os dentes, abaixando o olhar e fechando as mãos em punho. Kyou havia ignorado completamente toda as suas afirmações e até mesmo as palavras de Kaname… Mesmo tendo sentido aquele olhar para si, o frio na espinha, quando acreditou que aquele tinha sido o golpe de misericórdia… Ela agiu como se não tivesse presenciado absolutamente nada. Desde o início fazia questão de relembrar sobre Zero, de reafirmar os próprios sentimentos em relação a ele próximo dela, pois este era seu ponto mais sensível, tudo para aflorar o monstro que rastejava por baixo de sua pele… E se continuasse assim, Kaname daria liberdade a ela, e ela voltaria para Zero… E a vida de todos estaria em risco novamente. ❛ … Onii-sama, ainda é cedo demais... ❜ Sussurrou, os dedos afundando no colchão abaixo de si, precisava convencê-lo a chão deixá-la sair.
   Kaname abaixou o olhar, observando Yuuki por cima do ombro, mas sem desviar a atenção de Kyou que permaneceu imóvel. Ele acompanhou com o olhar o desespero evidente nela e embora houvesse sentido em suas preocupações, o Purosangue estava ciente de que algo mais transbordava dali… Ciúmes, talvez? Ele apenas sorriu com a possibilidade. A menor se ergueu do lugar onde tinha sido deixada e voltou para perto do Ancestral. Ambas as mãos de Yuuki envolveram seu pulso e ela puxou a destra deste trêmula, erguendo a mão alheia para perto de seus lábios e ali o mordeu, deixando que o sangue transbordasse para além de sua boca. O Purosangue nada fez, além de virar-se na direção da Yuuki, enquanto a mão livre abandonava o rosto de Kyou.
   Os olhos um pouco mais vividos se focaram precisamente na forma como as presas de Yuuki perfuraram a pele alheia e Kyou cobriu os lábios com uma das mãos, desviando o olhar. Gargalhando baixo, os olhos se fecharam e as marcas espalhadas por seu corpo se findaram, voltando a naturalidade de antes. Não era a primeira vez que usavam da sua necessidade de sangue para buscar algum tipo de oscilação. De fato, tinham razão em temer o que corria em suas veias,  ela mesma temia o próprio sangue, pois não era capaz de lembrar com clareza o que aconteceu as vezes em que fora dominada por ele. 
   Havia um desejo incontrolável de domínio, uma sede que ia muito além de uma necessidade, mesmo se algo a satisfizesse, talvez não seria o suficiente… Talvez caçasse pela simples diversão contida nisso. Por tudo isso tinha deixado que Aki adormecesse uma parte de seu sangue, para que se enfraquecesse e fosse capaz de confrontá-lo aos poucos. Seu familiar havia desperto com o propósito de cuidar de si e ajudá-la nessa tarefa… Mas continuar ali não traria mais nenhum progresso para si. 
   Não estava autorizada a se alimentar como uma espécie de provação, entretanto nenhum vampiro era capaz de sobreviver desta forma, ainda mais alguém que viveu e se alimentou como humana durante tanto tempo. Se não fosse o sangue de Zero presente em seu organismo, talvez tivesse colapsado e Kyou podia sentir que ele estava enfraquecendo dentro de si e não era capaz de medir as consequências de quando o vínculo estabelecido entre ambos desaparecesse. Não importava quanto sangue derramassem sobre si e nem as formas que fizessem isso… Mesmo suas vontades mais primitivas estavam direcionadas a Zero e isso a impedia de tomar o sangue de qualquer um, não importando as circunstâncias… O real problema nisso tudo é que não saberia que tipo de comportamento poderia ter ao vê-lo de novo… Até onde seu autocontrole iria.
      ❛ Ocorrerá um baile, muito em breve, onde estabeleceremos um acordo entre o novo Conselho e a Associação novamente... ❜ O Ancestral se abaixou cuidadosamente, estendendo os braços na direção de Yuuki, que se desprendeu de seu sangue e caiu levemente sobre seus braços, adormecida. Ele não podia permitir que as emoções da Kuran mais nova transbordasse daquela forma perante alguém que não fosse ele, e por isso a levou até a cama, ajeitando seu corpo ali para que descansasse. ❛ Todos vão estar lá, já ordenei a Seiren e Ruka que devolvam as memórias que Yuuki mandou apagar relacionadas a você. Seiren o fará no Colégio Cross e Ruka na reunião... ❜ 
   Kaname uma vez mais observou Kyou por cima dos ombros, enquanto a destra deslizava sobre os cabelos castanhos de Yuuki. ❛ Você é uma Caçadora e por isso está livre do Conselho, além de tudo, provou que é capaz de controlar seu sangue, ao menos por enquanto, e não importa o que façamos daqui em diante já perdemos a influência sobre você, não é mesmo? ❜ Não era como se o Ancestral tivesse qualquer pretensão em esconder aquele fato, ele sabia que Kyou já tinha plena consciência disso. ❛ Porém… Sua lealdade ainda me pertence e meus olhos vão estar sempre sobre você... ❜ Tão rápido quanto havia se afastado, o Purosangue retornou, segurando o rosto da ruiva com ambas as mãos, mas não de uma forma afetuosa, como fazia como Yuuki, não… Os olhos se afundaram nos dela e o maior a forçou a permanecer com o rosto direcionado a si. ❛ Não me faça ter de controlar você de novo, Kyou... ❜
   A Caçadora respirou fundo, fechando os olhos por um momento, enquanto pressionava os dentes contra a língua. Algo dentro de si se sentiu diferente, não correspondendo com a pressão que o olhar dele exerceu sobre si… Quase como se pela primeira vez tivesse visto algo nele ou entendido as palavras proclamadas de forma diferente. Talvez tivesse chorado… Se não fosse o sangue queimando por debaixo da pele, relembrando com quem estava lidando e não importava o quanto quisesse acreditar em seu amigo de infância… Agora eram duas extremidades opostas, mesmo que aliados por uma linha tênue de sangue, ainda estavam um contra o outro; Kaname contra o tipo de existência que Kyou poderia vir a ser… E Kyou contra as atitudes que o outro estava disposto a tomar principalmente por Yuuki e toda sociedade vampírica. 
      ❛ A lealdade da minha família pertence a sua, o que não significa que você pode dar a palavra final para mim ou para o meu sangue como bem entender para sempre... ❜ Não era simples ir contra a própria natureza, ainda mais se Kaname realmente desejasse colocá-la sobre seu domínio de novo… Ainda assim, sentia que se conseguisse tempo suficiente, seria capaz de superar aquele laço nascido a partir do sangue de ambas as famílias. As mãos de Kyou se ergueram, agarrando as de Kaname delicadamente, para em seguida retirá-las de seu rosto. ❛ Mesmo entendendo tudo um pouco melhor agora… Ainda existem coisas que eu não consegui alcançar… Mas okaa-sama disse que eu precisava estar sempre ao seu lado, independentemente das decisões que você tomasse com o passar do tempo. ❜
   Kyou suspirou, afastando-se do outro a medida que se aproximava da porta do quarto, o olhar mantido sobre o chão gélido.  ❛ Você não estava errado em me tirar a força do Colégio Cross… Eu não conseguiria fazer isso por conta própria. Era necessário que eu me readaptasse ao meu lugar de origem e aprendesse novamente sobre a nossa sociedade. Eu fui muito bem reeducada…  Kaname-senpai… ❜ As mãos se fecharam em punho, os orbes reluzindo assim como a lua que refletia através da janela.  ❛ Mas você não precisava ter mantido o Zero longe de mim… E eu sei que você sabe disso... ❜ As lágrimas transbordaram, enquanto a voz rachava como vidro se partindo ao cair e se despedaçar no chão.  ❛ Você sabia que meu controle estava condicionado a ele, que eu recusaria qualquer sangue que me fosse oferecido… Porque o sangue dele é o único que eu permitiria se unir ao meu e o meu ao dele... ❜ Houveram vezes em que Zero esteve tão próximo da Mansão que Kyou fora capaz de senti-lo, mas Kaname sempre ocultava qualquer rastro da própria presença e se certificava de que os próprios familiares o manteriam longe do caminho certo.
   Os passos alheios foram ouvidos com clareza e Kyou não conseguiu evitar de erguer o rosto ao notar Kaname logo atrás de si… Tão perto. Os olhos carmesins do Ancestral pairavam sem qualquer tipo de emoção sobre ela, enquanto os dela se opunham aos dele ao carregar lágrimas e tantas emoções que o vampiro nem sequer era capaz de distinguir. Ele repousou a destra sobre o topo da cabeça de Kyou e embora os lábios tenham tremulado no intuito de emitir algo, o maior se manteve calado e Kyou não foi capaz de quebrar o silêncio. Era frustrante, aquele conforto repentino não condizia com absolutamente nada, não era capaz de reunir qualquer linha de pensamento diante daquele tipo de comportamento vindo dele. Eram amigos de infância e ainda assim tão estranhos e alheios ao tempo… Quase como inimigos. Depois do silêncio que durou quase uma eternidade, finalmente uma voz ecoou pelo quarto.
      ❛ Eu não odeio você… ❜ 
                                                                             ( ❀ waltz.) 
    A enorme porta de entrada rangeu elegantemente e, de imediato, a aura densa e vampírica que se instalou pelo local foi mais do que o suficiente para colocar em alerta todos os caçadores ali presentes. Kaname foi o primeiro a adentrar, seguido apenas por Seiren, Ruka e Akatsuki. O olhar do Ancestral pairou sobre o chão, antes que erguesse a destra cuidadosamente, estalando os dedos; um simples gesto que fez com que seus subordinados se organizassem na sala. Seiren, no entanto, se ajoelhou ao lado de Kaien, repousando a destra sobre o peito.
      ❛ Se me permite, tenho ordens para devolver as memórias que lhe tomei na noite do incidente com Rido Kuran. ❜ Seiren estendeu a mão direita na direção do Caçador, que suspirou profundamente e deixou que o olhar repousasse sobre Zero por pouco tempo.
   Mesmo que evitasse o assunto, nunca havia duvidado da existência de Kyou… Pelo contrário, algo em si sempre o fez crer na existência desta, uma tristeza profunda o acompanhou durante todos aqueles meses… Uma dor que sentiu agravar ao ter a confirmação de que, novamente, havia sido algo arquitetado pelo Kuran. Sem dizer uma única palavra, nem sequer olhar na direção de Seiren ou Kaname, o Caçador estendeu a mão para Seiren, que deslizou as pontas dos dedos sobre sua palma,, antes de se erguer e usar a mão livre para tocar o rosto do outro. Fora um processo que aconteceu num piscar de olhos e embora Kaien não tivesse demonstrado qualquer reação física, seus olhos tremeram em um pavor que fora ocultado pelas pálpebras tensionadas ao comprimir os olhos, mantendo-os fechado.
   Kaname se conduziu até seu assento, em uma das pontas da enorme mesa que ocupava o centro do salão. Ambas as mãos se apoiaram na superfície gélida defronte a si, os orbes vermelhos fitando uma direção que não parecia possuir nenhum atrativo ou existência digna de sua atenção. Somente quando Seiren se organizou, o Ancestral permitiu que seu olhar pairasse sobre cada rosto ali presente, se permitindo levar um pouco mais de tempo quando o olhar alcançou o Kiryuu no fundo da sala. Fora rápido, mas o canto dos lábios do vampiro repuxaram em um sorriso sádico, que talvez nem mesmo o próprio Kuran tenha notado. Não era comum aquele tipo de reação vindo de si, mas algo na expressão vazia de Zero o deleitou de uma forma indescritível.
      ❛ A posição de líder da nossa sociedade pode ter sido designado a mim, mas isso é tudo... Não significa que nosso estilo de vida ou os princípios de nossa raça também mudem. ❜ Não houve delicadeza em esperar uma resposta mais vivida vinda de Kaien, não era como se tivesse pensado em poupar tempo para que o outro se recuperasse depois de receber tantas memórias de volta. Não abriu espaço para questionamentos ou perguntas… Nada. Kaien fora forte o suficiente para fechar as mãos em punho em cima do próprio colo e fixar o olhar no líder dos Vampiros, que, por fim, havia dado início a reunião. ❛ Não é o mesmo com sua Associação, senhores? O ponto em comum de nossas mudanças é que vamos conseguir resolver problemas gerados para ambas as raças por um mesmo ponto em comum no passado. ❜
   ❛ Nós continuamos extremamente ocupados resolvendo os problemas causados pelo antigo governo dos vampiros. ❜ Yagari interrompeu, curvando os braços defronte ao peito, a expressão avessa não sendo contida, não tinha qualquer intenção em esconder seu descontentamento em frequentar um local como aquele, cercado pelos vampiros que tanto detestava. ❛ Além disso, onde você esteve durante todo esse tempo? Como espera que concordemos com uma nova aliança depois de jogar toda sujeira embaixo do tapete e deixar para nós Caçadores resolvermos? ❜
      ❛ Sinto imensamente por não poder garantir uma assistência maior. Apesar de tudo, matar vampiros é trabalho de vocês, não? Seus ancestrais há muito tempo atrás estavam tão determinados a alcançar poder o bastante para exterminar os vampiros que... Foram tão longe ao ponto de devorar um Ancestral fundador de nossa raça para obtê-lo. ❜ Cada palavra fora perfeitamente acentuada, de um modo que cada pausa em sua fala abria abertura suficiente para que alguém fosse contra suas constatações; entretanto foi como se uma aura perturbadora entenebrecesse os pensamentos de todos. Mesmo em afirmações tão impertinentes, não havia uma única mentira no teor daquilo que falava.
      ❛ Será que não pode ser mais insolente em suas implicações sobre nosso dever de cuidar do processo de exterminação para reparar os pecados de nossos ancestrais? ❜ Mais uma vez era Yagari quem pontuava a situação descabida e tudo que Kaname ofereceu foi um sorriso singelo, amenizando sua aura tensa.
      ❛ Sinto muito, minhas palavras foram inapropriadas. ❜ Mais uma vez o silêncio se instalou no local, permitindo que todos se perdessem em suas próprias reflexões por um momento. Kaname vagou com o olhar até o Kiryuu novamente, desviando sua atenção para o Diretor Cross, externando um longo suspiro antes de prosseguir. ❛ Kiryuu-kun, Diretor... Não, desculpe... Sr.Presidente... Yuuki está bem, junto com Kyou. Elas estarão na festa mais tarde. Ambos poderam calmamente passar um tempo com elas. ❜ O timbre do Kuran se modificou de uma forma assustadora, voltando ao tom extremamente elegante, que costumava usar quando era o líder do Dormitório da Lua.
      ❛ Eu irei... Obrigado...❜ Os cotovelos se apoiaram sobre a mesa e o queixo repousou sobre as mãos, cujos dedos se entrelaçaram. Kaien sustentou o olhar sobre Zero, como se pedisse para que o mesmo se contivesse, deixando o Kuran sem uma resposta direta.
      ❛ Acredito que não será necessário… ❜
   Os passos que se sucederam foram pesados, porém surpreendentemente delicados, firmes, mas graciosos. Uma porta mais ao fundo da sala, diferente de onde os demais haviam adentrado para reunião, se abriu; revelando uma silhueta oculta pelas vestes que trajava. A estatura da figura era baixa e o vestido recaia até um pouco acima de seus joelhos, bordado em um tom negro e adornado por botões e correntes douradas. Sobre os ombros, um sobretudo aberto recaia, o capuz ocultando seu rosto, deixando somente os lábios avermelhados expostos. Boa parte do cabelo recaia por ambos os ombros, seguindo um caminho que guiava até o meio das coxas, onde as pontas avermelhadas se findaram.
   Todos os olhares se focaram em sua existência e Kyou retribuiu oferecendo um sorriso gentil, curvando-se para frente de forma cortês, a destra apoiada sobre seu peito. Ela trouxe consigo o cheiro inebriante de flores, embora fosse difícil distinguir especificamente de qual se tratava. Uma energia incomum exalava de forma controlada de si, algo semelhante ao que Kaname carregava consigo, mas muito menos densa e dominadora. Contrapondo-se ao Kuran, era perceptível que sua aura vampírica não tinha a intenção de sobrepujar qualquer um ali… Era apenas uma espécie de carisma e nada além disso. 
   O rosto de Kyou não fazia qualquer menção de movimento, e por tanto, era difícil distinguir para que direção estava olhand, e assim, a vampira adentrou no salão, seguindo até a mesa de centro, mas sem tomar nenhum lugar. Pela mesma porta por onde adentrou, Ichiru e Momo foram os próximos, seguidos por Kurenai Maria e uma outra Purosangue de cabelos púrpuros, que carregava consigo um sorriso bastante malicioso, enquanto observava a face de cada um ali presente. Por último, com ambas as mãos unidas defronte ao corpo e um andar extremamente desconfortável, fora Yuuki quem se mostrou; a última a adentrar com o grupo, que se manteve próximo ao centro da mesa, sem tomar para si qualquer lado, seja do Conselho ou da Associação
   ❛ Nós pedimos sinceras desculpas pelo atraso… ❜ Ichiru foi o primeiro a se pronunciar, colocando-se ao lado de Zero, juntamente com Momo. Ambos checaram o Kiryuu mais velho por um breve instante, antes dos olhares se voltarem para Kaien e Kaname..
      ❛ Nós precisávamos buscar minha irmã e a princesa dos vampiros pediu para se juntar a nós, ela parece ter algo a dizer.... ❜ Mesmo em um tom de voz fraco, Momo parecia carregar uma energia parecida com a de Yagari, um tipo de reprovação ou repulsa e durante seu discurso o olhar pairou sobre a figura encapuzada e tornou-se mais ameno, sem se desviar mais. Seus olhos estavam bastante úmidos e circundados por uma coloração rosada, como se tivesse chorado a pouco tempo atrás.
   ❛ Eu sinto muito, Kaname-senpai. ❜ Yuuki se curvou, sem se aproximar muito de onde a reunião ocorria. Kaname não se pronunciou, mas olhou pelo canto dos olhos a figura de Yuuki encolhida no canto. Ela não parecia confortável ou sequer estava de acordo com a posição que se viu obrigada a tomar, entretanto… Não podia fazer muito aquele ponto. ❛ Sei que soamos como uma intromissão desnecessária, mas peço que nos escutem atentamente, por favor... ❜ Os olhares que pairavam sobre a Princesa fez com que o corpo desta recuasse novamente, entretanto, ela se manteve no lugar onde estava, respirando profundamente uma ou duas vezes. ❛ Fui eu quem pedi para Seiren e Ruka apagarem as memórias de vocês referentes a Kyou… Eu sinto muito por isso... ❜ Seu arrependimento era muito mais ligado a dor que pudesse ter causado aos demais e não especificamente a Kyou… Foi por isso que o olhar recaiu sobre Zero, quase como se falasse diretamente com ele. ❛ Como todos já sabem, nós duas adormecemos por muito tempo e vivemos como humanas. Despertar significa aprender sobre a nossa sociedade novamente e conciliar todas as características mundanas que se enraizaram dentro de nós com o tempo. Não é da minha jurisdição explicar sobre isso, mas Kyou é diferente até mesmo em relação a nós vampiros… Não sabíamos como ela reagiria durante esse tempo conosco e dependendo do caso...  ❜ Os olhos se fecharam e a vampira engoliu seco, incapaz de voltar a olhar qualquer um ali.
     ❛ Nós iríamos executá-la... ❜ Foi Kaname quem retomou a palavra, sem esboçar uma única reação, além de estender a mão para Yuuki, que correu em sua direção, aceitando a mão que lhe fora dada, se escondendo minimamente atrás do assento que pertencia a ele. ❛ Imaginando a dor que vocês poderiam sentir com a perda dela, Yuuki tomou essa atitude impensada. Espero que sejam capazes de perdoá-la e entendam seu ato de extrema gentileza... ❜ Uma gargalhada baixa ecoou, ganhando imediatamente a atenção de ambos, caçadores e vampiros.
   Kyou traçou um caminho curto pela sala, repousando ambas as mãos sobre seu capuz e o retirando da cabeça lentamente. Os enormes cabelos avermelhados, que estavam muito mais escuros e longos agora, recaíram delicadamente sobre as costas e ombros da mesma. Seu rosto era exatamente como o de antes, talvez um pouco mais pálido, entretanto, haviam pequenos focos de uma coloração avermelhada que traziam um aspecto vivo, raramente visto em vampiros. Seu olhar brilhava intensamente, como se reafirmasse o fato de ser uma Purosangue, desta vez, diante de todos.
     ❛ Vocês podem ouvir o que eu tenho a dizer? ❜ Um sorriso simplório, mas extremamente agradável, escondendo uma dor profunda que tingia seus olhos que, pouco a pouco, voltou a coloração normal; se equiparando as suas madeixas, um vermelho sutil e nada além disso. ❛ Sei que toda essa comoção pode parecer ter desvirtuado o motivo da reunião, mas acredito que apenas despejar informações deixariam todos extremamente confusos… Permitam-me contextualizar um pouco mais, por favor. Não posso entregar todas as informações que me concernem, todavia algumas poucas palavras devem servir de grande ajuda. ❜ 
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   Kyou apoiou ambas as mãos em seu peito, esperando aprovação dos dois líderes, Kaien e Kaname, que não demoraram a assentir positivamente para seu pedido. ❛ Muito obrigada. Eu me chamo Kurosu Kyou, sou filha adotiva de Kurosu Kaien. Vivi por muito tempo como humana, caçadora e Guardiã do Colégio Cross, mas durante o incidente com Rido Kuran, descobri que minha essência havia quebrado e minha existência se fundiu a outras pessoas através do meu sangue. ❜ A destra se colocou na vista de todos na sala e três dedos se ergueram. ❛ Kuran Kaname, ele devolveu uma parte de mim um pouco antes de enfrentarmos Rido. Kuran Rido… Ele roubou de mim depois de assassinar Kuran Juri, Kuran Haruka e a minha mãe, eu peguei de volta depois de matar ele e… ❜ Era a primeira vez que a voz falhava e embora tivesse feito menção a desviar o olhar, se manteve concentrada nos líderes presentes na mesa. ❛ Kiryuu Zero... ❜ Algo pareceu quebrar dentro de si… Kyou sabia que se olhasse para ele agora não conseguiria dar continuidade e era algo importante demais para deixar seus sentimentos prevalecerem… ❛ Ele me devolveu por livre espontânea vontade também, antes de eu partir. ❜
   Ichiru deixou que uma de suas mãos encostasse levemente sobre a destra de Zero, olhando para o irmão de lado e assim que conseguiu contato visual, balançou a cabeça negativamente. Kyou havia dito para ele que Zero seria capaz de reconhecer aquelas afirmação como uma mentira… Nem ele mesmo devia saber que carregava algo de Kyou dentro de si, mas que talvez já tivesse notado uma ligação bastante fora do comum, que não se justificava no simples ato de compartilhar sangue. Independente do motivo, Ichiru precisava garantir que aquela mentira fosse vista como verdade por todos ali… E mesmo que parecesse impossível Zero esboçar qualquer reação diante daquela situação… Ainda se tratava de Kyou e o irmão podia ser bastante imprevisível quando se tratava dela.
     ❛ Eu não vou assumir o sobrenome de minha família e nem uma posição concreta na sociedade vampírica, pois muitos estão atrás do meu sangue neste exato momento… Tanto humanos quanto vampiros. Por isso eu estou aqui agora. ❜  Kyou buscou o olhar de Kaien, que retribuiu de forma contida, como se o único desejo deste fosse de se levantar e correr até a mesma… Mas a seriedade estabelecida ali não abriu espaço para tal, ainda não. ❛ A fornalha que criou as armas anti-vampiros utilizadas por vocês, Caçadores, a responsável por manter o poder ativo contido nelas surgiu através do sangue da minha Ancestral. Se o meu sangue deixar de existir neste mundo, toda força que vocês carregam vão desaparecer… Se o meu sangue cair em mãos erradas, todos vocês serão destruídos ou controlados. ❜
      ❛ Nós somos filhas de uma Purosangue, mas também somos filhas de um Caçador… Kyou tem o direito de continuar exercendo a função dela como Caçadora se assim quiser.. ❜ Sem que qualquer um pudesse se dar conta, Momo se moveu, repousando ambas as mãos sobre os ombros da irmã mais velha.
      ❛ Kyou é importante tanto para o Conselho quanto para a Associação… E ainda que sua visão de coexistência seja bastante falha Sr. Presidente, acredito que podemos colocar Kyou como o alicerce de nossa aliança… ❜ Kaname reuniu ambas as mãos defronte ao rosto, desviando o olhar por um instante. ❛ Você sabe o que isso significa, não sabe? ❜
   Kyou riu baixo novamente, concentrando-se no calor que Momo transmitia ao apertar seus ombros com força demasiada. Era por isso que estava ali… Se queria voltar, não podia deixar o medo lhe consumir. ❛ Os dois lados estão sensíveis agora… Vocês vão fechar uma aliança sem confiança alguma uns nos outros… E nenhum lado vai hesitar em me destruir se isso trouxer algum benefício ou vantagem. ❜ Era tão importante para ambos os lados… Mas a própria existência era tão frágil, como uma maldição.
      ❛ Se o seu desejo é agir como Caçadora, A Associação lhe aceita de volta, Kyou. ❜ Os braços de Kaien se cruzaram defronte ao peito e ele manteve um olhar baixo.
      ❛ Mas no primeiro sinal de traição ou se a humanidade for colocada em risco, seu sangue será usado na fornalha. Seu sacrifício vai nos dar tempo suficiente de encontrar uma outra solução para nossa situação atual. ❜ Yagari especificou, havendo uma proposta justa e compensação por qualquer dano que os vampiros pudessem causar, estaria de acordo com uma segunda tentativa de aliança.
      ❛ Não se esqueça que você ainda tem funções a cumprir na nossa sociedade e eu estarei pronto para levá-la de novo caso se descontrole. ❜ Kaname se ergueu do lugar onde estava, sendo acompanhado por Kaien, não havia mais nada a ser dito.
      ❛ Como conclusão dessa reunião, nossas sociedades trabalharão juntas pelo bem da coexistência em um nível mais alto que antes de cooperação... E a menos que tenhamos uma razão legítima, a Associação dos Caçadores não causará perigo algum a suas vidas. ❜ Constatou Kaien, esperando a decisão final do atual líder do Conselho.
      ❛ Quanto a nós, acreditamos que cooperar com a Associação é a melhor escolha para ambas as raças serem capazes de existirem juntas... Então, nossa raça também aceitará dar o sono eterno a qualquer um de nosso tipo que indevidamente apresente qualquer ameaça à vida humana. O fim da vida de Kyou significa o fim de nossa aliança. ❜ Seu rosto tombou minimamente para o lado e Kaname desviou o olhar para Kaien. ❜ A verdadeira coexistência completa que você anseia ainda está muito distante, pois antes de se tornar realidade todos nós, vampiros, teremos que primeiramente controlar nossa natureza violenta e nos tornar outro tipo de criatura, sinceras e capazes de depender completamente da razão e da lógica… ❜
      ❛ Representante Kuran, tenho uma última pergunta para lhe fazer… ❜ A movimentação agitada pelo salão se iniciou, de modo que todos se já se direcionava para a saída desde que o fim da reunião fora marcada através da decisão de ambos os líderes. Kaname, por outro lado, hesitou por um instante ao ouvir a voz de Kaien. ❛ O modo como você resolveu o problema do Conselho oito meses atrás foi drástico demais. Tem certeza que apesar disso o resto da população vampírica irá aceitá-lo como seu líder? Especialmente os Puros-sangues? ❜
      ❛ Certamente... Acho que teremos a resposta  desssa pergunta ao vermos a porcentagem de convidados que compareceram ao baile esta noite, não é...? ❜ Um sorriso delineou os lábios do Purosangue por um  breve instante, quase como se apreciasse tal questionamento.
   Lentamente o salão tornou-se vazio, ocupado apenas pelos gêmeos. Momo e Ichiru se entreolharam e em seguida se fixaram em Kyou, que balançou a cabeça positivamente. A medida que os mais novos se aproximaram da saída, foi Kyou quem se aproximou de Zero, imediatamente segurando-o com a destra. ❛ Espera! Você pode... ❜ Era a segunda vez que ela se interrompia, a cabeça se manteve baixa, enquanto os olhos vislumbravam os dedos entrelaçados ao redor do pulso do outro. Ele ainda era gélido como a neve, que por tanto tempo observou da janela do quarto que havia se tornado sua prisão e Kyou sentia o próprio corpo esquentar;  uma espécie de choque térmico os envolveu quando a própria pele entrou em contato com a dele.
   Mesmo as lágrimas que surgiram em seus olhos não caíram, os lábios trêmulos não conseguiram dar continuidade a suas palavras. A medida que as pontas dos dedos de Kyou deslizavam sobre o pulso dele de forma inconsciente, como uma espécie de carícia, as pernas se enfraqueceram e ela cambaleou para trás, o corpo se apoiando na mesa central. O coração palpitou aflito e um gemido de dor escapou dentre os lábios e ela se contorceu, fechando os braços ao redor de si. Havia idealizado aquele reencontro de tantas maneiras, embora não tivesse conseguido decidir qual seria a melhor forma de se comportar. Sentia-se feliz e ao mesmo tempo tão triste… Feliz por ter a garantia de que ele não era uma mera ilusão criada por sua mente numa tentativa de satisfazer-se. e não perder o controle… Triste pelo corpo lembrá-la imediatamente do quão próxima estava daquilo que tanto desejou desde que fora embora… De tantas formas diferentes...
   Tudo que a ruiva fez foi deixar o corpo cair completamente na mesa, fitando o teto do grande salão. Era perceptível a forma como estava suando frio, os orbes incandescentes como chama em brasa. ❛ Eu não sabia se devia abraçar você… Beijar você… Ou se eu não devia dizer ou fazer nada… ❜ E finalmente as lágrimas deslizaram pelas bochechas rosadas, conforme o corpo sofria espasmos contidos. ❛ Mas agora eu não sou capaz de sequer tocar em você e não sentir um desejo incontrolável pelo seu sangue... E tantas outras coisas... ❜ Queria beijá-lo, queria tocá-lo, queria se esconder nos braços de Zero e chorar por dias. Esteve escondendo o medo crescente dentro de si por tanto tempo… Estava afundando tudo no fundo da própria alma desesperadamente. Humanos e Vampiros… Havia tanto de ambas as partes dentro de si queimando e transbordando naquele instante. ❛ Eu também te amo... Zero..❜ Por fim conseguiu dar a resposta a ele.
⤹ ✿ . ⃗. .  alone at night .
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izerokiryuu‌:
Apesar de não haver mais o calor humano no toque, Zero notou que a pele alheia possuía um tipo diferente de calor - e ele se descobriu gostando daquilo também. Uma uma sensação certamente diferente da usual, mas nem de longe ruim e isso apenas resultou no vampiro rodeando a cintura de Kyou com os braços. Ele estava satisfeito com o resultado, pois apesar da resistência inicial, ela não se mostrou realmente disposta a rejeitá-lo. O coração palpitava forte quando Kyou o tocou e tudo pareceu decorrer lentamente - uma infelicidade para seu autocontrole. Zero engoliu em seco quando a sentiu provando o sangue, as mãos seguindo novamente para a cintura da menor e a trazendo minimamente mais para perto - era como se precisasse fazer algo além de apenas esperar. Até que finalmente ela o mordeu, fazendo um suspiro pesado lhe escapar pelos lábios e Zero direcionar uma das mãos para o pescoço de Kyou, parando apenas quando os dedos se enroscaram nos fios vermelhos. Era uma sensação dolorosamente extasiante.
Quando sentiu a vampira se afastando e o cheiro do sangue lhe atingindo, rapidamente o olhar encontrou o dela, não dando tempo para reagir antes que as próprias íris tivessem reluzido e correspondido. A mão que permanecia na nuca de Kyou recuou até que estivesse segurando os dedos dela, e o caçador estivesse, quase hipnotizado, provando daquele sangue também. Era apenas tão precioso que não podia deixar que a água o lavasse para longe. Não havia sido aquele o desfecho que ele estava imaginando, na verdade, mas não era como se pudesse prever ou ignorar as ações de Kyou quando ela agia daquela forma.
Apesar da concentração, conseguia ver pelos olhos de Kyou a confusão que a consumia por dentro, e talvez suas ações não estivessem ajudando em nada. Era difícil até para ele entender, mas era como se seus movimentos estivessem sendo executados de forma mais instintiva. Deveria parar? No entanto…
Zero… Por favor… Não pare…  Não me faça parar…
Os olhos se arregalaram e o coração vacilou uma batida quando ouviu aquele pedido. Um som baixo lhe escapou pela garganta com um gemido, pois, sim, havia perdido e faria exatamente o que ela pedisse. Definitivamente, não era algo que estava esperando para tudo aquilo e, se alguma entidade divina realmente existisse, Zero rezava que a ruiva não estivesse apenas sob influência quando o beijou.  No breve momento que ela separou os lábios Zero a olhou profundamente, apenas naqueles segundos, antes que retornassem ao beijo, fazendo-o lembrar de todas as vezes em que aquilo tinha acontecido. Inicialmente, sua intenção foi confortá-la e lhe tirar a dor que possivelmente queimava no interior, pois acreditava que a encontraria daquela forma depois de tudo o que ocorreu. Ou até pior. Mas, honestamente, não tivera intenção de provocar aquilo, embora naquele momento também não tivesse intenção alguma de pará-la, ou de parar as próprias mãos que voltaram a explorar e lhe sentir a pele da cintura, das costas, dos braços. O que inferno ele poderia fazer? Jamais teria forças para afastá-la. E Zero sabia, pelos deuses, sabia que estava completamente perdido dada as circunstâncias, pois a amava ao ponto de não poder e não querer se afastar.
O corpo do vampiro permanecia tenso, apesar de ter correspondido com intensidade, mesmo que tivesse lutado controlar certa ferocidade que o percorreu. Em algum ponto daquela confusão, as mãos seguiram para a face de Kyou, aos poucos, separando o beijo, mas apenas porque sentia a necessidade de sentir Kyou sob seus lábios e toque. Com os olhos entreabertos, Zero suspirou pesadamente, recuperando um pouco do ar antes de erguer ambos, havia segurado-a pelas coxas para conseguir se levantar, os lábios perigosamente próximos aos dela mas sem avançar. Após soltar Kyou devagar, um braço em torno da cintura para ajudá-la a ficar de pé, não levou mais que um segundo para que passasse um braço por trás dos joelhos enquanto o outro a apoiava nas costas, carregando Kyou para fora do banheiro.
A testa se recostou contra a dela conforme caminhava de volta para o quarto, de repente tomando consciência do estado que estavam. Da face corada e do corpo molhado de Kyou. Não tinha pensado tão claramente sobre aquilo antes mas, ali, percebeu que a desejava. Ah, como Zero a desejava. Entretanto, com tantas dúvidas pendendo entre ambos e todos aqueles sentimentos… aquele era um passo que Zero não tinha certeza se deveria dar. Não daquela forma. Apesar disso, contra os próprios pensamentos, o corpo menor foi colocado sobre a cama, não demorando antes que Zero sentasse e tivesse apoiado os braços em cada lado do corpo de Kyou e se inclinado novamente para lhe alcançar os lábios. Será que em algum momento cansariam daquilo?
A destra alcançou os dedos da ruiva, entrelaçando-os com os seus, apertando e arrastando a mão dela sobre o lençol, agora úmido, até que estivesse um pouco mais acima. Quando pausou o beijo de novo, Zero analisou o rosto dela de um lado ao outro, verificando aquela região para, em seguida, baixar o olhar para fazer o mesmo com o resto do corpo - da maneira que podia devido a proximidade. Precisava verificar se ela estava ferida e não conseguia acreditar em si mesmo por não ter feito aquilo primeiro. Logo, o vampiro aproximou os lábios novamente, mas seguindo com selares pelo queixo, pescoço até o ombro. Quando retornou o mesmo caminho, Zero parou no pescoço onde tinha visto o sangue antes e suspirou. ❝ —– O que Rido fez com você?❞ Os dedos se apertaram sob os dela novamente. Sua voz mantinha uma raiva contida, não queria retomar a tensão mas estava realmente preocupado com o que havia acontecido quando não estava por perto. E todos aqueles vampiros tão próximos dela… independentemente do poder que ela tivesse, as cenas daqueles monstros tão próximos e Kyou desacordada… Ele franziu a testa com a sensação que o percorreu.
Ainda assim, a ponta do nariz roçou no pescoço de Kyou quando ele inalou seu cheiro. Mesmo que ela não tivesse a intenção, tão próximos como estavam, Zero conseguia sentir o rastro daquela presença forte. Da essência vampírica tão perigosamente hipnotizante da ruiva. Dentre as carícias entre o pescoço e atrás da orelha, sentindo os cabelos dela dessa vez, a voz saiu rouca: ❝ —– Eu deveria ter destruído Rido no momento em que ele encostou em você. Em vez disso, fiquei lá parado, o observando tão próximo… Eu deveria tê-lo matado desde o primeiro momento. Me desculpe.❞ Por um momento, ele paralisou, apertando os lábios em uma linha fina. Mas por que sabia que Kyou tentaria negar ou revidar, ele a beijou novamente, um beijo lento e profundo e sensual, que carregava todos os seus sentimentos e desejos. Até que, deliberadamente, Zero deixou que o peitoral encostasse sobre o corpo menor, movendo-se até que tivesse uma das pernas entre as dela. Tinha completa consciência de que, naquele momento, em algum lugar da Academia, os outros estariam tendo que lidar com tudo o que havia acontecido: a destruição, mortes e os alunos da day class. Mas pouco importava para ele, se precisasse ser sincero, apenas Kyou importava.
      Em outro momento teria encontrado uma maneira de fugir, livrar-se-ia dos braços dele para correr numa direção aleatória, afinal, era uma situação injusta… O único corpo exposto ali era o próprio. A medida que o contato se aprofundava, Kyou se dava conta do porquê de não estar corada dos pés a cabeça, embora um tom levemente rosado ainda lhe tingisse a pele alva, era necessidade. Somente em momentos como aquele era capaz de desfocar a própria mente e se preocupar com o ritmo acelerado de seu coração, quase como se por um instante não houvesse qualquer sombra densa e obscura pairando sobre ambos. Inconscientemente os dedos se entrelaçaram aos dele e quando ambas as mãos subiram de acordo com a vontade do vampiro, a ruiva se deu conta da cama abaixo do si, do corpo alheio que pesava minimamente, deixando-a ainda mais ciente do quão unidos estavam. Era difícil manter a noção do tempo e de toda movimentação quando ele lhe tomava os lábios daquela forma. Quando Zero passou a analisá-la mais profundamente, os dentes trincaram quase que de forma imperceptível, os olhos se desviando para evitar os dele e a coloração avermelhada se intensificou.❛ Desculpe por sempre preocupar você… Eu estou bem. ❜ O tom de voz saiu baixo e os olhos se fecharam, os sentidos se centrando no toque dos lábios dele sobre a pele, quase se forçando a registrar e marcar aquela sensação para sempre. A respiração descompassada fez o corpo se contrair em resposta ao Kiryuu, mesmo querendo o refutar e tranquilizar sua inquietação, não conseguiu abrir um único espaço, não quando era ele quem a circundava ainda mais. Era sufocante, a forma como se aprisionava e não queria se livrar, pois envolta por aquele corpo se sentia protegida e ansiava por proteção… Ansiava por ele.
      Um ar gélido e incomum percorreu o quarto e quase instintivamente os olhos de Kyou se abriram, os braços reunindo forças o suficiente para se erguerem, entrelaçando-se ao redor do pescoço de Zero, mas mal teve tempo de puxá-lo para si. A destra de Seiren repousou sobre a nuca do grisalho e imediatamente a palma se iluminou por uma energia obscura e Kyou não precisou se esforçar muito para entender o que a outra fazia. A Nobre repousou a mão livre sobre o peito e curvou a parte superior de seu corpo cordialmente. ❛ Eu sinto muito, mas Kaname-sama exigiu que todos estivessem inconscientes para a nossa retirada. ❜ Não demorou muito para a Purosangue sentir o corpo do Caçador pesar ainda mais sobre si, se esforçando apenas para aconchegá-lo ainda mais. Os lábios encostaram sobre o topo da cabeça de Zero e os braços se mantiveram firmes ao redor dele, respirava lentamente, absorvendo o aroma que ele exalava na tentativa de manter-se o mais calma possível… Mas mesmo sob algum controle, ainda sentia o corpo estremecer gradativamente ao se dar conta da presença de Kaname próxima. Kyou não precisava de muitas interpretações ou de um pensamento relativamente complexo para encontrar respostas… Previa o que aconteceria dali em diante e se apavorava em silêncio. ❛ Kurosu-sama, preciso que me acompanhe, por favor… Não temos muito tempo. ❜ Seiren se afastou, reparando nos olhos ardentes que pairavam sobre si… Algo sobre aquele olhar lhe dizia que caso tivesse pronunciado o outro sobrenome poderia ter desencadeado uma reação diferente por parte de Kyou… Bastava seguir as especificidades de suas ordens, isso era tudo. Cuidadosa, ela estendeu um sobretudo, repousando a vestimenta em cima da cama e prontamente se retirou, sem mais palavras.
      No momento em que a porta se fechou, os orbes escarlates foram preenchidos por lágrimas irrevogáveis e os dentes se fecharam sobre o lábio inferior com força o suficiente para evitar os soluços. Kyou forçou o corpo de Zero para o lado com cuidado e a medida  se separaram ela se ergueu apenas para levar uma das mãos livres até o sobretudo deixado por Seiren. Ocultar o corpo com a vestimenta não fora difícil, desde que o tamanho era visivelmente muito maior que o apropriado para seu corpo. Somente ao terminar de fechar os botões reconheceu a essência que predominava no tecido e os orbes voltaram a recair sobre Zero. Ambos os joelhos se apoiaram na cama novamente e Kyou se debruçou ali, puxando a coberta apenas para ajustá-lo melhor na cama. Pela bagunça, nada ali era absolutamente apropriado, mas desde que não desprendia de muito tempo, precisava deixar Zero o mais confortável e seguro possível. Não se permitiu deixar os olhos fixos na face serena do outro por muito tempo… Se o fizesse, não conseguiria. Com um último selar de lábios, Kyou se retirou do recinto o mais rápido que pode, pois sabia que quanto mais evitasse mais doloroso seria sua saída dali e ainda que Seiren não tivesse especificado o teor de sua futura conversa com o Rei dos Vampiros… Algo dentro de si já alertava que talvez não pudesse voltar… E não não podia antecipar seu futuro, caso não desprendesse de tais pensamentos acabaria enlouquecendo. Ambas as mãos fecharam ainda mais o sobretudo ao redor de si e durante todo percurso se concentrou somente no perfurme de Zero e nada mais.
                                                                                                         . ⃗. . ❀ 。
      Retornar ao dormitório da Night Class fora extremamente incômodo. o cheiro de sangue fluía por todos os lados e os estragos deixados pelos vampiros que por ali passaram atestaram uma realidade que sequer conseguia imaginar. Pensou no quão magoado Kaien estaria naquele instante, desde que a reparação de todo estrago exigiria tempo e pela forma como amava o Colégio, para ele, seria como acompanhar a recuperação de um filho durante um prazo extenso de tempo. Havia uma pequena comoção pelos arredores, os alunos transitavam de um lado para o outro, mas nenhum olhar ousava pairar sobre Kyou… A forma como abaixavam a cabeça e fitavam o chão, como se temessem a presença da Purosangue acima de tudo, algo bastante incomum vindo daqueles que eram liderados por um. Passou-se um tempo até que se desse conta da falta da presença de Seiren e não houve outra opção senão embrenhar-se através dos dormitórios da Night Class.
      ❛ Kyou... ❜ A voz taciturna fizeram os próprios passos cessaram e Kyou repousou ambas as mãos sobre o peito, antes de virar-se na direção do Kuran. Um corredor, não parecia o melhor ambiente para este encontro, mas ao julgar pelas malas sustentadas por Kaname e todos os outros nobres que o acompanhavam era justificável. Kyou tomou o próprio tempo para fitar Ruka, Akatsuki e Aidou bem ao lado de Kaname, visivelmente abalados por tudo que aconteceu, mas não teve tempo de se manifestar, desde que o Kuran tomou a palavra. ❛ Precisamos ir agora... ❜ Não havia remorso, preocupação, relutância, uma vez mais, não havia nada que Kyou pudesse discernir no timbre do mais velho e mesmo se tivesse tentado… Não importava. O Purosangue acompanhou a mudança de expressão de Kyou com cautela e a medida que os olhos vermelhos dela se estreitaram, desfocando-se, ele tomou a frente. A ruiva se chocou contra uma das paredes repentinamente, o baque reproduzindo um som doloroso que podia ser ouvido ao longe. Ele notou a aura avermelhada que fluia do corpo da guardiã, a forma como esta estendia a mão na direção de uma das janelas na intenção clara de fugir o mais rápido possível, mas dado a sua condição atual, nada fez além de deixar o começo de um grito desesperador arranhar-lhe a garganta. O braço esquerdo de Kaname enlaçou a cintura de Kyou, puxando-a para si e e a afastando da janela, nquanto a destra cobria sua boca para abafar os gritos que pretendiam suceder. Kaname se ajoelhou no chão frio, trazendo Kyou consigo, limitando seus movimentos.
      Kyou odiava a forma como era capaz de entender todas as intenções sem que nada fosse dito, seu instinto parecia trabalhar arduamente para antecipar todos os movimentos que ocorriam ao redor de si e não tinha controle sobre isso. Quando se viu forçada para baixo, os joelhos bateram no chão e o rosto balançou negativamente, os braços se movendo de forma abrupta para tirar as mãos de Kaname de si, mas sem sucesso. A energia que parecia querer irromper dado às últimas palavras do Kuran se esvaia pouco a pouco e no mesmo instante sentia-se fraca, quase como se o outro drenasse toda fonte de seu poder. Reconhecia bem aquela sensação… A anarquia predominante em seu sangue a tornava completamente suscetível as intenções dele. Kyou abaixou a cabeça, os dedos pressionando os braços de Kaname, desta vez, quase como se buscasse algum tipo de conforto vindo dele e mesmo que não tenha recebido nada, estava bem com o autocontrole que este a forçava a ter. Debulhou-se em lágrimas, seus soluços sendo abafados e os espasmos contidos; sabia que não aguentaria manter a consciência por muito tempo, porém precisava resistir mais um pouco e por isso balançou a cabeça negativamente uma última vez… Não queria partir… Não queria ficar sem ele de novo…
      Kaname afrouxou o aperto quando a Purosangue se submeteu, o queixo apoiando-se no topo da cabeça de Kyou, enquanto refletia minimamente sobre o teor de suas próximas palavras. ❛ Eu sei que está preocupada com Momo, Kaien, Ichiru… Zero... ❜ E a mera menção do Caçador fez o corpo da ruiva reagir, mesmo que brevemente, foi o suficiente para o Kuran firmá-la novamente. ❛ Sua essência se espalhou, sua existência será questionada e não vai demorar muito até ela te encontrar... ❜ Outro grito e a palma da mão pressionou ainda mais contra os lábios de Kyou que estremeceu em espasmos intensos. ❛ Mesmo que tenha agido bem com Rido, você está fraca, instável… Não tem noção sobre sua própria forma, poderes… Controle. Acha que vai conseguir proteger alguém desta forma? ❜ A maneira como Kyou chorava e se encolhia remetia a uma criança, mas a dor presente em seus ruídos faziam o Purosangue se questionar se ela não estava mesmo queimando de dentro para fora… Literalmente. ❛ Eu prometo mantê-los sob minha proteção durante todo tempo… E ele vai ser capaz de te perdoar quando retornar. Não torne isso mais difícil pra eles… Não dificulte as coisas ainda mais pra você… ❜
      Não conseguia redirecionar os próprios pensamentos, acabando por se focar em como seria para Momo ficar sem sua presença… De novo. Como Zero lidaria quando despertasse e não encontrasse um único rastro sequer de si? Kyou sabia que não havia tempo, ele provavelmente seria o primeiro a buscá-la… Sentia como se o próprio coração fosse se partir em incontáveis pedaços só por sequer imaginar. Mesmo resistindo, não era como se aguentasse muito mais e detestava admitir que no fundo, Kaname tinha razão. A existência de Purosangues precisa ser de conhecimento do Conselho, da Associação, de tudo, tanto para preservá-los quanto para manter o equilíbrio e o fato de ter passado tanto tempo adormecida geraria conflitos e não estava pronta para lidar com nenhum deles… Sentia como se não pertencesse ao lugar onde estava novamente. Se aquela mulher a encontrasse… O que faria? Ela não era como Rido, sabia disso melhor do que qualquer existência neste mundo. No fim, não estava apta a permanecer ali e colocar tantas vidas em risco e Kaname a havia convencido disso, não havia desperto totalmente ainda… Ainda não, só mais um pouco. A medida que as pálpebras pesavam, desejava em silêncio que fosse capaz de conquistar o perdão de todos futuramente e, por tanto, não lutou mais contra a inconsciência que rapidamente a atingiu.
      ❛ Deixe-a comigo… ❜ No final do corredor, a silhueta se distinguiu entre os Nobres, acompanhada de uma brisa gélida e densa, os orbes cintilaram no mais puro escarlate. Yuuki se aproximou cuidadosa, enquanto observava Kyou inconsciente nos braços de Kaname. O Purosangue pareceu tão absorto em pensamentos que Yuuki vislumbrou uma sensação… Quase como se um determinado arrependimento fluísse do Kuran, mas fora tão momentâneo que nenhuma parte de si se viu  capaz de chegar numa conclusão. Sem questionamentos, ele se ergueu, trazendo Kyou em seus braços e rapidamente a estendeu na direção de Yuuki. A Guardiã se questionou se teria forças o suficiente para carregá-la daquela forma, mas ainda assim estendeu os braços, confiando em seus novos instintos e para a própria surpresa, conforme Kaname a ajeitava em seu colo, Yuuki sentiu que tomar Kyou nos braços era tão fácil quanto segurar uma boneca de porcelana… Como quando brincavam juntas quando mais novas. ❛ Para Rima e Shiki, certo? ❜ Yuuki fitou Kaname em busca de uma confirmação, que logo veio na forma de um sorriso quase imperceptível. A vampira corou, virando-se de costas, trazendo Kyou para mais perto do próprio peito e se pondo a caminhar.
      ❛ Yuuki… Não faça nada que possa te trazer arrependimentos. ❜ E estas foram as últimas palavras ditas a mais nova… E pela primeira vez Kaname não sabia se ela o havia dado ouvidos ou não.
                                                                                                        . ⃗. . ❀ 。
      Traçar o caminho que deveria seguir não era uma tarefa árdua, não agora que era capaz de distinguir presenças e sensações tão claramente, mas dado as circunstâncias sabia que tinha o tempo necessário para desviar-se somente um pouco. A maioria no colégio ainda estava em sono profundo devido aos acontecimentos anteriores e sabia que muito dificilmente alguém se colocar em seu caminho e por isso decidiu voltar até o dormitório da Day Class, o antigo quarto que compartilhava com Sayori. Não havia restado muito, ao menos não em relação a si, já havia organizado as próprias malas e portanto poucos pertences restaram… Apenas coisas que não pretendia levar consigo, deixaria como uma lembrança da própria presença no Colégio Cross. Yuuki repousou o corpo de Kyou sobre a própria cama e respirou fundo, mantendo-se em pé ao lado desta, os braços cruzados e olhos fixos no rosto adormecido. Observar Kyou era mais do que o suficiente para recordar de tantas coisas que não podia se dar ao luxo de se prender agora… Mas logo teria tempo para tudo isso. A destra tocou o rosto ainda quente da ruiva e um sorriso de canto se formou nos lábios de Yuuki.
      ❛ Mesmo depois de tudo… Eu ainda sinto sua falta... ❜ A canhota deslizou para baixo, dando apoio a nuca de Kyou e o braço direito se entrelaçou a cintura da outra, puxando-a para cima, até que estivesse sentada na cama. Yuuki teve o cuidado de deixar a cabeça alheia pender o mais confortavelmente possível na parede ao lado e se afastou rápido, procurando por algo na gaveta de sua antiga escrivaninha.  ❛ Mas poderemos nos perdoar um dia? ❜ Quando voltou, a mão esquerda escovou os cabelos ruivos com os dedos, puxando-os em conjunto, enquanto a destra fazia o trabalho de lentamente cortar as madeixas com a tesoura. Ainda que se esforçasse,  não possuía qualquer aptidão em relação ao que estava fazendo e por isso se limitou a deixar as pontas um pouco acima dos ombros… Um corte bagunçado e curto, muito parecido com o que usava antes… Quando humana. Ao terminar, Yuuki voltou a deitá-la na cama. ❛ Pode ser um pouco desconfortável, mas tenho certeza que Rima vira logo... ❜ A Purosangue se abaixou, as mãos vagando pelo espaço vazio embaixo da cama apenas para retirar uma enorme mala dali; esta não tinha um formato convencional, pois tudo em sua estrutura era desproporcional e não se comparava em nada com uma mala de viagem. Com isto, a Kuran tomou Kyou nos braços uma última vez, apenas para guardá-la com cuidado no espaço vazio e não conseguiu conter uma risada baixa ao notar como o corpo de Kyou se encaixava perfeitamente ali. Esta fora fechada e unida as demais malas presentes no quarto. Seu trabalho estava quase terminando e por tanto recolheu as madeixas vermelhas caídas na cama, enrolando uma fita também de tom avermelhado para unificar os fios e os levou consigo para fora do quarto. Agora só restava um último lugar.
      Não se surpreendeu ao terminar de abrir a porta, estranho seria não se deparar com Zero ali no quarto de Kyou, pois era claro que ele havia se juntado a ela depois de deixá-la sozinha. Seiren estava encostava na parede em um dos cantos do quarto e se surpreendeu ao se dar conta da presença de Yuuki ali, embora não teve tempo de questioná-la, pois a Purosangue fez um claro sinal de silêncio e tudo que a Nobre fez foi se ajoelhar diante dela. ❛ Seiren, preciso que você garanta que todos durmam a madrugada toda... ❜ Pediu em um tom de voz baixo, mas carregado de uma malícia que a Kuran não parecia possuir ante de despertar. ❛ Peça para o Onii-sama levar as minhas coisas… E diga para ele me encontrar no início do caminho que leva a cidade no terceiro badalar do relógio… Se eu não aparecer, diga para ele seguir sem mim. ❜ E na primeira menção que Seiren fez de se retirar, Yuuki ergueu a destra, deixando claro que ainda não havia terminado. ❛ Uma última coisa... ❜ Os olhos se fixaram na janela do quarto, perdendo todo brilho por um único momento, o tom de voz se abaixando calmamente. ❛ Preciso que queime tudo que pertence a ela, o que estiver aqui e o que quer que esteja espalhado pelo Colégio… E, apague as memórias dos alunos… Nenhum humano pode se lembrar dela… Nem mesmo Kaien ou qualquer um da Associação… Apague tudo com a  ajuda da Ruka. ❜ A Kuran notou a forma como os punhos de Seiren se fecharam e teve a impressão de ouvir os dentes da mesma trincando. ❛ Vá, agora... ❜ E sem qualquer questionamento, a Nobre apenas deixou seu posto, pois ainda que não estivesse de acordo… Eram as ordens de um Kuran.
      Yuuki cobriu os lábios, sentindo uma tontura que a fez cambalear de um lado para o outro, mas não sucumbiu, pondo-se a vasculhar cada mísero canto daquele quarto, despejando todos os pertences de Kyou para o lado de fora, no corredor. Ao terminar, a morena trancou a porta e fechou as janelas, respirando aliviada. ❛ Zero... ❜ Sussurrou, apoiando os joelhos na  beirada da cama, se inclinando sobre ele. Sabia que ele não era capaz de ouvir e ainda assim repetiu seu nome algumas vezes, antes de deitar-se ao lado dele, os braços entrelaçando a cintura do grisalho, enquanto o rosto repousava sobre o ombro do mesmo. Não estava disposta a perder tudo, ainda que tivesse para si que estava destinada a ter tudo tomado por Kyou… Não estava disposta a abrir mão dele e por isso permaneceria ali, era algo que somente si mesma poderia fazer e por tanto, não iria a lugar algum.
                                                                                                        . ⃗. . ❀ 。
      Logo cedo, quandos os primeiros raios de sol adentraram pela janela, a Kuran já estava desperta, sentada na beirada da cama e encolhida no próprio espaço. Mesmo que não aparentasse, talvez pela expressão serena e a calmaria em seu corpo, estava extremamente atenta… Não havia mais nenhum único resquício da presença de Kyou, exceto pelos fios de cabelo apoiados na escrivaninha do quarto, os que havia trazido consigo. Agora que havia parado para refletir sobre… Era o único ponto que restava da existência dela ali e por algum motivo isso lhe trazia uma sensação incomum de poder e era estranho apreciar-se neste sentido. Assim que sentiu o colchão abaixo de si e os sons de Zero possivelmente se movendo atrás de si, Yuuki arregalou os olhos, virando-se defronte ao vampiro. Foi então que a Purosangue notou, as pálpebras do Kiryuu tremulando lentamente e nada menos do que um sorriso surgiu em seu rosto.  ❛ Zero! ❜ Não havia preocupação, não quando tomou o rosto dele com ambas as mãos, não quando selou os lábios nos do outro mesmo sem consentimento… Algo dentro de si estremecia ansiosa pela aceitação que parecia ser inegável vindo dele, ao ponto de forçar aquele beijo a se aprofundar ainda mais… Sabendo da vulnerabilidade proporcionada pelos poderes de Seiren e agora… Os próprios, talvez tivesse se estendido ainda mais, se não fosse o grito que ecoou no corredor, fazendo Yuuki separar-se dele no mesmo momento em que a porta do quarto se abriu:
      ❛ O QUE VOCÊ FEZ? ❜ Momo adentrou em prantos, caminhando em direção a Yuuki em passos densos, mas ao contrário do que qualquer um pudesse pensar, a mais nova correu para segurar uma das mãos de Zero. ❛ Zero você está bem? Hey! ❜ Ichiru apareceu um pouco depois, claramente desgastado, tossindo e lutando para conseguir recuperar o ar que claramente havia perdido, mas mesmo com toda a comoção, ele teve o discernimento de ir até a escrivaninha onde as madeixas de Kyou se encontravam. ❛ Zero você se lembra da Kyou? Minha irmã? Você se lembra, não lembra? ❜ As mãos do Kiryuu mais novo apertaram os fios entre os dedos com uma força demasiada e a última coisa que se ouviu fora o tom de sua voz:
      ❛ Kuran Yuuki… Onde está a Kyou? ❜
⤹ ✿ . ⃗. .  alone at night .
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Look, Chiyo.
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