Tumgik
anticaforra · 4 years
Text
Por descuido da eternidade há o instante
E ainda assim sabendo-o,
Cismamos em momentos glaciais
Os carinhos vão-se antes dos dedos
Há de se, portanto, desejar
Que a vida acabe antes da vitalidade
Ao fim, trata-se tudo de um descuido
E nada mais
Aldo Castello Branco
32 notes · View notes
anticaforra · 5 years
Text
Imersos em fétida correnteza
Emergem, ferozes, os peixes
Em odioso cardume, antes silente,
Agora agitado por ventos outros
De nova atmosfera
O mar revoltou-se em espuma tóxica,
Como quisesse expurgar Iemanjás:
“Roubasteis o nosso azul marinho
Para mantos celestiais”
Entre carcaças, os peixes aflitos
Esbarram na imundice da vida
E ignoram a pureza da morte
Dos que, em contracorrente,
Expõem suas entranhas ao bote
Levados na onda, vão-se os robalos
E, como feras, ressoam:
“Um mar novo, ame ou deixe,
Que esse mar nunca esteve pra peixe”
Aldo Castello Branco
3 notes · View notes
anticaforra · 5 years
Text
Haicai das definições
É gás mostarda:
Uma mensagem entregue
E ignorada
Aldo Castello Branco
3 notes · View notes
anticaforra · 5 years
Text
Teus diferentes rostos não exaurem
A diversidade de tuas paisagens.
Essa inexatidão que finda a estrada,
Em processo lento de reconhecimento,
Leva do existir ao nada.
Em trocar teu rosto te espanto
Como frágil companhia que sou:
Eu sou um ser solitário
Você, um não-ser solidão.
Aldo Castello Branco
35 notes · View notes
anticaforra · 5 years
Text
O não é o princípio das mentiras,
a mais humana das palavras.
E, dita por Deus, enche-se
De profética moralidade.
Deus haveria de saber da antinaturalidade do processo
E a maçã revestida de não
Tornou-se fruto desejado.
É que a negação é ato
E o não não o é.
O existir só entende a língua do verbo.
A existência é o verdadeiro problema teológico. E o não é o pecado original.
Aldo Castello Branco
4 notes · View notes
anticaforra · 6 years
Text
Como estivesse tudo em seu lugar
Relê roteiros antigos
E vê que os papéis encenados
A ele nunca pertenceram.
As pessoas mais perdidas
Juram ser roteiristas
E ensaiam seus próprios roteiros
Apenas em frente ao espelho
Sem saber jamais onde está a plateia
Só o ator que, em sabendo seu papel,
Não precisa de roteiros
Seguindo rotas
Encontra aplausos.
Pois só esse ator, na plateia do tempo,
Verdadeiramente vira ato.
Aldo Castello Branco
1 note · View note
anticaforra · 6 years
Text
O português teme
A declinação dos nomes
De suas raízes latinas
Nossos nomes são plácidos
Às margens de verbos corruptíveis
Aldo Castello Branco
2 notes · View notes
anticaforra · 6 years
Text
Cicatrizes de areia
Escondidas pelo avançar da maré
E quando o mar amansa
O traçado impera
Como a própria ressaca
Deixasse marcas molhadas
No avançar da vida
Aldo Castello Branco
1 note · View note
anticaforra · 7 years
Text
Costelas presas ao tórax demarcam a força do estado de criatura Mas algumas, ali no fundo, flutuam como fossem substratos É então que percebo a força do estado de subtração A matéria-prima do criar reside em contas negativas E quem abdica de costelas expõe palpitações. Mas quem quer expôr pulsação em um mundo que requer apenas pulso? Nos resignamos ao estado continuo de espera Não sabe ele que é esperança. Aldo Castello Branco
0 notes
anticaforra · 7 years
Text
Olhos atentos vigiam Edifícios de suposta imaturidade, E prendem-nos em solo firme Sob pretexto de alcançar o céu. Seriam torres de concreto Ou torres de papel-machê? Maldita seja a juventude Que se contenta em arranhar o céu Que outrora lhe foi prometido. Aldo Castello Branco
0 notes
anticaforra · 7 years
Text
Envernizo os espinhos de meu corpo Como quem esculpe lanças em pedras E me iludo na dureza das navalhas - Na suposta mesma dureza de espinhos de rosas. O espinho é a admissão da fragilidade: É vociferar gritos de guerra Que pedem, em clemência, caridade. Envernizo os espinhos de meu corpo Na única esperança de que um dia alguém perceba Que a única força da natureza Reside na sutileza da poesia. E, assim, saiba sem medo Que espinhos envernizados São pedidos de afago. Envernizo os espinhos de meu corpo Porque vivemos em uma selva de pedras. Aldo Castello Branco
8 notes · View notes
anticaforra · 7 years
Text
Revisitar um momento Como fosse sala de estar: Estivesse à vontade Mas jamás estará presente Repassar por pessoas Como não estivessem de passagem: Passem dias, meses ou anos E continuam passado Ver um instante Como um tanto além de nadas E o medo de nadar em futuros Aldo Castello Branco
1 note · View note
anticaforra · 7 years
Text
Afundei em águas rasas E, em teu dorso, desaguei futuros Até que tua coluna fez-se fronteiras Foi quando meus olhos, desmareados, viram Tuas costas em colossais falésias Eu, deserto Você, desertor Aldo Castello Branco
53 notes · View notes
anticaforra · 7 years
Text
Imerso em sua história Sente o tempo passar em correnteza E mesmo banhado em futuros Mágoa é sempre brisa
Aldo Castello Branco
1 note · View note
anticaforra · 8 years
Text
Caminho descalço Como para sentir a aridez do chão Sou estrada de barro Mas o mundo espera Aldo Castello Branco
2 notes · View notes
anticaforra · 8 years
Text
Achava tornar-me terreno infértil Onde, entre ruínas de mata antiga, Florescia magistralmente o nada. E sob quereres de reflorestamento Você me aparece semente. É quando você redescobre a botânica Enquanto eu me descubro botão. E que, juntos, arboresçamos. Aldo Castello Branco
38 notes · View notes
anticaforra · 8 years
Text
Mergulhado no claro, Sob ímpeto de lua oculta, O mar olha-se azul.
E agita-se, com forças ainda desconhecidas E mostra-se, com a ambiguidade de sua ressaca
Mas é nas ondas que ele se impõe E aos banhistas, vos digo: Talvez ainda incompreendidas, Inevitavelmente as ondas se quebram
Aldo Castello Branco
0 notes